Bolsonaro tenta pôr apoiadores em pé-de-guerra

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Foto: Pedro Ladeira/Folhapress

Diante da queda de popularidade e do avanço da CPI da Covid sobre aliados, Jair Bolsonaro multiplicou os palcos para discursos radicais e os acenos a grupos específicos, com o objetivo de mobilizar a base que o ajudou a chegar à Presidência da República em 2018.

Bolsonaro tenta recuperar apoio para a eleição de 2022, quando espera polarizar com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O petista retornou à disputa após recuperar seus direitos políticos.

Há cerca de um mês, pesquisa Datafolha mostrou que o governo Bolsonaro tinha aprovação de 24% dos brasileiros, a pior marca de seu mandato até aqui. Em março, data do levantamento anterior, eram 30% os que consideravam a gestão ótima ou boa.

O presidente também viu Lula buscar aproximação com líderes de segmentos próximos ao bolsonarismo.

O Datafolha identificou que Bolsonaro e o ex-presidente estão empatados, por exemplo, na preferência dos evangélicos.

A pesquisa mostrou que, no primeiro turno da eleição, 35% dos evangélicos votariam em Lula. Bolsonaro marcou 34%. Num eventual segundo turno entre os dois, cada um recebe 45% das intenções de voto, ainda de acordo com a pesquisa.​​

Não por acaso, Lula encontrou-se recentemente com Manoel Ferreira, bispo primaz de uma das mais poderosas ramificações da Assembleia de Deus.

Diante desse quadro, Bolsonaro desencadeou um plano de contenção de crise mirando não apenas os religiosos, mas outros segmentos que lhe deram suporte no pleito de 2018. O mandatário avalia que precisará de sua base mobilizada —entre eles evangélicos, agentes de segurança, caminhoneiros e ruralistas— para ter um colchão sólido de apoio no primeiro turno das eleições presidenciais do ano que vem.

A aposta do mandatário é que, no segundo turno, ele deve beneficiar-se novamente do sentimento anti-petista.

Há duas semanas, Bolsonaro criou uma tese de supernotificação de casos de Covid-19 no país e foi a um culto religioso no interior de Goiás durante o horário de trabalho. Em um único discurso durante o culto, desinformou sobre vacinas, defendeu medicamentos sem efeito comprovado contra Covid e repetiu acusações sem provas de fraude nas eleições.

Na noite de sexta-feira (18), houve nova ofensiva sobre os evangélicos. Bolsonaro participou de celebração em comemoração dos 110 anos da Assembleia de Deus no Brasil, em ato que ocorreu em Belém (PA). No culto, prometeu que indicará um evangélico para o STF (Supremo Tribunal Federal).

“Fiz um compromisso há quatro anos com os evangélicos do Brasil. Nós indicaremos um evangélico para que o Senado aceite o seu nome e encaminhe para o Supremo Tribunal Federal um irmão nosso em Cristo”, afirmou.

Bolsonaro disse também, em outro evento, ter solicitado ao ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, um estudo para embasar sua intenção de livrar das máscaras quem foi imunizado e os que já foram infectados pelo coronavírus —o que contraria especialistas em saúde.

Em outra frente, tem investido em eventos para propagandear apoio popular por meio de passeios de moto em diferentes cidades do país. Além de Brasília, ele liderou motociatas no Rio de Janeiro e em São Paulo e, no próximo final de semana, deve realizar mais uma em Chapecó (SC).

Após os atos sobre duas rodas, o chefe do Executivo costuma discursar aos motociclistas, grupo para o qual prometeu um agrado que repete a cada semana. Segundo Bolsonaro, os condutores de motocicletas não precisarão pagar pedágio nas novas concessões rodoviárias federais.

No fim de maio, ele inflou a promessa e disse que o ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, a quem quer lançar candidato a governador de São Paulo, está negociando isentar as motos mesmo em rodovias já concedidas.

