Pazuello acusa Governo do Amazonas por falta de oxigênio

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Foto: PABLO JACOB / Agência O Globo

Na retomada do depoimento de Eduardo Pazuello na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid-19, nesta quinta-feira, o ex-ministro da Saúde alegou que decisões sobre compra de vacinas não eram “só de uma pessoa” e também culpou o governo do Amazonas e a empresa fornecedora White Martins pela falta de oxigênio em Manaus no colapso hospitalar em janeiro.

Pazuello alegou ainda que teria ocorrido um “roubo” que levou à divulgação indevida do aplicativo TrateCov, que receitava cloroquina até para bebês, embora a plataforma tenha sido divulgada por canais oficias do governo.

A declaração de Pazuello sobre compra de vacinas ocorreu ao ser questionado pelo senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) sobre a adesão ao consórcio Covax Facility. Inicialmente, o ex-ministro disse que a decisão se deu “no âmbito da Casa Civil”, então chefiada pelo também general Walter Braga Netto. Pazuello admitiu que foi sua a decisão de compra da cobertura mínima, com 10% das doses, mas em seguida disse que as decisões sobre vacinas eram tomadas em grupo.

— A decisão não é só de uma pessoa, é do grupo que está trabalhando, é um colegiado — disse Pazuello.

Pazuello também reiterou, durante os questionamentos de Alessandro Vieira, que não protelou a assinatura do contrato com a farmacêutica Pfizer e alegou ter formalizado o memorando de entendimento (MOU) com a empresa “independente (da anuência) da assessoria jurídica” do governo, citando supostas resistências da Controladoria-Geral da União (CGU) e da Advocacia-Geral da União (AGU) ao negócio.

Pazuello também foi instado a se explicar novamente sobre o recuo na intenção de compra da vacina Coronavac, após ser desautorizado pelo presidente Jair Bolsonaro, e respondeu a um questionamento do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) dizendo que não mandou retirar do Twitter do Ministério da Saúde qualquer postagem anunciando a compra. Na pergunta, Randolfe citou um tuíte deletado após a fala de Bolsonaro.

— Algum servidor pode ter tirado. Eu não mandei tirar nada de Twitter — disse Pazuello.

A sessão já registrou um bate-boca entre senadores governistas e oposicionistas, ainda pela manhã, depois que o senador Marcos Rogério (DEM-RO), aliado do governo Bolsonaro, exibiu um vídeo na tentativa de atribuir a governadores a recomendação pelo uso de cloroquina.

Indagado no início da sessão pelo senador Eduardo Braga (MDB-AM) de quem seria a responsabilidade pela falta de oxigênio em Manaus, Pazuello procurou eximir o Ministério da Saúde e alegou que a pasta é abastecida com informações repassadas pelas secretarias estaduais e municipais.

— Fica claro para mim que a preocupação com o acompanhamento do oxigênio não era um foco da Secretaria de Saúde do Amazonas, porque não faltou oxigênio e ficou focado em outras coisas, isso lá em dezembro ainda. No plano apresentado pela secretaria para nós não foi apresentada nenhuma medida sobre oxigênio — disse Pazuello, acrescentando:

— A empresa White Martins já vinha consumindo sua reserva estratégica e não fez isso de forma clara. Essa é a primeira responsabilidade. Se a Secretaria de Saúde tivesse acompanhado de perto, teria descoberto que estaria consumindo a reserva estratégica. Vejo aí duas responsabilidades muito clara. Começa na empresa. E a outra da Secretaria e Saúde. Da nossa parte fomos muito proativos a partir do momento em que tomamos conhecimento.

Braga relembrou que escreveu uma carta ao presidente Jair Bolsonaro para pedir intervenção federal na área da saúde do Amazonas, em janeiro. Ele questionou Pazuello por que o pedido não foi aceito. O ex-ministro afirmou que o assunto foi tratado numa reunião com a presença de Bolsonaro.

— Essa decisão não era minha, foi levada à reunião de ministros, com o presidente presente, e o governador (do Amazonas) se explicou, então foi decidido pela não intervenção — alegou Pazuello.

Questionado em outro momento sobre qual foi o argumento apresentado pelo governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), para evitar a intervenção federal, Pazuello respondeu que não lembra dos detalhes.

— Tenho lembrança, mas não tenho dado real. Mas a argumentação, em tese, era de que o estado tinha condição de continuar fazendo a resposta dele. Em tese. Os detalhes eu não tenho exatamente aqui. O resumo da argumentação é que ele teria condições de continuar — disse Pazuello.

Pazuello se retratou ainda de uma declaração no primeiro dia de depoimento, quando disse que deixou o Ministério da Saúde porque estava com a “missão cumprida”.

— A compreensão de missão é muito militar. Por isso talvez as pessoas não tenham compreendido quando eu disse com missão cumprida, da minha fatia da missão, daquele pedaço, não a missão completa e ampla de combater a pandemia no país e entregar o país pronto e limpo, isso é muito maior. O tempo que foi me dado da missão é uma parte diferente do todo — disse Pazuello.

O ex-ministro disse que aproveitou para fazer a ponderação porque a pergunta veio de Angelo Coronel (PSD-BA), que supostamente entenderia do assunto. O senador, no entanto, esclareceu que não é militar e que Coronel é apenas o seu sobrenome.

Pazuello também afirmou, durante as perguntas, que sofreu com a crise em Manaus, especialmente por ter familiares e amigos lá.

O senador Eduardo Girão (Podemos-CE) disse que o governo brasileiro errou ao não agradecer a Venezuela por ter mandado oxigênio para o Amazonas.

— Gratidão precisa ter, precisa ser demonstrada — disse Girão.

Depois, em contraponto, perguntou se o governo venezuelano agradeceu o Brasil pela operação de acolhida de imigrantes venezuelanos, que foi coordenada por Pazuello antes de ele virar ministro da Saúde. Pazuello disse que não.

— Errou também. Deveria — disse Girão.

Ao ser confrontando sobre imagens em que aparece divulgando o aplicativo TrateCov, Pazuello admitiu que a plataforma foi apresentada, mas disse que não chegou a ser utilizada porque foi retirada do ar e descontinuada pela pasta.

Inicialmente, ele voltou a afirmar que o sistema do TrateCov foi “hackeado” e usado indevidamente antes da hora. Ele prometeu apresentar ao colegiado um boletim de ocorrência que foi feito após o episódio.

— Esse programa que o ex-ministro disse que foi hackeado, ele foi hackeado e colocado na TV Brasil. O hacker é tão bom que conseguiu colocar numa matéria extensa na TV Brasil — ironizou Omar Aziz sobre a divulgação que foi feita sobre a plataforma.

O ex-ministro também repetiu nesta quinta-feira que a secretária do Ministério da Saúde Mayra Pinheiro teve a ideia da plataforma como “uma calculadora que facilitasse o diagnóstico” dos médicos em momento crítico de Manaus.

O senador governista Marcos Rogério (DEM-RO) gerou controvérsia na CPI ao iniciar sua fala mostrando vídeos dos governadores João Doria (PSDB-SP), Wellington Dias (PT-PI), Flávio Dino (PCdoB-MA), Renan Filho (MDB-AL) e Helder Barbalho (MDB-PA), além do secretário de Saúde da Bahia, Fábio Vilas-Boas, no começo da pandemia falando sobre a distribuição de cloroquina contra a Covid-19. Todos os vídeos são de abril de 2020, antes de a Organização Mundial da Saúde (OMS) desaconselhar o uso de cloroquina.

O Globo