Biden vence e vitória pode se tornar “de lavada”

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O democrata Joe Biden derrotou o atual presidente, o republicano Donald Trump, na disputa pela Casa Branca. A vitória confirmada neste sábado, 7, no Estado da Pensilvânia garantiu 273 delegados no colégio eleitoral ao ex-vice de Barack Obama, mais do que os 270 necessários para assumir a presidência, conforme as projeções das emissoras de TV americanas CNN, CBS e NBC.

A disputa acirrada em Estados-chave foi levada à Justiça por Trump, que argumenta ter havido fraude na eleição, sem apresentar provas. O republicano pede recontagem de votos no Wisconsin, onde Biden ganhou com cerca de 20 mil votos a mais, margem de vantagem semelhante ao que Trump obteve no Estado em 2016.

O secretário de Estado da Geórgia, Brad Raffensperger, afirmou nesta sexta-feira que o Estado fará a recontagem dos votos. As estatísticas apontam empate de 49,4% dos dois candidatos na Geórgia, com 98% das urnas apuradas.

Contestações de Trump em outros Estados foram recusadas pela Justiça. A equipe de campanha do republicano apresentou ações judiciais em quatro Estados decisivos  – Geórgia, Michigan, Pensilvânia e Wisconsin. Os republicanos reclamaram de falta de transparência no processo de contagem das cédulas e denunciaram  tentativas de fraude eleitoral por parte dos democratas, sem apresentar evidências.

Na noite da quinta, em um pronunciamento em rede nacional, Trump voltou a dizer, sem apresentar provas, que havia vencido com os “votos legais” e os democratas estavam tentando “roubar  a eleição”. Juízes da Geórgia, Michigan e Pensilvânia negaram pedidos da campanha do republicano. No Wisconsin, a solicitação de recontagem está indefinida.

Retomada

A campanha de Biden conseguiu recuperar parte do chamado Cinturão da Ferrugem que fez de Trump presidente em 2016 e abrir espaços no Cinturão do Sol, tipicamente republicano. Mas a diferença foi mais apertada do que as pesquisas indicavam.

Joe Biden
O democrata Joe Biden foi vice-presidente de Barack Obama  Foto: Angela Weiss/AFP

Conforme analistas alertaram nas semanas anteriores à votação, Estados decisivos registraram uma virada democrata no curso da apuração dos votos, quando as cédulas pelo correio foram contabilizadas.

O eleitorado do partido é mais propenso a votar de maneira antecipada e, neste ano, a votação pelo correio bateu recorde em razão da pandemia do novo coronavírus, com mais de 101 milhões de votos antes do dia da eleição. O comparecimento americano na disputa entre Trump e Biden foi o maior em um século.

Os democratas esperavam que a contabilização dos últimos votos na Pensilvânia garantisse a maioria também no Estado, pelo simbolismo da região onde Biden nasceu e investiu a maior parte dos esforços de campanha na reta final.

A previsão de que os democratas ganhariam espaço com a ampliação do voto pelo correio e comparecimento recorde é o que motiva os ataques de Trump ao método de votação amplamente empregado no país. Por isso, o presidente argumentou que a contagem deveria ser paralisada, mas sem apresentar evidências de problemas na contagem dos votos.

O presidente perdeu o apoio entre as regiões identificadas pelo operariado branco de classe média em 2016, com as vitórias de Biden na Pensilvânia, seu Estado natal e onde investiu maior esforço de campanha na reta final, Wisconsin e Michigan. O democrata também tem vantagem na apuração até agora em Estados do sul que eram pilares do conservadorismo, como Geórgia e Arizona.

Desde 1972, a Geórgia só tinha votado em presidentes democratas três vezes, quando os candidatos eram os sulistas Bill Clinton, em 1992, e Jimmy Carter, nascido na Geórgia, em 1976 e 1980. O Arizona só havia votado uma vez em um presidente democrata desde 1948.

Já no Cinturão da Ferrugem, o Michigan tornou-se o símbolo de como Trump ganhou de Hillary Clinton em 2016. Na época, ele teve apenas 10 mil votos a mais do que a democrata, o que fora suficiente para ganhar os 16 delegados estaduais, em linha com o que aconteceu na disputa passada na Pensilvânia, Ohio e Wisconsin.

Biden será o presidente mais velho a tomar posse nos EUA, com 78 anos – os quais completará no próximo dia 20. Ele foi eleito por um forte sentimento de aversão a Trump entre parte da sociedade americana, que decidiu que o presidente não merece mais um mandato no comando do país.

O ex-vice de Barack Obama se apresentou como a solução para curar o país da crise de saúde, provocada pela pandemia de coronavírus, e também da extrema polarização social que divide os americanos. Para isso, prometeu restaurar o compromisso dos EUA com princípios fundadores da sociedade americana, com uma plataforma de busca pela restauração da integridade e da normalidade. O maior desafio que se apresenta ao democrata é a contenção da segunda onda de coronavírus e a reversão da crise econômica.

Com o país com o maior número de mortos por covid-19 e uma recessão comparada apenas à Grande Depressão, Biden ganhou força e articulou o apoio com a ala mais à esquerda da legenda. Em junho, na onda de protestos contra o racismo e violência policial, o democrata abriu a maior vantagem contra Trump na disputa e manteve o patamar até o fim.

Trump começou a campanha como favorito à reeleição, mas a pandemia de coronavírus mudou o curso político nos EUA. A maioria dos americanos avalia mal a forma como o atual presidente lidou com a pandemia.

Político há 47 anos, Biden dedicou a carreira à vida pública, com seis mandatos no Senado e 8 anos como vice de Obama. Com uma vida marcada por tragédias pessoais e superações, sua empatia e proximidade com o eleitorado viraram um forte ativo em uma campanha feita no curso de uma pandemia que matou 230 mil americanos.

A campanha pouco empolgante de Biden, vista inicialmente como um desafio para levar os jovens do partido às urnas, virou trunfo junto a uma parte do eleitorado cansada de polarizações.

Estadão