Ex-delegado aperta bolsonarismo na CPI

Todos os posts, Últimas notícias

Foto: Leopoldo Silva / Agência Senado

Na CPI da Covid, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) virou referência para os colegas por uma habilidade que não é comum na política — a de encurralar depoentes para produzir informação. Delegado da Polícia Civil por 17 anos antes de virar senador, Vieira agora aplica o método policial no Legislativo.

Apesar de ser suplente, ele tem destaque tanto nos debates, como nos bastidores. Além das suas perguntas serem um momento aguardado nos depoimentos, participa das reuniões semanais com a cúpula do colegiado e auxiliou na elaboração do plano de trabalho desde o início. Tem sido procurado por colegas em busca de uma visão mais sistemática da investigação.

A maior diferença de uma CPI para uma investigação policial, segundo ele, é a necessidade de formar maioria para avançar em algumas medidas. Vieira, por exemplo, defende a aprovação de quebras de sigilo e a convocação de Carlos Bolsonaro (RJ), filho do presidente da República, e Walter Braga Neto, ministro da Defesa.

— Atuo dentro da compreensão de onde eu estou. Eu não estou na delegacia, estou no Senado — disse Alessandro ao GLOBO.

Ele citou como exemplo dessa diferença a reunião secreta da CPI na semana passada, em que se decidiu retirar prefeitos da lista de convocados. No encontro, de acordo com o senador, foi preciso dar um passo para trás e fazer “o jogo político” para avançar em outras frentes, como a inclusão de governadores.

— Na investigação tradicional, a investigação policial, tem um ponto muito mais fácil que é você ter regras claras de que todo mundo está na mesma linha com o mesmo objetivo, você quer elucidar o crime e prender o bandido. Numa CPI você tem dificuldade com as regras, porque elas não são claras. Você não sabe exatamente até onde você pode ir. E outra pessoa que não está com a mesma intenção que a sua pode ultrapassar essas regras.

Viera ressalta que o ponto positivo de uma CPI é a pressão para que a investigação avance. Ele foi exonerado do comando da Polícia Civil em Sergipe em 2017 após conduzir investigações que atingiam aliados do governador. Na CPI da Covid, qualquer interferência para abafar a apuração não teria sucesso, opina.

O parlamentar avalia que a CPI não avançou até agora em quebras de sigilo porque nem todos os colegas entendem as características da medida.

— A gente tem a necessidade de, numa investigação de um pouco mais de profundidade, usar quebras de sigilo. Eu não consegui colocar em votação nenhuma quebra porque vários colegas não entendem bem o instituto, o que podem ou não fazer. Isso vai retardando o funcionamento, porque quebras não são coisas instantâneas. Se eu quebrar no último dia de CPI não vai adiantar nada.

Vieira também reclama de até agora não ter sido realizada a convocação de Braga Netto, uma vez que ele ocupava a Casa Civil e coordenava um comitê de enfrentamento à pandemia.

— É óbvio que a gente precisa chamar o general Braga Netto, ele tem participação central em vários episódios desses, ele coordenava a unidade criada para dar respostas… Ele era o coordenador, participou de dezenas de reuniões, mas eu não consigo ainda colocar em pauta a convocação dele. Porque politicamente você se preocupa “é o ministro da Defesa”, “é um general quatro estrelas”… — afirmou .

O mesmo vale, na sua visão, para a convocação de Carlos Bolsonaro, que segundo relatos do ex-secretário de comunicação Fabio Wanjgarten e de executivos da Pfizer participou de reunião na qual foi debatida a compra da vacina produzida pela farmacêutica.

— Se eu tenho como referidos em uma reunião A, B e C, eu tenho que chamar os três, não me interessa se o C é o Carlos. Na política o pessoal fica “pera aí, mas é o filho do presidente, será que não vai gerar um problema”? — diz.

O senador delegado avalia ainda que foi “política” a decisão do presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), de não prender em flagrante por falso testemunho Wanjgarten, após ter havido uma compreensão da comissão de que ele mentira em seu depoimento. Ele garante que o resultado seria outro, caso se tratasse de uma investigação tradicional.

O Globo