Mandetta critica “mundinho” de Bolsonaro e Doria

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Foto: Marcos Corrêa/PR

“Sempre existe tertius em política”, diz o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, em entrevista ao Valor. O que está na pauta agora, explica, é qual será a “elasticidade” da terceira via, até onde vai à direita e à esquerda. Mandetta continua ácido quando analisa o comportamento do presidente Jair Bolsonaro e do Ministério da Saúde no enfrentamento da covid-19. Mas também não poupa o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), e diz que ambos cometem equívocos ao politizar a vacina. O tucano teria errado ao definir uma data de vacinação e passar por cima da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). E Bolsonaro insistiria na anti-ciência. A vacinação virá a conta-gotas, mas os erros de 2020, opina, farão o Brasil pagar caro em 2021. Mandetta também não poupa críticas ao atual ministro da Saúde, Eduardo Pazuello e diz que a logística militar não serve para a Saúde. Veja os principais temas tratados na entrevista:

Conversa com Luciano Huck

Tenho conversado com vários interlocutores nacionais. Huck é mais um deles. A eleição de 2022 vai ser marcada pelo entendimento, feito pela boa política, pelas boas pessoas que estão dispostas a construir algo que represente o sentimento da maioria do povo brasileiro. Os dois extremos, de esquerda e de direita, foram incinerados. Perdemos a última década. Para reconstruir isso vai ser muito duro. A conversa [com Huck] foi nesse sentido. Todo mundo vai ter que se despir das suas vaidades.

A esquerda e Bolsonaro

O que a gente vê hoje é a turma do PT e do [Guilherme] Boulos dizendo: votem em mim, senão o Bolsonaro fica. E a turma da direita dizendo: votem em mim, senão o PT volta. Cada um deles tem 25% da plateia. E colocam o raciocínio do eleitor, do moderado, que tem massa crítica, com aquela escolha que ninguém tem mais estômago. Eles mantêm essa polarização não como um acidente, mas como estratégia política. Há que se surgir a terceira via. O tertius sempre existe em política. E essa terceira via, se ela tiver confluência para conquistar os 50% e se for para um segundo turno, seja com a esquerda, seja com Bolsonaro, será vitoriosa.

Poder do DEM para 2022

O Democratas estava sub-representado pela importância que tinha. Mas mantivemos a coerência. Elegemos as presidências da Câmara e do Senado. Por vias indiretas, não partidárias, ocupamos três ministérios. O Democratas vai marchar unido, seja lá qual for a decisão para 2022.

Reeleição de Bolsonaro

Essa discussão de 2022 foi precocemente antecipada pelo próprio presidente. A nova política apresentada envelheceu em um ano. Ela cai no Centrão, cai em interferência nos poderes, uso das instituições, uso de Abin, uso de PGR, demissão de ministros de um quilate de um Sergio Moro. O outro caminho, que seria de responsabilização [impeachment por crime de responsabilidade], o Brasil está muito traumatizado. Vamos ter que passar 2021. A continuar com essa condução na Saúde, vamos passar ainda com muito sofrimento, similar a 2020, por decisões erradas e negativismos.

Duelo Doria-Bolsonaro

Os dois estão equivocados. O problema Doria-Bolsonaro já vinha importado de 2019. Dali pra frente eles continuaram nutrindo as divergências e traduzindo isso politicamente nas ações. O [Instituto] Butantan não é do Doria. É uma instituição centenária. Acho que o Doria viu o caminho pelo qual Bolsonaro ia, o falso dilema do ‘não vou cuidar da saúde, vou cuidar da economia’,. O governo federal colocou a ficha dele numa vacina só. Um grande erro. Nenhum laboratório do planeta tem condição de abastecer, com duas doses, o Brasil precisa. O Brasil tinha que ter feito é botar um pouco de dinheiro na Pfizer, um pouco na AstraZeneca, um pouco na Moderna, um pouco na Coronavac. Em agosto eu alertei para que começasse a comprar seringa e agulha. Hoje está em falta no mercado. Doria pegou o lado ciência, e o outro o lado anti-ciência. Doria gostou desse debate, porque estava sempre um passo à frente. No final do ano, na questão do registro, aí o Doria erra. Erra porque começa a falar ‘eu vou vacinar’, ‘a vacina vai ser obrigatória’. Não compete a ele. E erra quando fala que vai começar a vacinar dia 25 de janeiro com registro ou sem registro. Não pode. Isso está fora das quatro linhas. Cruzou a linha da bola. Não vale. Os dois erram. Mas pelo menos esse último erro do Doria serviu para tirar o Ministério da Saúde da inércia. Essa politização que ambos fizeram serve para o mundinho dos dois. Serve para Bolsonaro dar carne aos leões do radicalismo, da anti-vacina, a cloroquina, essa coisa rala. E serve ao Doria, que posa como aquele que apostou na ciência. E quem perde com a briga dos dois é a economia, o povo, a saúde brasileira.

Vacinação em 2021

A gente vai conseguir sim, vai ter. Mas a conta-gotas. Assim: arrumei cinco milhões de doses. Isso dá para dois milhões de pessoas, porque sempre tem pelo menos uns 10% de perdas. Esse pessoal cuida da gente [da saúde], eles têm que ser vacinados [primeiro]. Se tiver mais um pouco [de doses], vacina quem entra primeiro nos hospitais, para evitar novo colapso de atendimento. Acredito que a gente vai ficar neste conta-gotas praticamente até o meio do semestre. Depois da vacinação desses grandes países e o bloco europeu, aí o Brasil começa a produzir um volume maior na Fiocruz e no Butantan.

