Ex-BBB detona em análise sobre situação da economia no Brasil

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Foto: Thiago Bruno/Divulgação

Antes de ser um dos ex-participantes do Big Brother Brasil mais famosos da história do programa, Gilberto Nogueira Junior —mais conhecido como Gil do Vigor— é um economista. E, antes disso, um homem preto, gay, religioso e de origem pobre.

Essas identidades, que chegaram a ser motivo de conflito interno para o pernambucano, hoje parecem formar um todo coerente: com o BBB, aceitou-se integralmente como homossexual. Com a fama, conseguiu os recursos para bancar um doutorado nos Estados Unidos. Com a pesquisa, busca influenciar melhores políticas de combate ao tráfico, que hoje penalizam sobretudo pretos e pobres como ele.

Por fim, com a formação acadêmica, ele pretende voltar ao Brasil para ensinar, combater a desigualdade e —por que não?—, ser presidente do Banco Central.

“Políticas monetárias têm impacto também na vida de quem está lá atrás, pagando. Eu trabalharia em pontos que me permitissem enxergar quem está sempre lá embaixo, quem está pagando o óleo, o arroz, o fubá”, diz.

Você criou uma frase que está na boca de todo mundo: “O Brasil tá lascado”. O Brasil está lascado na economia? Infelizmente, sim. Não faltam evidências de que o Brasil está lascado. Nós conseguimos ver isso na alta dos preços, no desemprego, em questões como saúde e educação —e a economia gira em torno disso, de educação, saúde, fomentar emprego e renda, trazer investimentos de fora. Não vemos isso acontecendo. Temos passado por um momento bem crítico. Mas dá para melhorar.

Você disse que o Brasil só vai sair da crise e voltar a crescer se o presidente Jair Bolsonaro sair do poder. Por quê? Economistas falam muito em bem-estar, mas acabou virando uma discussão numérica, algo que critico. No fundo, estamos falando: ‘Quero pegar aquela pessoa e fazer com que ela tenha uma vida melhor do que tem hoje’. Não estamos aqui para sobreviver, mas para viver.

O governo atual tem sido ruim nas decisões políticas. Ele se esconde atrás de uma pandemia para se justificar. Não tomou decisões corretas. Nós tivemos praticamente um ministro da Saúde por mês. Ele [Bolsonaro] passa por cima da ciência e da pesquisa e não valoriza aquilo que de fato pode ajudar nosso país. Acho que nós só vamos nos afundar ainda mais.

Por que você escolheu estudar economia? Eu vi [o filme] “Em Busca da Felicidade” e me apaixonei. Eu sempre fui sonhador. Ficava sonhando que minha vida ia mudar da noite para o dia, que eu ia dormir pobre e acordar rico. Eu era como Will Smith no filme, que fala para o filho ‘imagina que a gente está num castelo’. Pensei: ‘Vou fazer economia, virar corretor da Bolsa e ficar milionário’. Esse foi o motivo de fazer economia [risos].

O governo atual tem sido ruim nas decisões políticas. Ele se esconde atrás de uma pandemia para se justificar.

Gil do Vigor
economista e ex-BBB

Sua pesquisa acadêmica aborda o tráfico, tema pouco estudado na economia. Existe um crescente investimento na repressão para tentar combater o mercado de drogas, mas o resultado que vemos é mais oferta, com violência e todas as externalidades que esse mercado gera. O que seria mais eficiente? Investir em repressão, sendo que estou gerando mais violência, ou aplicar esse investimento em outro lugar? Permitir que o mercado seja livre, colocar o Estado regulando? A pesquisa é sobre isso.

Qual foi a conclusão? O problema não está na repressão, mas em qual cadeia da distribuição das drogas ela acontece. Se é no atacado, no grande fornecedor, você consegue ter efeito positivo em reduzir a violência e a oferta de droga.

Agora, se a repressão é diretamente no varejo, na boca de fumo, o que acontece, em termos mais simplistas, é que temos um traficante vendendo para consumir parte das drogas. Quando a polícia reprime esse indivíduo, ele entra nos sistema penitenciário já com uma dívida, porque as drogas foram apreendidas. Ele sai da reclusão com essa dívida, que ou ele paga, ou ele morre. Além disso, ele quer manter o seu consumo de drogas, então ele recorre a atividades ligadas à violência, como roubo.

