STF se divide sobre ataque a Toffoli

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Foto: Rosinei Coutinho / SCO / STF

O julgamento do STF (Supremo Tribunal Federal) sobre a validade da delação premiada do ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral com a Polícia Federal começou nesta sexta-feira (21) com votos divergentes entre si.

Manifestaram-se sobre a controvérsia os ministros Edson Fachin, relator da Lava Jato na corte, Luís Roberto Barroso, Gilmar Mendes e Kassio Nunes Marques.

Barroso defendeu a manutenção do acordo. Gilmar e Kassio se posicionaram contra. Fachin, por sua vez, votou a favor da delação caso o plenário confirme a autonomia da Polícia Federal em firmar delações.

Primeiro a se manifestar, Fachin acolheu a tese da PGR (Procuradoria-Geral da República) de que é necessária a anuência do Ministério Público Federal nas colaborações negociadas pela PF. O acordo de Cabral não teve aval da PGR.

Para o ministro, portanto, prevalecendo esse entendimento, a homologação do acordo no caso do ex-governador do Rio deve ser anulada.

Caso o Supremo reconheça o poder da PF para firmar delações, mantendo as regras que o próprio tribunal fixou em 2018, o relator da Lava Jato se manifestou pela validação do acordo de Cabral.

A questão foi levantada em recurso contra a homologação do acordo de Cabral, no qual a PGR alegou a necessidade de anuência do Ministério Público nos acordos firmados pela polícia. No caso do ex-governador não houve essa anuência.

“Não é constitucionalmente admissível que a autoridade policial celebre acordo de colaboração previamente rejeitado pelo Ministério Público”, disse Fachin.

Na sequência, votaram Gilmar e Barroso.

Para Gilmar, o acordo de delação do ex-governador do Rio deve ser derrubado. Na questão preliminar, ele entendeu que a colaboração não pode ser validada porque a PGR a rejeitou. No entanto, restringiu-se ao caso específico, sem adentrar no debate sobre a possibilidade de a Polícia Federal firmar acordos.

Gilmar avaliou que a delação de Cabral não atende os padrões mínimos exigidos em lei para ser validada e que não há elementos de sua eficácia.

Barroso, por sua vez, votou para manter o acordo do ex-governador do Rio e o poder da polícia de firmar delações, devendo, segundo o ministro do STF, o juízo competente analisar caso a caso quem será alvo de inquéritos frutos da colaboração.

Quarto ministro a se manifestar, Kassio se alinhou ao colega Gilmar pela anulação do acodo, mas não divulgou o voto.

Para ele, a PF pode fechar acordos de delação premiada, sem oferecer benefícios que sejam de prerrogativa do Ministério Público.

O assunto foi submetido à análise do plenário por Fachin após a coluna Painel, da Folha, revelar o pedido da Polícia Federal para que fosse instaurado um inquérito para apurar a acusação de Cabral de que o ministro Dias Toffoli vendeu sentenças quando integrava o TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Na semana passada, Fachin indeferiu os pedidos de investigação contra Dias Toffoli, após a Procuradoria-Geral da República se manifestar contra a apuração.

Nesta sexta, ao votar pela anulação do acordo de delação de Cabral, Gilmar indicou a necessidade da instauração de uma investigação para apurar possível abuso de autoridade e violação de segredo profissional do delegado que pediu o inquérito contra o ministro do STF. A delação do ex-governador do Rio foi conduzida pelo delegado Bernardo Guidali, do Serviço de Inquéritos Especiais da PF.

Relator da Lava Jato no Supremo, Fachin homologou a delação de Cabral à PF em fevereiro do ano passado. A PGR recorreu e pediu para o Supremo invalidar o acordo com o do ex-governador.

É este recurso da PGR que está sendo analisado pelo plenário, julgamento realizado na modalidade virtual, com a inclusão dos votos dos ministros no sistema do tribunal. O debate começou nesta sexta e se encerra no dia 28.

Na delação, o ex-governador do Rio afirma que Toffoli recebeu R$ 4 milhões para favorecer dois prefeitos fluminenses em processos no TSE. Toffoli foi ministro do TSE de 2012 a 2016, tendo sido presidente da corte de maio de 2014 a maio de 2016.

Os pagamentos, diz Cabral, teriam sido realizados nos anos de 2014 e 2015 e operacionalizados por Hudson Braga, ex-secretário de Obras do Rio de Janeiro. Os repasses, na versão do delator, teriam envolvido o escritório da mulher de Toffoli, a advogada Roberta Rangel.

O ministro do STF diz não ter conhecimento dos fatos mencionados e que jamais recebeu os supostos valores ilegais.

Polícia e a PGR têm uma disputa antiga sobre colaborações premiadas. A Procuradoria costuma afirmar que a PF não pode firmar um acordo de delação sem a participação do Ministério Público.

O Supremo, porém, decidiu em 2018, com oito votos favoráveis, que a polícia pode, sim, celebrar acordo com delatores, independentemente do aval do Ministério Público.

No recurso apresentado ao Supremo sobre o caso de Cabral, a PGR pediu a invalidação do acordo, entre outros argumentos, sob a justificativa de que há “fundadas suspeitas” de que Cabral continua ocultando valores recebidos de forma ilícita e que isso viola “a boa-fé objetiva” da delação.

Na manifestação encaminhada ao STF, a Procuradoria disse que Cabral tenta constranger autoridades públicas com seu acordo para alcançar benefícios da delação.

Segundo a PGR, o ímpeto de Cabral em atacar essas autoridades é tão grande que ele atribuiu ao ministro Dias Toffoli a prática de crime ao arquivar os primeiros inquéritos abertos com base em seu acordo.

A defesa do ex-secretário de Obras do Rio Hudson Braga, apontado por Cabral como responsável operacionalizar os pagamentos a Toffoli, nega participação dele no caso.

“Hudson Braga nunca operacionalizou nada. Ele nunca sequer soube de qualquer situação que envolvesse o ministro Toffoli”, diz o advogado do ex-secretário, Roberto Pagliuso.

Ele afirmou ainda que Cabral, que cumpre pena de mais de 300 anos, “tenta, depois de condenado, criar situações para viabilizar a sua colaboração. Mas ele não tem qualquer apreço pela verdade. Nem produz qualquer prova de suas alegações”.​

Folha