Novo presidente do Equador já faliu o país no passado

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Foto: ECUADOR PRESIDENCY / via REUTERS

O novo presidente do Equador, Guillermo Lasso, é um banqueiro neoliberal, que foi ministro da Economia há 22 anos, realizando uma brevíssima – mas caótica – administração, que levou à falência de diversos bancos. Ele tentou três vezes a presidência da República. E, como diz o ditado, a terceira foi a vencida, já que foi eleito para ser o novo inquilino do Palácio Carondolet, a sede do governo. Na ocasião, Lasso derrotou Andrés Arauz, o candidato apadrinhado pelo ex-presidente Rafael Correa, que está em um auto-exílio na Bélgica para escapar da condenação a oito anos de prisão por corrupção no Equador.

No primeiro turno Lasso obteve apenas 19% dos votos, enquanto que seu rival Andrés Arauz teve 32,7%. Arauz e Correa celebraram. Os analistas duvidavam entre apostar no crescimento do candidato correísta e apostar por uma guinada na qual parte dos outros 67,3% dos eleitores que não haviam votado em Arauz e eventualmente prefeririam votar em Lasso.

O anti-correísmo foi mais forte e venceu Lasso. E parte desse voto anti-correísta veio das fileiras indígenas, já que as comunidades dos povos originários, embora não fossem com a cara de Lasso, detestavam Correa, com o qual tiveram uma longa série de confrontos no passado.

Também colaborou na vitória de Lasso uma guinada na campanha eleitoral entre o primeiro e segundo turno, ao reconfigurar inesperadamente sua imagem, até aparecendo de tênis vermelhos, dançando “Bad” de Michael Jackson na rede Tik Tok. Simultaneamente moderou seu discurso conservador e aproximou-se de minorias.

Lasso tomou posse nesta segunda-feira, dia 24 de maio, com apenas 8,7% das cadeiras no Parlamento. Seus principais rivais, os “correístas”, possuem 36% das cadeiras. Por isso Lasso decidiu aliar-se às emergentes forças indígenas, (que em 2019 protagonizaram os intensos protestos sociais) e com outros setores de centro-esquerda e esquerda. No entanto, isso acabou com o apoio que tinha do Partido Social Cristão, de direita. A soma de todas as alianças de Lasso (todos acordos pontuais) lhe permitiria chegar a 64 votos, apenas a 5 votos da maioria simples.

Desta forma desponta um peculiar cenário no qual um presidente de direita dependerá de forças de esquerda e centro-esquerda para poder governar.

E assim se encerra o governo do presidente Lenín Moreno, um dos mais impopulares desde a virada do século, cuja candidata a presidente, Ximena Peña, teve apenas 1,5% dos votos. Sua influência política promete ser nula no futuro.

Lasso recebeu um país que “está pitiado”, expressão usada pelos equatorianos para indicar algo complexo, problemático. O Equador teve uma queda de 7,8% do PIB no ano passado. A perspectiva para este ano é de um aumento do PIB de apenas 3%.

A economia está dolarizada e depende muito das exportações de petróleo do país. A pobreza assola 25% dos equatorianos e o desemprego atinge 8,59% dos trabalhadores. Desde os últimos anos do ex-presidente Correa o país tem um crescente endividamento externo que se agravou mais com o presidente, Lenín Moreno, que deixa o poder hoje. A dívida pública equatoriana equivale a 63% do PIB.

Além disso, o Equador sofre a crise sanitária devido à pandemia da Covid-19. Em 2020 a cidade de Guayaquil foi o dantesco cenário de cadáveres empilhados nas calçadas devido à pandemia. Essas cenas não se repetiram em 2021, mas preocupa a lerdeza da vacinação, já que apenas 6,9% da população foi vacinada.

Desde que a pandemia começou, o Equador teve seis ministros da Saúde. E com Lasso assumiu a sétima ministra.

Na economia o cenário também é dantesco: o PIB caiu 7,8% no ano passado e só cresceria 3% neste ano. A economia está dolarizada e depende muito das exportações de petróleo do país. A pobreza assola 33% dos equatorianos e o desemprego atinge 8,59% dos trabalhadores.

Desde os últimos anos do ex-presidente Correa o país tem um crescente endividamento externo que se agravou mais com o presidente, Lenín Moreno, que deixa o poder hoje. A dívida pública equatoriana equivale a 63% do PIB.

Lasso é conservador e neoliberal. No entanto, não se parece ao presidente brasileiro Jair Bolsonaro. Por exemplo: antes mesmo de assumir Lasso evitou chiliques ideológicos similares aos protagonizados pelo presidente brasileiro e deslanchou negociações para comprar vacinas da China, com quem quer ter boas relações, e também da Rússia.

O novo presidente não defende a última ditadura militar que o Equador teve, encerrada em 1979.

Além disso, Lasso disse que combaterá a “violência de gênero”. “Gênero” é palavra malvista pelos bolsonaristas. Ele também disse que lutaria contra o feminicídio, outra conceito jurídico que incomoda o bolsonarismo.

Dias atrás o Supremo Tribunal de Justiça despenalizou o aborto por estupro. Lasso, da Opus Dei, por questões religiosas, sempre foi contra a legalização. No entanto, na semana passada, considerando que a divisão de poderes estava acima de qualquer questão religiosa, declarou que respeitará a decisão dos juízes.

No quesito “povos originários” ou indígenas, Lasso e Bolsonaro tampouco estão em sintonia. Há pouco mais de um ano Bolsonaro disse que os indígenas “estão evoluindo, cada vez mais um ser humano como nós”.

Na contramão de Bolsonaro, Lasso colocou na pasta da Educação uma ex-funcionária da Unesco, com a missão de criar escolas interculturais bilíngues para as comunidades indígenas, em respeito à diversidade cultural. Aliás, a cerimônia de posse a que Bolsonaro assistiu foi comandada por uma representante dos indígenas, Guadalupe Llori, de centro-esquerda, presidente do Parlamento, que fez um discurso em defesa da ecologia e dos direitos humanos.

Um diplomata equatoriano de direita me ressaltou que, além dessas diferenças, na vida pessoal Lasso é um real conservador. Ele está casado com a mesma mulher, Maria de Lourdes Crespo, desde 1980. Nunca se divorciou, ao contrário de Bolsonaro, que já passou por duas separações e está no terceiro casamento. Todos os filhos de Lasso foram dentro do casamento, algo que um conservador real – e religioso – considera uma sacrossanta instituição. Bolsonaro teve um filho, Jair Renan, fora de casamentos. “Bolsonaro sequer consegue ser um verdadeiro conservador na vida pessoal”, indicou com um sorriso irônico.

Na contramão dos conservadores sul-americanos, Lasso designou mulheres para quase metade dos ministérios e também prometeu o respeito dos direitos da comunidade LGTBi.

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