Políticos do Amazonas fingem não ver responsabilidade de Bolsonaro

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Foto: Ministério da Saúde/Divulgação

O presidente Jair Bolsonaro segue recebendo votos de fidelidade e apreço dos políticos do Amazonas mesmo em meio às mais graves críticas sobre como o governo federal tem atuado no combate à pandemia. Em oito meses, o sistema de Saúde do estado entrou em colapso duas vezes. Segundo dados desta segunda-feira (8) da Fundação de Vigilância em Saúde do Amazonas (FVS-AM), mais de 9.100 vidas foram perdidas no estado para o novo coronavírus, muitas delas por falta de oxigênio e leitos.

A conduta do governo federal é alvo de uma apuração preliminar na Procuradoria Geral da República (PGR). Desde o início da pandemia, o Supremo Tribunal Federal (STF) teve que mandar o Executivo agir em diversos episódios de omissão na crise sanitária.

Ainda assim, o governador Wilson Lima (PSC) faz questão de exibir alinhamento ao Governo Federal enquanto a rede de saúde do estado sucumbe sob o olhar presente do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, que pressionado, passou a última semana de janeiro cidade.

No início daquele mês, o estado já tinha pedido apoio federal para abrir mais leitos e recebeu como resposta do Ministério da Saúde oferta do chamado “kit covid”, que inclui medicamentos ineficazes contra o novo coronavírus.

A Polícia Federal chegou a pedir, em junho, a prisão de Wilson Lima no inquérito que apura fraudes na compra de respiradores. O pedido foi negado pelo ministro Francisco Falcão, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que autorizou outras medidas como busca e apreensão e bloqueio de bens. Com a lupa também sob sua gestão, o governador se aproximou dos filhos do presidente Jair Bolsonaro e evita críticas, cobranças e confrontos com o governo federal.

Com a rede pública de Saúde colapsada desde o início de janeiro, no último domingo (7) o Amazonas continuava com uma fila mortal de espera por um leito: 456 doentes de covid-19, dos quais 121 em estado grave e que precisam ir para a UTI.

Mesmo assim, também no domingo, o Governo do Amazonas decretou a flexibilização do toque de recolher. Desde segunda-feira (8), a restrição deixou de ser de 24 horas e passou para de 19h às 6h. O comércio foi liberado para fazer delivery. Ao decidir pela liberação, o governo disse que há “estabilidade” e citou que uma das unidades de saúde não tem mais pacientes internados no corredor.
Apoio em todas as instâncias

Ao mesmo tempo em que a tragédia no Amazonas choca o mundo, a bancada de deputados federais e senadores do estado deu apoio quase unânime aos candidatos que Bolsonaro apoiou na disputa pelo comando do Congresso Nacional, o deputado Arthur Lira (PP-AL) e o senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG), ambos eleitos.

Na Assembleia Legislativa do Estado do Amazonas (ALE-AM), enquanto o estado quebrava recordes diários de infecção, internação e enterros, o ministro Pazuello recebeu aplausos e bajulação diários nos dias que ficou em Manaus em janeiro. As menções ao general ignoravam os questionamentos a respeito da omissão da pasta.

Na prefeitura de Manaus, a corrente ideológica que sustenta politicamente o presidente se reproduz em aparições públicas do novo prefeito David Almeida (Avante), que promete distribuição para a população de ivermectina, medicamento para piolho ineficaz no tratamento de covid.
Almeida também exibe seu lado de fundamentalismo religioso falando com Deus na central de medicamentos, aos prantos, dizendo ter sido escolhido para a missão de salvar o povo. Os vídeos circularam nas redes sociais após distribuição de aliados dele.

A simpatia ou alinhamento de conveniência ao presidente Jair Bolsonaro, quase unânime entre os políticos, se reproduz em grande parte da população da cidade, que virou epicentro da doença no Brasil e reproduziu o negacionismo com o desprezo ao uso de máscaras e ao distanciamento social.