Caminhoneiros e outras categorias também foram contemplados com juras de benesses.

Bolsonaro anunciou o lançamento de um programa de financiamento imobiliário subsidiado voltado para agentes de segurança.

Na semana passada, o presidente atendeu ainda a pedido de um dos principais membros da tropa de choque governista na CPI, o senador Marcos Rogério (DEM-RO). Ele concedeu uma entrevista ao vivo para uma afiliada da RecordTV no estado.

Foi nessa entrevista em que prometeu turbinar o Bolsa Família, programa criado na gestão do PT, aumentando a média dos pagamentos de R$ 190 para R$ 300 —na quinta-feira (17), o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), filho do presidente, falou em ampliar a base do programa social para R$ 270.

Além disso, Bolsonaro confirmou na mesma entrevista que o Ministério da Economia está estudando o pagamento de “mais duas ou três parcelas” do auxílio emergencial após o fim da rodada atual, que termina em julho.

Apesar das novas plataformas de divulgação de promessas e dos discursos ideológicos, o presidente não abriu mão de seus meios tradicionais, como a interação com apoiadores no Alvorada e as lives semanais.

Na transmissão virtual da semana passada, o presidente defendeu o excludente de ilicitude, proposta pela qual agentes de segurança que cometam excessos em operações têm penas abrandadas.

“Estamos tentando de todas as maneiras uma forma de dar tranquilidade ao policial durante seu serviço”, disse Bolsonaro.

Na live, Bolsonaro usou o caso de Lázaro Barbosa de Sousa, que tem sido chamado de “serial killer do DF”, para defender a flexibilização do porte e da posse de armas de fogo.

Sousa é procurado pelo assassinato de uma família no Distrito Federal.

O mandatário também voltou a colocar em dúvida as eleições sem voto impresso e atacou integrantes da CPI, prefeitos, governadores e outros adversários. Numa crítica ao STF (Supremo Tribunal Federal), insinuou que a corte agiu a favor de Lula ao devolver o petista ao xadrez eleitoral.

Conselheiros do presidente, tanto os que integram o governo como assessores extraoficiais, admitem que Bolsonaro atravessa um dos mais difíceis momentos de seu mandato.

O cenário é agravado pelo lento ritmo de vacinação contra a Covid-19 no Brasil.

No entanto, aliados de Bolsonaro apostam que as condições devem melhorar com a retomada da economia e o avanço da campanha de imunização.

Os acenos ideológicos são importantes —dizem esses assessores— justamente para Bolsonaro atravessar o momento mais crítico de desgaste com um piso estável de popularidade.

Integrantes da cúpula do PT também opinam que Bolsonaro deve reduzir sua rejeição e recuperar parte de sua popularidade até o início do ano eleitoral.

Na quinta, aliados do presidente comemoraram as 2.220.845 doses de vacina contra Covid aplicadas no período de 24 horas no país, recorde desde o início da campanha de vacinação em janeiro. A celebração contrasta com o discurso do próprio Bolsonaro, que continua lançando dúvida sobre os imunizantes.

Um dos ministros mais próximos do presidente disse na semana passada que o desgaste que a CPI pode provocar no governo teria atingido um teto. Para ele, a partir de agora a comissão não deve revelar fatos novos.

Mas Bolsonaro ainda tem questões que podem atrapalhar a recuperação de sua popularidade. O país convive com pressões inflacionárias, principalmente sobre os alimentos, e enfrenta uma crise hídrica que pode trazer a necessidade de medidas impopulares, entre elas o aumento da conta de luz e um racionamento.

Além disso, auxiliares do presidente dizem que ainda não é possível calcular qual será o tamanho do impacto negativo da pandemia nas chances eleitorais de Bolsonaro. Se por um lado a população estará vacinada, eles lembram que a memória da crise sanitária ainda estará recente nas pessoas e que muitas estarão enlutadas por parentes e amigos que morreram.

Folha