Estratégia brasileira contra covid é insana

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Foto: Adriano Machado

Atribuem a Einstein a frase “A definição de insanidade é fazer a mesma coisa repetidamente e esperar resultados diferentes”. Essa não é a definição de insanidade e a frase não foi dita por ele, mas certamente descreve o combate à Covid-19 no Brasil. Repetimos a mesma estratégia que falhou no começo do ano esperando resultados diferentes. E o resultado continua sendo mais mortes evitáveis.

Agora que campanhas eleitorais estão fora do caminho, já se pode reconhecer: os casos voltaram a aumentar no Brasil. A Europa teve uma situação bastante controlada durante o verão e agora vê um aumento de casos no inverno que faz países pararem. Nós estamos seguindo um caminho mais parecido com o dos EUA, que tiveram muitos casos no começo do ano e durante o verão.

Enquanto escrevo, estados como Amazonas e Espírito Santo estão com ocupação crítica de leitos de UTI para Covid-19. Vitória, Rio de janeiro, Curitiba e Macapá passaram de 90% de ocupação. E a média diária de óbitos reverteu a tendência de queda e voltou a subir.

É hora de usarmos o conhecimento construído para reforçar uso de máscaras, distanciamento e intervir nas aglomerações que mais favorecem a alta de casos, como locais fechados com pouca circulação de ar. Só que não. O Ministério da Saúde, que deveria coordenar a ação do país contra a maior pandemia do século, segue com o jogo de empurra para estados e municípios. E volta a promover “tratamento precoce”.

Não existe tratamento precoce comprovado para Covid-19 com medicamentos. A melhor intervenção precoce que temos é o uso de máscaras e o distanciamento, que realmente reduz em a quantidade de vírus com que entramos em contato, diminui o contágio e as chances de desenvolver Covid-19 grave —tudo parte da recomendação que o Ministério da Saúde fez uma vez no Twitter, aparentemente por engano, já que apagou a publicação em seguida.

O vermífugo mais promissor para combater a Covid parece ser o voto, mas sua ação é bem mais lenta.

Parece que despregamos da realidade do conhecimento científico e estamos presos em um loop temporal onde nosso plano de combate inexistente não avança. Na ausência de uma campanha federal, o Ministério do WhatsApp continua sendo uma das maiores fontes de informação sobre Covid das pessoas, o que faz do Brasil o último país onde ainda se discute cloroquina, ivermectina e azitromicina como tratamento.

Nem Trump, que promoveu a cloroquina e cativou brasileiros, usou o remédio para malária quando teve Covid —pelo contrário, apelou para anticorpos produzidos em laboratório usando tecnologia de ponta e dispensou a UTI.

Falando em UTIs, a demanda por elas voltou a crescer. Em novembro, as UTIs para pacientes com Covid-19 de Manaus passaram de 85% de ocupação. Novamente. Essa é a cidade onde, segundo estudos de prevalência de anticorpos contra o vírus, estimou-se que mais da metade da população tenha contraído o novo coronavírus.

Se uma região tão atingida pela doença ainda tem casos aumentando e corre risco de ficar sem leitos, o que alimenta a imaginação de quem defende que o Brasil tem imunidade coletiva? Se nem a região mais atingida do país está livre da doença, quem estaria?

O melhor mecanismo para despertar imunidade protetora são vacinas, que estão dando resultados fantásticos —algumas passaram de 90% de eficácia. Mas a salvação que podem trazer demora para ser distribuída e depende das pessoas estarem vivas para serem vacinadas. Melhor controlarmos os casos até podermos contar com ela. E para isso precisamos seguir evidências científicas, não correntes de WhatsApp.

Folha de S. Paulo

 

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