Nas eleições de 2018, Bolsonaro recebeu 65,72% dos votos válidos em Manaus. De lá para cá, todas as polêmicas capitaneadas por Bolsonaro tiveram aderência nas redes sociais de seus seguidores: “O Brasil não pode parar”, a defesa do uso da cloroquina, e os questionamentos à vacinação são alguns exemplos.

Nas primeiras semanas de janeiro, circularam nas redes sociais postagens de pessoas que desdenhavam dos riscos do vírus com o discurso do presidente e que morreram vítimas do agravamento rápido da doença em Manaus. Entre as vítimas está a cantora bolsonarista Roci Mendonça, do grupo Boi-Bumbá Garantido.

Ela morreu em 9 de janeiro, dias após dar à luz ao filho. Nas redes sociais, ela postava mensagens debochando da pandemia e negando a gravidade da covid-19.

Bolsonaro foi o cabo eleitoral mais disputado no pleito municipal de 2020 e, mesmo sem entrar oficialmente na campanha, seus acenos políticos levaram o desconhecido coronel da reserva do Exército Alfredo Menezes (Patriotas) a sair da marca de 1% de intenção de votos e terminar o pleito com mais de 100 mil votos.
Menezes, no momento de maior desespero entre familiares de doentes e profissionais da saúde no Amazonas, postou em suas redes sociais fotos rindo, sem máscara com o presidente e outros aliados.

Os dois picos da doença em Manaus foram precedidos por carreatas e protestos contra medidas de isolamento social. Um deles, em março do ano passado, contou com a participação de Bolsonaro por vídeo-chamada. Dias depois, casos de infecção explodiram na cidade, cadáveres acumulavam ao lado de pacientes, médicos improvisavam respiradores com sacos plásticos e enterros foram feitos em valas comuns.

Em dezembro de 2020, o decreto do governo estadual para minimizar a alta na taxa de ocupação de leitos clínicos e de UTIS, teve rejeição do comércio e de deputados estaduais e federais do Amazonas. Os números mostravam que a tragédia era iminente. Mas até o filho do presidente Eduardo Bolsonaro (PSL-RJ) entrou no coro para que Manaus não parasse.

O movimento contou com a adesão de comunicadores e programas de jornalistas do estado de grande audiência nas principais emissoras de TVs, como as que reproduzem a TV Globo e a TV Record em Manaus.

O deputado federal Marcelo Ramos (PL), atual vice-presidente da Câmara dos Deputados, mediou as conversas que fizeram o governo do Amazonas ceder.

Sem base, com dez pedidos de impeachment na gaveta, Lima preferiu evitar protestos de rua a seguir orientação da FVS (Fundação de Vigilância em Saúde), cuja a diretora-presidente Rosemary Pinto, principal técnica da linha de frente, também morreu vítima de covid-19 em janeiro.

O doutor em Ciências Sociais da Ufam (Universidade Federal do Amazonas) Marcelo Seráfico avalia que, por interesses individuais, os políticos do estado incentivaram as pessoas a pular do abismo ao reproduzirem a forma como o governo federal lidou com a crise.

“Os mais novos podem ser bolsonaristas raiz, por convicção. Os mais antigos pensam na própria sobrevivência. Políticos tradicionais dependem muito dos fatores conjuntais para não serem presos, não sofrerem impeachment e processos. É a forma como se protegem mutuamente”, disse o professor sobre o alinhamento dos políticos do estado ao Planalto.

Na ALE-AM, Bolsonaro consegue unir situação e oposição. O novo presidente da Casa, Roberto Cidade (PV), tomou posse no início do mês e, no discurso, disse que Manaus só não está pior por causa do Ministério da Saúde e do Governo Federal.