A gestão de Eduardo Pazuello

Acho que ele é especializado em balística, não em logística. A logística militar é muito simplória, basicamente organiza trânsito de material. A logística em saúde é concepção, é inspiração, exemplo. E eles infiltraram todas as unidades do ministério com militares. Técnicos de carreira, com 30, 40 anos de ministério, me ligam e dizem “pelo amor de Deus, não sei mais o que faço aqui”. O que está faltando é gente. O verde oliva não é o verde esmeralda, da medicina. Esse é mais difícil de conquistar.

Politização da Anvisa

[A agência] padeceu do mesmo problema. Foram colocados militares, mas o corpo técnico é muito denso, quer ser equiparado às grandes agências internacionais. Agora, naquele episódio em que num dia suspenderam o teste da vacina [Coronavac] e no dia seguinte disseram que o computador não recebeu a informação, ali eles abriram os braços e falaram: estamos politizados, na figura do presidente, que é um almirante que passou a vida toda dele pensando nas marés, e não em vigilância sanitária. Espero que haja a pressão do STF, do Congresso, da sociedade e da economia, porque o que salva a economia é vacinar.

A imagem do Brasil no mundo

Já imaginou se a Inglaterra vacina com duas doses e o Brasil continua produzindo esses números pornográficos de quem não está fazendo nada? O editorial New York Times pergunta o que o Brasil fez do PNI (Programa Nacional de Imunização), o maior do mundo. Está na hora de se fazer uma fala uníssona. E teve mais uma barbaridade, mais uma burrice do presidente, falando que precisa ter termo de consentimento para tomar a vacina. Vamos atravessar o ano de 2021 pagando pelos erros.

Postura anti-vacina de Bolsonaro

E por que não fazer um termo de quem não quer tomar a vacina? Então, se ficar doente você que arque com as consequências do seu tratamento. Ele fala tanto que tem que ser macho, que é maricas quem tem medo, será que ele tem medo de qual efeito colateral? Dói? Fica dodói o braço? Porque esse é o efeito colateral mais presente. É de uma inconsequência, uma infantilidade, uma falta do que fazer muito grande que a paciência da gente acaba, a gente vai olhando e pensa: até quando? Se a gente não vacinar, os nossos homens de negócio não podem entrar na comunidade europeia. Está difícil de entender a lógica deste absurdo. Eu não sei se é mais absurdo o presidente dar esse tipo de ordem ou o general que está lá cumprir. O povo está olhando e está assustado. Não dá para ter outro ano como a gente teve.

Plano nacional de imunização

Se tiver que vacinar 150 milhões de pessoas num intervalo de dois meses o SUS sabe como fazer. O SUS é um exército e sabe vacinar com os pés nas costas. Mas tem que ter líder, planejamento, tem que ter organização, capacitação, e me parece que isso daí passa longe hoje do Ministério da Saúde. A única coisa que é definição do ministério é: por favor, com quais vacinas você assinou termo de compras, e quais as perspectivas de receber? Uma vez que o FDA deu o registro, pode a Anvisa se associar e dar a licença por share. Aproveita a análise deles, faz a análise própria e, se tiver coisas específicas para o público brasileiro, faz. Isso daria um fast tracking muito grande.

Pressão sobre a Anvisa

A pressão da sociedade vai ficar cada vez maior. Vamos passar o Natal e réveillon com gente batendo em porta de hospital. Não dá mais. Está morrendo gente todo dia, todo mundo à beira de um ataque de nervos. A Anvisa vai ter que tomar uma atitude. Parece que a primeira que vai ter que analisar vai ser a Coronavac.

Sucessão no Congresso

O Davi [Alcolumbre, presidente do Senado] estava melhor colocado do que o Rodrigo [ Maia, presidente da Câmara], que vinha de uma fadiga. Acho que o Davi é hoje o grande fio condutor do Senado. Na Câmara a gente está vendo o Maia duelar com o Planalto. O presidente entrou pessoalmente na eleição da Câmara. Ele está hoje dentro da Câmara fazendo campanha para o [Arthur] Lira. Essa eleição vai ser muito parecida com a que o Severino Cavalcanti ganhou [ presidente da Câmara eleito em 2005 e que renunciou ao mandato no mesmo ano]. Talvez no Senado consigam fazer uma convergência. Rodrigo Pacheco[ senador pelo DEM de Minas Gerais] é muito qualificado. Na Câmara, vamos viver cada dia um flash.

Impeachment de Bolsonaro

A conjuntura política descarta porque ele está no Centrão futebol clube. O Centrão não vende apoio, aluga. Vai ficar muito caro para ele, porque eles reajustam o preço do aluguel todo dia. Se ele botar o Arthur Lira na presidência da Câmara, não acho que vá enfrentar nenhum risco de impeachment. Não acredito em impeachment, embora ele esteja provocando demais o vice-presidente e toda a ala militar. Essa popularidade dele, em função da debacle econômica, vai começar a cair. Vai desidratando em 2021 e desembarca em 2022 muito isolado e fragilizado.

Que partidos entram no centro

A discussão agora é qual a amplitude deste centro. Até onde à esquerda ele vai, até onde à direita. Qual é a elasticidade? Quais nomes agregam? O PT e Bolsonaro têm teto. Não passam de 40%. Se forem os dois [ao segundo turno], vai ser jogar moeda pra cima, cara ou coroa, o que cair no chão vamos aguentar mais quatro anos.

Valor Econômico

 

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