CNMP punirá procurador por discurso de ódio

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Foto: Reprodução

O Conselho Nacional do Ministério Público, o chamado ‘Conselhão’, decidiu nesta terça, 23, instaurar um procedimento administrativo disciplinar contra o procurador da República Ailton Benedito, em razão de postagens no Twitter com suposto ‘discurso de ódio, discriminação e xenofobia’ envolvendo a pandemia da covid-19. Em uma das publicações questionadas, o autointitulado conservador chamou o diretor-geral da Organização Mundial da Saúde, Tedros Adhanom, de ‘serviçal’ da ‘ditadura comunista da China’.

A análise sobre o caso foi retomada na 4ª Sessão Ordinária do CNMP com o voto do conselheiro Luciano Maia, que havia pedido mais tempo para analisar o caso. O procurador-geral da República, Augusto Aras – que tem Ailton como seu aliado – se declarou suspeito e o relator, Silvio Amorim, restou vencido por considerar que o questionamento quanto a uma das postagens já havia prescrito.

Ao apresentar seu voto, Luciano Maia ponderou que Ailton Benedito se manifestou ‘de forma continuada utilizando-se de discurso de ódio, discriminação, xenofobia e expressões ofensivas em relação a chefes de estado, ao diretor-geral da OMS e a colegas e membros do Ministério Público brasileiro’, ‘propagando informações inverídicas’.

O conselheiro chegou a ler a íntegra de uma das publicações que motivaram o pedido de abertura do PAD. “Eis a ditadura comunista da China em ação. Ela que usa um serviçal para comandar a OMS, que governadores e prefeitos do Brasil estão invocando para impor ditaduras estaduais e municipais às respectivas populações violentando a Constituição e a lei 13.979/2020”, escreveu Ailton Benedito no Twitter em 26 de março de 2020.

 

Ainda segundo Maia, o procurador também adotou ‘expressão pejorativa’ para se referir ao coronavírus chamando-o de ‘vírus chinês’.

 

Alinhado com o presidente, o procurador Ailton Benedito também faz publicações em seu Twitter falando sobre o ‘tratamento precoce’ contra o novo coronavírus e chegou a cobrar explicações da plataforma sobre a decisão de marcar uma publicação do Ministério da Saúde como como ‘potencialmente prejudicial’ e com ‘informações enganosas’ ao incentivar medicamentos sem eficácia comprovada contra a covid-19.

 

Ao analisar o pedido de abertura de PAD contra o procurador, Maia destacou que a ‘repetição de teorias da conspiração contra a China, indicando ser a China a culpada pelo surgimento e disseminação proposital do novo coronavírus, não encontra amparo’ na liberdade de expressão.

“Não apenas fere a dignidade do povo chinês, mas também acaba afetando a percepção que a maioria tem dos integrantes daquele país, reforçando estigmas e estereótipos negativos e estimulando discriminações. O direito a liberdade de expressão não consagra discursos de ódio e discriminações de xenofobia, dado que o direito individual não pode constituir-se salvaguarda de condutas ilícitas”, ponderou o conselheiro.

Maia registrou ainda que, em casos em casos de discursos da mesma natureza que o de Benedito, o papel do CNMP é ‘assegurar que a observância dos deveres funcionais prevaleça sobre eventuais ideologias pessoais ou políticas baseadas no ódio e na exclusão, com eventual punição de excessos’.

Segundo o conselheiro, há justa causa para instauração do PAD, tendo em vista os indícios suficientes de materialidade e autoria quanto a prática, em tese, de ‘violação aos deveres funcionais de tratar com urbanidade as pessoas com as quais se relaciona em razão do serviço e guardar decoro pessoal’. A pena para tal infração disciplinar é a de censura.

Ativo nas redes sociais, Aílton Benedito elenca, em seu perfil do Twitter, a ‘ordem’, a ‘liberdade’, a ‘Justiça’ e o ‘conservadorismo’ em sua própria descrição. Na plataforma, é crítico contra quem classifica como ‘esquerdistas’.

Em 2019, o procurador chegou a ser indicado pela ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves – em apoio do presidente Jair Bolsonaro – para uma cadeira na Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos. A indicação foi barrada pelo Conselho Superior do Ministério Público Federal.

COM A PALAVRA, A PROCURADORIA DA REPÚBLICA EM GOIÁS

A reportagem entrou em contato, por e-mail, com a assessoria de imprensa do MPF em Goiás. O espaço está aberto para manifestações.

Estadão