Pazuello nega assessoramento paralelo

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Foto: Rafaela Felicciano/Metrópoles

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid ouve, na manhã desta quarta-feira (19/5), o depoimento do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello. A sessão teve início pouco depois das 9h.

Pazuello chegou à sala da CPI por volta das 9h15, acompanhado de cinco auxiliares. Ele não está fardado, como havia sido considerado anteriormente.

Questionado sobre as tentativas da Pfizer em fazer negócio com o Brasil para a compre de vacinas contras a Covid-19, Pazuello afirmou que o governo brasileiro respondeu “ininterruptamente” aos contatos da farmacêutica inúmeras vezes e que assinou o contrato, apesar da negativa dos órgãos de controle. Segundo ele, foram dadas mais de 20 respostas em meio às negociações.

“É preciso compreender que a prospecção da Pfizer começou em abril, maio. Estamos falando de uma vacina completamente diferente e de uma empresa que não topava discussão da tecnologia consco. Era porteira fechada. Essas discussões caminharam até junho. Quando tivemos o primeiro memorando de entendimento, dava essa quantidade que o senhor [Renan Calheiros] diz aí, sem data. Totalizando 70 milhões até o fim do ano. Esse contrato chegou com cinco cláusulas assustadoras à época”, disse.

Antes de responder às perguntas do relator, Renan Calheiros (MDB-AL), Pazuello lembrou a gestão que fez na Saúde e afirmou que o Supremo Tribunal Federal (STF) limitou as ações do governo federal.

“Decisão do STF em abril de 2020 limitou ainda mais a atuação do governo federal nessas ações. Assim, não há possiblidade de o Ministério da Saúde interferir na execução das ações de estado da Saúde sem usurpar as competências dos estados e municípios. Isso só seria possível em caso de uma intervenção federal da saúde no estado”, disse.

Pazuello se referiu à decisão do plenário da Corte que, por unanimidade, confirmou autonomia aos estados, municípios e ao Distrito Federal, mesmo com as medidas adotadas pelo governo de Jair Bolsonaro (sem partido), para conter o novo coronavírus.

Segundo o general, essa decisão do STF “serviu para reafirmar a competência dos estados e municípios”. “Bom lembrar que o gestor pleno do SUS é o secretário municipal de Saúde”, enfatizou.

O primeiro a perguntar foi o relator, que questionou se a nomeação de Pazuello ocorreu “sob a condição de cumprimento de alguma ordem específica, como recomendação de tratamento precoce”. O general respondeu: “Em hipótese alguma. Presidente [Bolsonaro] nunca me deu ordens diretas para nada”.

O ex-ministro negou a existência de um “assessoramento paralelo” do Palácio do Planalto para definir medidas de enfrentamento da crise sanitária. “Não tive assessoramento nem aconselhamento de grupos de médicos”.

Ele também rechaçou que os filhos de Bolsonaro participassem de reuniões do Ministério da Saúde. “Não havia nenhuma influência dos três filhos do presidente. Eu achava que ia encontrar mais com eles, e com o próprio presidente, mas não houve isso. A pandemia nos consumia o dia inteiro. [Foram] Muito poucos encontros, podia ter havido mais”.

É grande a expectativa dos senadores em torno da oitiva de Pazuello, uma vez que ele será o único ex-ministro a ser ouvido, até o momento, que não deixou o governo por atritos com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Dos ex-chefes da Saúde ouvidos, o general foi o que ficou mais tempo no cargo durante a pandemia da Covid-19, mesmo não sendo médico.

O depoimento do ex-ministro seria no último dia 5, mas, após ele alegar ter tido contato com dois servidores infectados pela Covid-19, foi remarcado para esta quarta-feira (19/5).

Na visão dos senadores, o adiamento foi um erro estratégico do general, que terá uma oitiva potencialmente pior, pois já foram ouvidos vários outros depoentes, como o ex-ministro das Relações Exteriores Ernesto Araújo, que reiteradamente jogou a responsabilidade pelos atos da pasta nos ombros de Pazuello.

Pazuello ficou cerca de 10 meses na pasta da Saúde. Ao assumir interinamente, em 16 de maio de 2020, o Brasil registrava 15.662 mortes por Covid-19; ao deixar a pasta, em 15 de março deste ano, o número de vítimas no país saltara para 279.602 óbitos.

