Papa desequilibra os conservadores

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Foto: Reprodução/ Folha

Poucas coisas têm sido tão complicadas para os conservadores como lidar com um papa não convencional como é o argentino Jorge Bergoglio, vulgo Francisco.

A última gracinha dele, sobre no Brasil as pessoas beberem cachaça demais e rezarem de menos, gerou um dilema para muitos seguidores fervorosos da fé católica, que por definição seguem o dogma da infalibilidade papal.

Francisco sempre foi visto com certa desconfiança por parte significativa da direita, considerado um líder com simpatias que beiram o progressismo, tanto nas ideias, como no estilo.

Ele fala demais sobre temas como ambientalismo, direitos humanos e minorias, o que o distancia de seus antecessores Bento 16 e João Paulo 2º, esses sim ídolos dos conservadores.

Mas criticar abertamente o papa ainda parece ser um certo tabu para os principais influenciadores digitais conservadores da base do presidente Jair Bolsonaro.

Um dos principais, o youtuber católico Bernardo Kuster, manteve respeitoso silêncio. Mesmo líderes evangélicos, que não teriam motivo para poupar o chefe de uma religião concorrente, deixaram de se manifestar.

Isso não significa que a fala do papa tenha descido redondo, como mostra uma seleção de manifestações de conservadores em redes sociais.

Houve quem pintasse Francisco de vermelho.

 

E quem o acusasse, sem meias palavras, de seguir o comunismo (que, aliás, professa o ateísmo).

Também foi ressuscitado o velho fantasma do filósofo italiano Antonio Gramsci, ideólogo do que os conservadores consideram pai do pecado mortal do “marxismo cultural”.

 

E, num ataque particularmente pesado, houve referência à aprovação na Argentina, onde o papa nasceu, da lei que amplia o direito ao aborto.

 

O fato de o líder católico ter recebido o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no Vaticano não ajuda em nada a melhorar sua popularidade com a direita. No Twitter, houve diversas referências jocosas ao fato de a cachaça mencionada por Francisco ser lembrança do bafo do ex-presidente.

Isso significa que os conservadores vão romper com o Vaticano? Longe disso. O efeito mais provável é o oposto: tornar ainda mais ferrenha a direita católica brasileira, que se organiza no próprio clero e em organizações leigas, como o Centro Dom Bosco.

Quanto a Francisco, seguirá dando um nó na direita, a cada estripulia nova que aprontar.

Folha de S. Paulo