Senadores apoiam colega do cuecão mas têm vergonha

Todos os posts, Últimas notícias

Foto: Geraldo Magela / Geraldo Magela/Agência Senado

O flagrante do senador Chico Rodrigues (DEM-RR) com dinheiro vivo na cueca gerou um impasse no Senado. A maioria dos senadores repudiou o afastamento do parlamentar por decisão monocrática do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso, vendo a decisão como uma interferência indevida do Judiciário.

Apesar de se mostrarem constrangidos com a situação do senador do DEM, parlamentares próximos ao governo, de partidos de centro e até da oposição receberam a decisão de Barroso de forma negativa. Apenas alguns integrantes do grupo Muda Senado, mais ligados à pauta de combate à corrupção, defenderam abertamente Barroso no grupo de WhatsApp dos senadores.

Na visão da maioria dos senadores ouvidos pelo GLOBO, o processo para um eventual afastamento deveria ficar restrito ao Conselho de Ética do Senado. O foco agora é evitar que a medida judicial abra precedentes para outros casos no futuro. Essa também foi a opinião que prevaleceu nas discussões internas na Casa, ainda que os parlamentares evitem defender abertamente o colega das acusações.

Nos bastidores, os parlamentares ainda esperam uma sinalização do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), para avaliar se é possível fazer uma manifestação política sobre o caso. Informalmente, congressistas elogiaram a manifestação pública do senador Plínio Valério (PSDB-AM), um dos únicos que verbalizou a insatisfação. Nas redes sociais, ele escreveu:

“O senador (Chico Rodrigues) tem que ser processado e julgado no Conselho de Ética do Senado, órgão constitucional para isso. Absurda a decisão do ministro Barroso, mais uma vez querendo aparecer. O Senado sim, tem competência constitucional para afastar ministros do STF em casos de abusos de suas funções”.

Os afastamentos de deputados e senadores em decisões monocráticas (de um só ministro), têm sido questionados nos últimos anos — há congressistas que não veem base na lei para esse tipo de medida. Em 2017, o Senado derrubou decisão do STF que afastou o então senador Aécio Neves (PSDB).

— O que a gente precisa saber nessa história, e juízos precipitados podem levar ao erro, é o conteúdo dessa investigação — diz o senador Nelsinho Trad (PSD-MS). — Decisões monocráticas dessa forma, diante de um parlamentar que tem mandato popular, deveriam ter um indicativo muito forte para poder existir. Do contrário, não condizem com o Estado democrático de direito

Alguns senadores do grupo Muda Senado, por outro lado, devem trabalhar para ratificar a decisão de Barroso. Entre eles, Raldolfe Rodrigues (Rede-AP), Major Olímpio (PSL-SP) e Lasier Martins (Podemos-RS). O grupo também vai protocolar uma representação na próxima semana pela cassação do mandato de Chico Rodrigues.

— É lamentável este tipo de conduta. Sou a favor da cassação do mandato do senador Chico Rodrigues. Quanto à decisão do ministro Barroso, vamos votar para ratificá-la. O afastamento cumpre os pré-requisitos, pois leva em conta a manutenção da ordem pública e a preservação da instrução penal. Se vale para as pessoas comuns, também vale para senador — disse Randolfe.

A sigla de Rodrigues tenta forçá-lo a pedir um afastamento durante as investigações. Segundo um integrante do DEM, a situação de Rodrigues na sigla é delicada e ficou “praticamente insustentável” diante da repercussão do caso. Por isso, parte da cúpula da legenda tenta negociar desde ontem um pedido do próprio Rodrigues para que ele deixe o Democratas alegando ser uma escolha pessoal. A justificativa é que isso vai diminuir a pressão para ambas as partes.

De acordo com um aliado de Rodrigues, ele está atordoado com os desdobramentos do caso. Nas conversas com pessoas próximas, ele inicialmente não admitia que o dinheiro foi encontrado na cueca. Apresentou a justificava de que os cerca de R$ 30 mil seriam para funcionários da sua empresa. Agora, justifica que ficou assustado e “por instinto” escondeu as cédulas entre as nádegas.

Entre os colegas de Rodrigues, a avaliação é de que ele poderia ter encontrado meios de explicar o dinheiro vivo em sua casa durante a busca e apreensão, mas o fato de os recursos terem sido encontrados na cueca levaram a situação ao limite. A apreensão foi realizada no âmbito de operação que investiga suposto esquema de desvio de recursos destinados ao combate à Covid-19 em Roraima.

Ao mesmo tempo, Davi Alcolumbre, que também é do DEM, não tem dado uma indicação do que pretende fazer sobre a decisão de Barroso, que precisa ser validada pelo plenário. Na quinta-feira, Alcolumbre conversou com o presidente do Conselho de Ética da Casa, Jayme Campos (DEM), para que ele se sinta à vontade para pautar o que avaliar necessário em relação a pedidos de cassação de Rodrigues. De acordo com um aliado do presidente do Senado, ele não quer ficar com a “batata quente” na mão.

Correligionário de Rodrigues, o presidente do Conselho de Ética do Senado, Jayme Campos (MT), afirmou que vai tomar as providências e fazer os encaminhamentos necessários após o requerimento ser protocolado. Ele destacou que as comissões não estão funcionando presencialmente por causa da pandemia da Covid-19 e que há outros requerimentos que precisam ser apreciados antes após a retomada dos trabalhos.

— Há uma resolução da Mesa Diretora proibindo reunião presencial das comissões. Nesse caso particularmente, após eles (senadores) protocolarem, vou encaminhar para a Advocacia do Senado, que vai emitir um parecer. Depois, temos um cronograma. E, naturalmente, também temos cronogramas de outras representações que se encontram lá (no conselho) e também devem ser respeitadas — disse Campos.

O Globo