Barroso insiste em efeitos deletérios do voto impresso

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Foto: Reprodução

O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Luís Roberto Barroso, disse que a implementação do voto impresso seria um retrocesso que ampliaria os riscos de fraudes, pioraria o processo eleitoral no país e poderia levar a um cenário em que o Judiciário daria a palavra final sobre os vencedores.

Em audiência na comissão geral da Câmara dos Deputados sobre combate às “fake news”, voto impresso e sistemas eleitorais, ele voltou a defender que o processo atualmente em vigor, com as urnas eletrônicas, “é seguro, transparente e auditável”.

Segundo o ministro, a decisão é política e, se aprovada no Congresso Nacional, será cumprida “de boa fé” pelo TSE. “Mas vai ficar bem pior”, anunciou ele aos parlamentares da comissão.

Para além da complexidade logística de realizar uma licitação para a aquisição de novos equipamentos, a preocupação de Barroso é o custo da implementação do voto impresso, estimado em R$ 2 bilhões.

O ministro afirmou que políticas públicas importantes, como o Censo e a proteção a indígenas, têm sofrido impactos da falta de orçamento, especialmente durante a pandemia. “Então talvez essa não seja a melhor alocação de recursos no momento”, sugeriu.

Barroso chamou a atenção dos congressistas para o fato de a medida violar o sigilo do voto, previsto na Constituição Federal, o que ele considera um “risco grave”, e afirmou temer que o Judiciário – diante da possibilidade de inúmeros pedidos de recontagem – acabe decidindo a eleição. “É a última coisa que eu gostaria”, disse.

Ele lembrou que, se 10% dos candidatos vencidos no pleito de 2020 pedissem recontagens, seriam 40 mil ocasiões em que os votos seriam manipulados em busca de indícios de inconsistências. “Nos Estados Unidos, onde o voto é em papel, houve 50 ações judiciais a esse respeito, mas nenhum juiz concedeu a suspensão ou a anulação dos resultados. Porém, eu temo que algo possa acontecer de forma diferente aqui no Brasil.”

Barroso lembrou que o presidente do STF, ministro Luiz Fux, quando foi juiz eleitoral no início da carreira de magistrado, teve de anular uma eleição porque as urnas apareceram “grávidas” de votos inautênticos. “A manipulação do papel sempre foi problema na experiência brasileira.”

Para ele, não é possível comparar o Brasil com outros países desenvolvidos que adotam o voto impresso. “Se deu certo, é porque nesses países não houve histórico de coronelismo e fraudes, como há no Brasil.”

Ontem, em culto evangélico em Anápolis (GO), Bolsonaro abriu seu discurso repetindo que as eleições presidenciais de 2018 foram manipuladas. “Eu fui eleito no primeiro turno”, disse ele, que na verdade ganhou no segundo. Como tem feito desde o primeiro ano de mandato, o presidente disse ter “provas materiais” da fraude. Porém, não as apresentou à plateia (ver também página A8).

Durante a audiência na Câmara, a defesa ferrenha ao voto impresso partiu de parlamentares bolsonaristas Os deputados da base governista insistiram na tese da falta de confiabilidade mesmo depois que Barroso listou uma por uma das etapas de auditoria a que as urnas são submetidas antes do dia das eleições. O ministro também repetiu que, como os aparelhos não são conectados à internet, não podem sofrer invasões por parte de “hackers”.

Apesar de o voto impresso ser uma retórica fundamentalmente bolsonarista, alguns parlamentares do centro e da oposição demonstraram simpatia pela proposta, como Aécio Neves (PSDB-MG) e Júlio Delgado (PSB-MG).

Por outro lado, o deputado Ivan Valente (Psol-SP) considera que essas discussões são mera “narrativa” para colocar em xeque o sistema eleitoral. O deputado do PT Arlindo Chinaglia (SP) também criticou os debates e disse que isso inocula dúvidas em um sistema que nunca apresentou comprovação de fraudes.

Valor Econômico