CPI procura o tom sobre vacina superfaturada

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Foto: Najara Araújo/Câmara dos Deputados

Os senadores do grupo majoritário da CPI da Covid receberam com um misto de euforia e cautela as denúncias do servidor do Ministério da Saúde Luis Ricardo Miranda e de seu irmão, o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF), sobre irregularidades na compra da vacina indiana Covaxin. Ambos vão depor na próxima sexta-feira na comissão. A estratégia mais defendida na CPI no momento é dirigir mais atenção ao servidor do que ao deputado.

Embora avaliem que o impacto das denúncias pode ser explosivo, os parlamentares de oposição e independentes que formam o G7 ainda não conseguiram mapear precisamente a razão pela qual o deputado, até outro dia bolsonarista convicto, decidiu sustentar um ataque desse calibre contra o governo. Entendem que pode estar havendo um conflito de interesses em torno da negociação da Covaxin e pretendem atuar para blindar a CPI do risco de imagem.

Neste momento, a linha de ação mais defendida entre os senadores é concentrar a atenção no servidor, Luiz Ricardo Miranda, que trabalhava na área de importação do Ministério da Saúde. Foi ele quem trocou e-mails com executivos da representantes dos indianos, a Precisa Medicamentos, e é ele quem diz ter sofrido pressão direta de coronéis que auxiliavam Eduardo Pazuello no ministério.

“O depoimento do servidor Luis Miranda será o mais importante da CPI até agora”, diz o vice-presidente da comissão, Randolfe Rodrigues (Rede-AP).

A principal razão para a cautela é o histórico do irmão deputado, acusado de aplicar golpes em pessoas que se associavam a ele em negócios no estilo “ganhe dinheiro fácil”, no Brasil e nos Estados Unidos. Miranda também foi acusado de crime eleitoral por fazer sorteios em lives na pré-campanha de 2018. Os processos foram extintos, mas ele é visto como testemunha “delicada”.

A seu favor, Miranda tem o fato de já ter documentos e áudios para sustentar a versão de que a Precisa queria que o governo pagasse adiantado pelas vacinas, que chegariam ao Brasil muito perto da data do vencimento. Miranda mostrou ainda notas fiscais que, segundo ele, mostram que o pagamento não iria para nenhuma das firmas vendedoras, e sim para a conta de uma terceira companhia, uma offshore em Cingapura que não era citada no contrato.

Em todas as entrevistas que dá, o deputado diz que tem muito mais material, que pode comprometer ainda mais o governo.

Em reação, o ministro da secretaria-geral da Presidência, Onyx Lorenzoni, deu uma entrevista coletiva para dizer que os documentos eram falsos e que Miranda ia ser investigado por “denunciação caluniosa”. “Deputado Luís Miranda, Deus está vendo. Mas o senhor não vai se entender só com Deus, vai se entender com a gente também”, afirmou o ministro. O mesmo discurso ecoou durante toda a tarde entre os membros governistas da CPI.

Por isso, o consenso no G7 é adotar um tom sóbrio diante de Miranda, sem “louvação”.

“Não vamos fazer uma defesa dele, mas também não vamos permitir que desmereçam um fato atacando quem o denuncia”, afirma Humberto Costa (PT-PE), para quem o fato de as denúncias partirem de Miranda não surpreende. “Já viu padre entregar bandido?”, brinca o parlamentar. “Só quem faz isso é gente que é do ramo”.

Os senadores também acreditam que Miranda esteja tentando proteger o irmão, já que o governo encomendou à Controladoria Geral da União a abertura de um processo disciplinar que pode culminar com a demissão do servidor.

De toda forma, até mesmo a guerra pública entre Lorenzoni e os Miranda agradou os oposicionistas na comissão. Eles agora avaliam se há elementos para acusar Bolsonaro e seus aliados de tentar obstruir a Justiça. Nada mal para reativar uma CPI que enfrentava a perda de relevância e depoimentos repetitivos.

Com Mariana Carneiro

O Globo