Guedes diz que não negocia mais com políticos

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Foto: Reprodução

Após atritos com deputados e senadores, o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou ontem que os dias de bate-boca com parlamentares estão para trás e que passará a atuar mais como formulador de políticas e defesa das reformas do que na negociação com o Congresso. Tomou como exemplo o ex-ministro Pedro Malan e disse que, agora que o governo tem uma base aliada sólida no Legislativo, parará com o “voluntarismo” e quem fará as negociações são os articuladores políticos de fato.

Guedes envolveu-se em inúmeros desentendimentos com os parlamentares desde que tomou posse no ano passado, desde brigas sobre a “desidratação” da reforma da Previdência, ataques aos senadores por derrubarem um veto ao congelamento de salários e até a proibição, na semana passada, de que seus auxiliares almoçassem com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) – o que fez Maia anunciar um rompimento com ele.

O ministro participou de surpresa de dois debates por videoconferência para defender sua agenda de reformas, como a administrativa e a desvinculação do Orçamento, e buscou apaziguar para o mercado o conflito com o presidente da Câmara. Atribuiu a “fofoqueiros” a imagem de crise política entre o Executivo e o Legislativo e disse que os desalinhamentos são naturais por causa do papel de cada um, mas agradeceu o “olhar generoso e amigo” de Maia, “que sempre nos ajudou nas reformas”.

O desentendimento mais recente, segundo Guedes, ocorreu porque o presidente da Câmara teria prometido a governadores e prefeitos um fundo de R$ 400 bilhões para compensá-los por mudanças na arrecadação por causa da reforma tributária, mas que “esse dinheiro não existe mais” porque o Congresso – sob o comando de Maia – destinou R$ 250 bilhões em dez anos para ampliar o Fundo de Desenvolvimento da Educação (Fundeb).

“O que eu disse ao presidente da Câmara é que não posso ficar mandando técnicos meus para elaborarem uma reforma que está totalmente desalinhada com o que já aconteceu e o que pode acontecer daqui pra frente”, disse Guedes. “Os recursos que tínhamos para patrocinar uma descentralização mais agressiva de recursos foram substancialmente cortados agora. É como se já tivéssemos feito descentralização, mas carimbada para educação.”

Apesar da declaração “apaziguadora”, Guedes não deixou de cutucar o presidente da Câmara. Atribuiu ao Fundeb, gestado por ele, a falta de dinheiro para as compensações da reforma tributária e disse que o presidente Jair Bolsonaro foi muito sensível ao determinar que a reforma administrativa só atinja os futuros servidores públicos, mas que “tinha inclusive gente querendo reduzir o horário de expediente para reduzir os salários” dos atuais funcionários – ideia defendida por Maia para pagar os custos do combate à covid-19.

Maia, em entrevista à “CNN Brasil” à noite, rebateu que não tratou de fundo nenhum e que não falou com Guedes sobre o almoço. “Eu não falo com o Paulo Guedes há muito tempo. Ele disse que falou comigo, eu não falei com ele”, respondeu. O presidente da Câmara disse que esse rompimento não influenciará nas votações e que sua preocupação é o futuro porque o governo precisa tomar importantes decisões nos próximos 60 dias e tem encontrado dificuldades em temas como a reformulação do Bolsa Família e a prorrogação do auxílio emergencial em R$ 300 – “há fortes pressões para elevar para os R$ 600 das parcelas iniciais”, disse. “Minha preocupação é apenas uma: o tempo vai passando e as soluções não saíram do papel.”

No debate sobre a reforma administrativa organizado pelo Instituto de Direito Público (IDP), Guedes e Maia estavam entre os convidados. O ministro, contudo, avisou que não participaria porque estava reunido com Bolsonaro e os líderes do governo no Congresso, mas entrou de surpresa. Maia, porém, tinha saído minutos antes para presidir uma sessão em homenagem ao presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli.

Nesse encontro o ministro disse que está “dormindo mais tranquilo” agora que o governo tem uma base aliada de fato no Congresso, composta pelos partidos do Centrão como PP, PL, PSD, PTB e Republicanos, e que deixará com esses parlamentares as negociações. Afirmou que se espelhará em Malan, “que no máximo tirava dúvidas dos parlamentares”, mas que deixava as negociações a cargo do líder do governo. “Meu recolhimento é só isso, não tem nada pessoal. Faço agradecimento ao Rodrigo, mas agora eu tô, abre aspas, enquadrado num regime de articulação política regular, fecha aspas. Acabou meu voluntarismo”, disse. “Acredito que vai ficar melhor até para ele.”

Valor Econômico