Durante a gestão dele, ocorreu o colapso dos sistemas de saúde do país, quando hospitais por todo o país ficaram sem leitos de UTI e houve falta de medicamento para intubação, de seringas para a vacinação e até de oxigênio em vários municípios.

Também coube a Pazuello comandar a pasta durante o período crítico de negociações para compra e fabricação de vacinas. As dificuldades para que a imunização deslanche no país são outro tema pelo qual o ex-ministro terá que responder à comissão.

Logo após dizer que o ministério compraria 46 milhões de doses de Coronavac, que vinha sendo criticada duramente pelo presidente da República, Pazuello foi desautorizado por Bolsonaro e recuou. “É simples assim, um manda e o outro obedece”, disse o então ministro ao lado do chefe.

A crise do oxigênio foi particularmente grave em Manaus. Pazuello responde processo na Justiça por suposta omissão em relação ao colapso na capital do Amazonas e deverá ser pressionado a dar explicações aos senadores.

Houve também a promoção de cloroquina, medicamento sem comprovação científica de eficácia contra o novo coronavírus, e a adoção de um protocolo desejado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e rejeitado pelos antecessores de Pazuello no comando da Saúde.

Os senadores avaliam que os depoentes anteriores, de alguma forma, trouxeram elementos contrários ao ex-ministro. “Os elementos apontam para uma situação difícil para o senhor Pazuello. O melhor que ele faz é colaborar com a CPI. Ele está sendo abandonado e entregue aos leões”, afirma o vice-presidente da CPI da Covid, Randolfe Rodrigues (Rede-AP).

Diante da pressão, a Advocacia-Geral da União (AGU) entrou na última semana com habeas corpus no Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar garantir o direito de Pazuello ao silêncio e até a abandonar o depoimento se sentisse ofendido.

O ministro-relator Ricardo Lewandowski deferiu em partes — Pazuello pode se calar quando algo lhe incriminar, mas é obrigado a falar sobre terceiros, o que pode ser uma cilada para o ex-ministro da Saúde, que terá de falar sobre outras pessoas, inclusive sobre o presidente Jair Bolsonaro. Ele também não autorizou que o general saia do depoimento caso se sinta ofendido.

O senador governista Marcos Rogério (DEM-RO) alega que Pazuello não deve permanecer em silêncio e que o habeas corpus foi no sentido de evitar excessos ou abusos de poder contra o ex-ministro.

“Acho que ele vem com a disposição de falar e tem muito a dizer. Esteve à frente do ministério no momento mais delicado da pandemia, ofereceu respostas efetivas ao Brasil neste momento. Claro que uma pandemia como essa é um desafio grande e num ato ou outro pode ter havido cometimento de erro. Mas isso é diferente de ato intencional de boicotar ou prejudicar no enfrentamento à pandemia”, avaliou.

O relator da CPI da Covid, Renan Calheiros (MDB-AL), diz que, diante da decisão do STF, a estratégia é saber sobre terceiros. “Vamos fazer perguntas que não encalacrem o ministro, porque sabemos que ele não pode responder nada que o incrimine. Vamos tentar fazer perguntas que possam esclarecer os fatos. Quanto a ele, outras pessoas falarão.”

“Essa decisão do Supremo aclarou e deu mais segurança jurídica no aspecto do depoimento da testemunha, que agora estará obrigada a falar sobre tudo que não o incrimine. Isso alargou, sem dúvida, a segurança jurídica da investigação”, acrescenta.

Para finalizar a semana, a comissão ouvirá, nesta quinta-feira (20/5), a secretária de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro, conhecida como “Capitã Cloroquina”, que também ingressou com habeas corpus para ficar calada. Ela, porém, não obteve decisão favorável, em decisão também do ministro Ricardo Lewandowski.

A CPI da Covid-19 tem o objetivo de investigar as ações e omissões do governo federal no enfrentamento à pandemia e, em especial, no agravamento da crise sanitária no Amazonas com a ausência de oxigênio, além de apurar possíveis irregularidades em repasses federais a estados e municípios.

Metrópoles