O antecessor dele Josué Neto (Patriotas) também era da safra de políticos tradicionais do estado que vestiram a blusa do bolsonarismo. Os deputados Wilker Barreto e Dermilson Chagas (ambos do Podemos), são as vozes mais eloquentes da oposição no estado e defenderam o “kit-covid” em sessões virtuais.

Antes da explosão de casos de janeiro, o negacionismo sobre o uso da máscara e a ciência marcaram a campanha de disputa pela sucessão de Arthur Virgílio na Prefeitura de Manaus. O tucano era uma das poucas vozes críticas ao presidente no Amazonas.

O atual prefeito David, durante coletiva de anúncio de sua legenda, em setembro, tirou a máscara alegando que “não pegava esse negócio” ao se referir ao coronavírus. Dois dias depois testou positivo para covid-19 e nas semanas seguintes enfrentou o drama do agravamento de familiares pela doença. Entre os quais, a mãe que morreu vítima de covid-19 e foi enterrada no dia em que ele se elegeu prefeito.

“Manaus tem hoje um prefeito aturdido que aparece em alguns momentos em êxtase religioso e diz que Deus o escolheu e nomeia filhos da elite local. É algo patético e assombroso. Agora, temos a necropolítica nos três níveis de governo em Manaus”, avaliou o cientista social Marcelo Seráfico.

Candidatos a vereadores também usaram como plataforma de campanha o incentivo à circulação de pessoas e o desafio a cientistas que alertaram desde maio risco de uma segunda onda ainda mais grave.

Um dos mais atacados foi Bernardino Albuquerque, infectologista da FMT (Fundação de Medicina Tropical) e professor de Doenças Infecciosas da Ufam (Universidade Federal) do Amazonas. Ele apontou descontrole na reabertura em Manaus e, após polêmicas, passou recusar entrevistas.

A reabertura após o pico da doença foi tocada pelo governo do Amazonas sem testes em massa e sem rigor no controle do protocolo das medidas de segurança. As igrejas, sob pressão de pastores que integram a política de parlamentares, entraram na primeira fase da reabertura. Igrejas católicas e centro espíritas não aderiam ao decreto.

Em pleno pico da doença em maio, 50 mil trabalhadores da indústria voltaram às fábricas. Ao final do mês, eram mais 1.627 mortos, sem contar a subnotificação.

O incentivo à circulação e desprezo pelo vírus veio também pelas declarações de empresários da área da saúde, que foram a púbico decretar “o fim da pandemia no Amazonas”, como Beto Nicolau, irmão do deputado estadual Ricardo Nicolau, que também concorreu à prefeitura. O pai deles, o ex-deputado Luiz Fernando Nicolau, morreu meses depois da declaração do filho, durante a campanha, vítima de covid-19.

O professor Henrique Pereira, da Ufam (Universidade Federal do Amazonas), é responsável pela organização do Atlas ODS da pandemia no Amazonas e afirma que o negacionismo, a contrainformação, e a falta de acesso à informação são componentes que influenciaram no comportamento da população e no colapso do sistema de saúde.

“O negacionismo tem influência sob dois aspectos: o comportamento pode estar influenciado por uma visão ideológica ou pela ignorância, porque parte da população não tem informação e conhecimento para acompanhar o debate”, disse.

Além disso, Henrique Pereira destaca que o negacionismo esteve presente na tomada de decisão de uma administração que ignorou a ciência no Amazonas.

“Desde o começo a principal orientação e direcionamento do governo de combate à pandemia foi abertura de UTI. Na prática, foi uma estratégia de ‘deixa a doença correr e nós vamos cuidar dos casos graves’”.

“Do meu ponto de vista é necropolítica, que resultou no caso específico de Manaus numa necrópole com o agravante da incompetência do governador que é evidente. Um governador omisso, incompetente e subserviente ao presidente da República. Aliás, é competente na execução da necropolítica. Este quadro se confirma agora com a adesão do prefeito de perspectiva de profunda religiosidade culminada a este patrimonialismo de forjar acesso à vacina.”, disse Seráfico.

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