Grupo anônimo cria site para contra-atacar Bolsonaro

Todos os posts, Últimas notícias

Foto: Reprodução

Com o compromisso de “se unir e revidar” contra apoiadores do governo que “jogaram desmarcados por muito tempo”, um coletivo anônimo tem se valido de táticas que também são usadas por bolsonaristas para difusão nas redes sociais de conteúdo contrário ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

Na última semana, eles lançaram um site chamado Bolsoflix, plataforma de vídeos com pesadas críticas ao presidente da República, que citam problemas do governo federal, a condução da pandemia e suspeitas sobre a família Bolsonaro.

Desde então, o grupo têm articulado apoios para a criação e administração de grupos que distribuam esses vídeos em aplicativos de mensagens como Telegram e WhatsApp.

Ao mesmo tempo, usuários das redes sociais têm levantado questionamentos sobre quem são os criadores do site, quais os seus objetivos, quem os financia e por que coletaram dados de usuários que compartilham os vídeos.

Mas o grupo trabalha para amenizar eventuais suspeitas. Por email, sem se identificar, os responsáveis pelo Bolsoflix disseram à Folha que, sim, assim como os bolsonaristas, eles tentam criar redes próprias de distribuição de conteúdos nos aplicativos e “construir uma cultura de compartilhamento ampla para que bons conteúdos cheguem no maior número de pessoas”.

Acrescentam, no entanto, que se diferenciam de redes ligadas ao presidente. “As redes bolsonaristas usam fake news, incitam violência, usam robôs que fingem ser pessoas, entre outros mecanismos antiéticos e antidemocráticos –e nós não fazemos nem faremos isso”, afirmam.

“O bolsonarismo largou na frente [na formação de grupos], mas dá pra correr atrás do tempo perdido sem usar práticas inaceitáveis que eles usam”, dizem.

Todo o conteúdo disponível no site, segundo eles, já estava disponível na internet, e o Bolsoflix funciona como uma “curadoria dos vídeos que mais circulam nas redes”. Ao menos por enquanto.

Há, por exemplo, compilação de críticas que Bolsonaro fez à vacina contra a Covid-19, às investigações relacionadas aos filhos do presidente e comparações de suas atitudes com a de ditadores.

Inicialmente, para baixar os vídeos era necessário solicitá-los via WhatsApp a um número do Canadá, o que provocou críticas na internet a respeito de possível armazenamento dos dados das pessoas que queriam compartilhar as críticas.

Esse WhatsApp foi derrubado, e o Bolsoflix incluiu no site um acesso a todo o seu repositório de vídeos. Para baixar, passou a ser necessário que o usuário apresente apenas um nome ou pseudônimo e opcionalmente acrescente email e número de telefone.

Em um grupo de Telegram, os administradores do Bolsoflix explicaram a estratégia: “Ah, mas pra que vocês querem meu email e número de zap?”, questionaram a si mesmos, em uma postagem. E responderam: “Jogo aberto aqui: pra fazer mais campanha contra o Bolsonaro. Pra mandar mais vídeo. Pra formar e fortalecer redes anti Bozo. Pra criar cultura de compartilhamento. Porque esse genocida não pode ter mais tempo de Planalto”.

Quando foi lançado, o site foi incensado na internet por políticos do PSOL: o ex-presidenciável Guilherme Boulos, o ex-deputado Chico Alencar (RJ) e os deputados Ivan Valente (SP) e Talíria Petrone (RJ) foram alguns dos compartilhadores do conteúdo.

O grupo, porém, diz não ter ligação com o PSOL ou qualquer outro partido. “Não estamos a serviço de nenhum candidato ou partido. Só não queremos mais ele [Bolsonaro] na Presidência, e sabemos que muito mais gente tampouco quer.”

 

Quem criou o Bolsoflix tomou cuidados para preservar sua identidade. Não há nenhuma informação que identifique o autor (ou autores) no próprio site.

As informações pessoais dos criadores foram ocultadas também em serviços um pouco mais avançados que podem identificar quem registrou um endereço na web —ou seja, a quem o nome “www.bolsoflix.com” pertence.

Essas medidas, no entanto, não são complexas de serem executadas e não exigem muito conhecimento técnico. O serviço, inclusive, é oferecido pela Strikingly.com, o criador de sites usado para fazer a página do Bolsoflix.

Nesses casos, o registro da página é feito no nome de uma empresa especializada, e não do próprio dono. É por isso que, ao buscar as informações sobre o Bolsoflix, aparecem as informações da empresa americano-canadense Tucows, um dos principais do mundo no setor e prestadora de serviços para a Strikingly.

O conteúdo do site está armazenado em um servidor da Amazon em San José, na Califórnia (EUA). A gigante de tecnologia é outra parceira comercial da Strikingly e hospeda os sites criados no serviço.

Eles têm dito que sofreram ataques por causa do número de WhatsApp que usaram, que acabou derrubado em poucas horas, e conseguiram responder a cerca de 1.000 das mais de 6.000 pessoas que solicitaram vídeos.

Agora, estão implementando um sistema que permite às pessoas baixarem vídeos individuais direto do site.

“Nosso canal de vídeos para exibição também foi derrubado, e tivemos que trocar de plataforma. Entre outras coisas. Como estamos usando diversas medidas de segurança, não conseguiram acessar nada e nem tirar o site do ar.”

Dizem que “teorias da conspiração são inevitáveis”, mas receberam “algumas críticas super válidas”. “Por exemplo, sobre a falta de uma política clara de uso de dados, o que solucionamos muito rapidamente, ainda no final de semana de lançamento do site.”

O custo de desenvolvimento e manutenção do site, segundo eles, é bem baixo, e as despesas foram pagas pelos próprios organizadores.

No Telegram, o Bolsoflix passou nos últimos dias angariando voluntários para a administração dos grupos de WhatsApp.

Segundo os criadores do site, o “pseudonimato” foi escolhido por questões de segurança. “Sabemos bem o tipo de perseguição que opositores do governo sofrem, seja por milícias digitais, seja por órgãos de Estado que cometem abusos sob as ordens do presidente”, dizem.

Folha de S. Paulo