Apesar de Bolsonaro, Brasil será tolerado no Conselho de Segurança da ONU

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Foto: 2.jun.21/Presidência da República/Divulgação

O Brasil deve ser eleito membro rotativo do Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas) pela 11ª ​vez nesta sexta-feira (11), após uma campanha feita sob o desgaste da imagem de Jair Bolsonaro no exterior.

Caso a eleição se confirme —o país é candidato único do grupo que engloba América Latina e Caribe—, o Brasil vai se tornar, ao lado do Japão, um dos mais frequentes participantes da entidade responsável por zelar pela paz no mundo.

O Conselho de Segurança é composto por cinco membros permanentes com direito a veto —Estados Unidos, China, Rússia, Reino Unido e França— e por dez integrantes rotativos, eleitos para mandatos de dois anos cada um. Para a vitória, são necessários os votos de dois terços dos 193 Estados-membros da Assembleia-Geral.

Com suas políticas negligentes diante da pandemia e das questões ambientais, Bolsonaro tem sofrido críticas severas de líderes em todo o mundo e é visto de forma negativa por grande parte da comunidade internacional.

Apesar disso, o embaixador Ronaldo Costa Filho, representante permanente do Brasil junto à ONU, afirma que não houve resistência à candidatura e que a tradição do país e de sua rede diplomática ajuda a imprimir previsibilidade às tratativas em processos como este, independentemente de quem ocupa o Planalto.

“Temos experiência, o Brasil tem uma rede diplomática de grande envergadura em todo o mundo. […] O país é escolhido por méritos próprios em sua capacidade, não do governo”, diz o embaixador.

“Nenhum país é isento de críticas, cada país tem as suas deficiências. Mas fiz uma campanha deixando claro que o Brasil ouvirá todos os países-membros antes e depois da eleição. Nesse processo todo, jamais ouvi menção a qualquer dificuldade com o Brasil como candidato. De maneira nenhuma houve resistência.”

Bolsonaro adota postura agressiva em relação à China e a diversos países europeus, não tem engajamento com nações africanas e o alinhamento de seu governo com Israel gera conflito com países árabes e islâmicos. Em razão dos embates e rusgas, há no Itamaraty quem afirme acreditar que o Brasil pode receber nesta sexta menos votos do que a quase unanimidade que teve em disputas anteriores —não o suficiente para perder a eleição, mas para sinalizar que, sob Bolsonaro, o país tem menos prestígio.

Costa Filho, por sua vez, afirma que não é possível prever o número exato de votos que o país vai angariar e pondera que sua preocupação é manter a boa reputação que o país tem no conselho.

“Aqui [na ONU] ninguém diz que não vai votar em você. […] Nossa preocupação não é atingir um número específico, é entrar para o conselho e manter a imagem de país sério, trabalhador e dedicado aos temas da manutenção da paz e segurança.”

O embaixador reforça a ideia de que o Brasil tem histórico de contribuição no Conselho de Segurança —das 72 missões de paz já autorizadas pela ONU, o país participou de 41— e bom trânsito entre os Estados-membros.

“O Brasil é um país que, por uma série de fatores históricos, culturais e geográficos, tem diálogo fluido e aberto com praticamente toda a comunidade internacional, sem distinção, e é respeitado neste papel de ponte entre vários interesses.”

Ao lado de Índia, Alemanha e Japão, o Brasil forma o chamado G4, grupo que pleiteia também uma vaga como membro permanente —e sem poder de veto— no Conselho de Segurança.

A inclusão de integrantes fixos, porém, depende de uma reforma no sistema que não tem perspectiva de acontecer —uma das principais oposições vem da China.​

Costa Filho diz que, entre as sete prioridades da campanha brasileira ao conselho, que incluem maior participação das mulheres no processo de manutenção da paz, por exemplo, está o pedido por uma reforma estrutural na entidade.

“Temos plena consciência de que esse tema não é negociado dentro do conselho, mas é uma sinalização de que a gente mantém essa prioridade na nossa agenda de política externa”, afirma o embaixador.

Se conseguir os votos suficientes nesta sexta, o Brasil ficará no posto rotativo do Conselho de Segurança de janeiro de 2022 a dezembro de 2023. Como a presidência da entidade também é rotativa —os países se revezam mensalmente, por ordem alfabética—, é muito provável que o Brasil assuma o comando da instância mais importante da ONU ao menos uma vez até o fim de seu mandato.

As vagas no conselho são definidas por áreas geográficas. Entre os países da América Latina e Caribe há uma tradição, desde 2006, de não haver competição de candidaturas e, dessa forma, organiza-se um rodízio de países em uma lista montada com anos de antecedência.

Em 2019, El Salvador quebrou o pacto e tentou lançar uma candidatura alternativa à de São Vicente e Granadinas, mas teve apenas seis votos, contra 185 obtidos pela ilha caribenha.

A última vez que o Brasil participou do Conselho de Segurança como membro rotativo foi em 2011, durante o governo Dilma Rousseff. A próxima candidatura brasileira estava marcada somente para 2033, mas, para não ficar mais de duas décadas fora do órgão, o Brasil negociou uma troca com Honduras, que seria a candidata natural deste ano. O acordo foi fechado em 2018, pelo governo Michel Temer.

Hoje, México e São Vicente e Granadinas são os atuais membros rotativos do conselho para América Latina e Caribe. Se eleito, o Brasil ocupará o posto ao lado do México e, no ano que vem, o Equador entrará no lugar dos mexicanos, se não houver nenhum imprevisto.

Folha de S. Paulo