Delegado afastado por divergir de Salles: “Cantem de alegria”

Todos os posts, Últimas notícias

 

Fotos: REUTERS/Ueslei Marcelino e Wérica Lima/ Inpa

O delegado Alexandre Saraiva, ex-superintendente da Polícia Federal do Amazonas que caiu após enviar ao Supremo Tribunal Federal noticia-crime contra o ministro Ricardo Salles, comemorou, em seu perfil no Twitter, a operação que fez buscas contra o chefe do Ministério do Meio Ambiente nesta quarta, 19. Saraiva compartilhou uma matéria sobre a Operação Akuanduba e reproduziu trecho de um salmo bíblico: “Regozijem-se os campos e tudo o que neles há! Cantem de alegria todas as árvores da floresta”.

Em outra publicação, o delegado compartilhou uma imagem sobre a investigação que mira ‘grave esquema de facilitação ao contrabando de produtos florestais’ e registrou: “Tudo pela Amazônia”. Em seguida, sem mencionar as apurações ou Salles, o delegado publicou a imagem de um personagem do desenho animado ‘Carangos e Motocas’ com balão de fala registrando: “Eu te disse, eu te disse”.

 

Também sem citar a operação aberta nesta quarta após autorização do ministro Alexandre de Moraes, do STF, Saraiva escreveu: “As funções da PF(Art. 144, CF) transcendem às pessoas, pois possuem ‘padrões de comportamento recorrentes, valorizados e estáveis’. Raul Seixas resumiu: “e não adianta nem me dedetizar, porque você mata uma e vem outra em meu lugar…”

No Twitter, Saraiva costuma compartilhar informações sobre as operações da PF e também comenta sobre as estratégias para a exportação de madeira ilegal identificadas pela corporação. O perfil foi criado logo após o ex-superintendente da PF no Amazonas ser substituído, sendo que, na ocasião, o delegado afirmou ao Estadão que ‘não havia sido comunicado’ sobre a troca no comando da unidade. Na semana seguinte à mudança, Saraiva fez a primeira publicação na rede social afirmando, em letras maiúsculas: “Não vai passar boiada nenhuma!!!”.

A indicação de Saraiva faz referência a fala do ministro do Meio Ambiente na reunião ministerial de 22 de abril de 2020, tornada pública no âmbito no inquérito que apura suposta tentativa de interferência política de Bolsonaro na PF. Na ocasião, Salles disse que era preciso aproveitar a ‘oportunidade’ que o governo federal ganha com a pandemia do novo coronavírus para ‘ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas’.

“Nós temos que tá com a artilharia da AGU preparada pra cada linha que a gente avança ter uma coi… mas tem uma lista enorme, em todos os ministérios que têm papel regulatório aqui, pra simplificar. Não precisamos de Congresso. Porque coisa que precisa de Congresso, também, nesse fuzuê que está aí, nós não vamos conseguir aprovar. Agora tem um monte de coisa que é só parecer, caneta, parecer, caneta. Sem parecer também não tem caneta, porque dar uma canetada sem parecer é cana. Então, isso aí vale muito a pena. A gente tem um espaço enorme pra fazer”, disse Salles no encontro revelado no âmbito do inquérito sobre suposta tentativa de interferência política do presidente Jair Bolsonaro na Polícia Federal.

Um ano após a fatídica reunião, Saraiva imputou a Salles supostos crimes de obstrução de investigação ambiental, advocacia administrativa e organização criminosa. Segundo o delegado, além de dificultar a ação de fiscalização ambiental, Salles ‘patrocina diretamente interesses privados (de madeireiros investigados) e ilegítimos no âmbito da Administração Pública’ e integra, ‘na qualidade de braço forte do Estado, organização criminosa orquestrada por madeireiros alvos da Operação Handroanthus com o objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza’.

A fala de Salles sobre o ‘passar a boiada’ também foi citada pela Polícia Federal ao pedir a Alexandre de Moraes a abertura da Operação Akuanduba. Os investigadores apontaram que tal ‘modus operandi’ (parecer, caneta) teria sido aplicado na questão das exportações ilícitas de madeira, com a elaboração ‘de um parecer por servidores de confiança em total descompasso com a legalidade’ – um despacho assinado pelo presidente do Ibama, Eduardo Bim, que liberou a exportação de madeira de origem nativa, sem a necessidade de uma autorização específica. O documento foi suspenso por ordem do ministro Alexandre de Moraes.

Salles classifica que Operação desta quarta como ‘exagerada’ e ‘desnecessária’
Salles se pronunciou sobre a Operação Akuanduba após participar de um seminário realizado em Brasília, na manha desta quarta-feira, 19. O ministro do Meio Ambiente disse que ficou “surpreso” com a operação, a qual classificou como “exagerada” e desnecessária”.

“Faço aqui uma manifestação de surpresa com essa operação que eu entendo exagerada, desnecessária. Até porque todos, não só o ministro, como todos os demais que foram citados e foram incluídos nessa legislação tiveram sempre à disposição pra esclarecer quaisquer questões”, afirmou Salles.

Segundo o ministro, o Ministério do Meio Ambiente, desde o início de sua gestão, “atua sempre com bom senso, respeito às leis e respeito ao devido processo legal” do setor.

“Entendemos que esse inquérito, dos pouco que sabemos, porque eu não tive acesso ainda, ele foi instruído de uma forma que acabou levando o ministro relator, induzindo o ministro relator (Alexandre de Moraes) a erro, induzindo que teria havido uma ação concatenada de agentes do Ibama e de Ministério do Meio Ambiente Para favorecer ou para fazer o destravamento indevido do que quer seja”, declarou Salles, reafirmando que “essas ações jamais, repito, jamais aconteceram”.

Estadão