Esses traficantes também são facilmente distribuídos: quando um é preso, não só vem outro para tomar aquele mercado, como a concorrência também se expande.

O atacado seria o cartel? Um PCC? Exato. O PCC seria um ponto específico do meu modelo. Seria um grande atacadista e, neste caso, combatê-lo diretamente teria um efeito positivo sobre a violência.
Agora, no doutorado, estamos fazendo um update nesse modelo. Nós temos outros casos, nos EUA por exemplo, em que, normalmente, os atacadistas são presos sem gerar violência. Grandes traficantes fazem um trabalho muito mais de relação com a polícia e a política para conseguir manter suas bases e distribuir drogas, ao contrário dos donos de bocas, que usam de fato a violência para manter seu mercado.

O modelo funciona como uma empresa? Exatamente. Também queremos verificar de que formas as políticas de repressão de um país afetam o nível de violência do mercado de outro. A gente sabe que hoje em dia o mercado de drogas é internacional. Tem exportações, importações. A ideia é expandir nosso modelo.

Você espera que ele possa impactar políticas públicas? Acredito que sim, pois podemos ter uma melhoria no direcionamento dos recursos. Nós temos um sistema de repressão no Brasil muito mais focado no varejo do que no atacado. A gente precisa questionar isso. Todo preto favelado é traficante? Tem uma questão social envolvida aí. O Brasil é um país com poucos recursos, precisamos de eficiência nas decisões de políticas públicas. Eu venho de uma família muito pobre, a gente sabe que os problemas com o tráfico de drogas são direcionados a um público específico. Eu quero direcionar a pesquisa para que a gente consiga também debater questões sociais, para que a política proteja as pessoas.

 

Como você vai conciliar a pesquisa com a carreira de celebridade? Primeiro ano de pesquisa vai ser só a morte de Jesus. Quem faz mestrado e doutorado em economia sabe que é morte, análise, micro, macro, desespero, depressão, choro. Passou esse primeiro ano, fica muito mais tranquilo. Dá para conciliar. Obviamente, vou ter que abrir mão de algumas coisas no trabalho de publicidade. Estou trabalhando agora correndo para adiantar muitos contratos.

Como você se vê no futuro? Tem uma curva de conhecimento: quanto mais você aprende, menos certeza você tem das coisas. Toda minha vida acadêmica foi na UFPE [Universidade Federal de Pernambuco], sou nascido e criado lá. Vou ter oportunidade de ir para outro centro, de me deparar com uma vivência acadêmica diferenciada nos EUA. Minha ideia é abrir mais meu pensamento, para voltar ao Brasil e poder ajudar meu país de uma maneira muito mais significativa. Poder ensinar mais.

Você realmente tem vontade de trabalhar no Banco Central como disse? O BC até te respondeu… Sim, quero ser presidente do BC. Políticas monetárias têm impacto também na vida de quem está lá atrás, pagando. Eu trabalharia em pontos que me permitissem enxergar quem está sempre lá embaixo, quem está pagando o óleo, o arroz, o fubá.

Se você fosse presidente do BC agora, o que estaria fazendo?  Agora não dá [risos]. Eu estaria brigando, fazendo cachorrada, e esculhambando. Ia sair na internet: ‘Gil do Vigor, presidente do BC, se descontrola, sai no tapa e vai preso’.

Você lançou um livro com um subtítulo sugestivo: “Como me aceitei, venci na vida e realizei meus sonhos”. O que você teve de aceitar em você? Tive que aceitar quem eu era, em termos da minha sexualidade. Digo mais, acho que foi muito ampla a minha aceitação. Eu sou um homem preto, gay e fui pobre durante muito tempo. Tive que entender que eu surto, tenho meus limites, tenho falhas —e está tudo certo. Que eu não sou culpado por todas as coisas que aconteceram e que sou resultado de um meio. Passei fome. Tive que entender todas essas características para que pudesse me amar.

A religião abriu caminhos para isso ou foi um impedimento?  Ela sempre barrou a minha sexualidade. Ajudou muito para que eu conseguisse desenvolver uma autoconfiança em outros aspectos: autossuficiência em termos de educação, finanças. Mas como um homem gay, não. Sempre bateram que era coisa de Satanás. Eu chorava porque ia para o inferno, estava lascado.

Hoje é engraçado lembrar que eu me questionava muito perguntando a Deus por quê. Se tudo é perfeito, por que Ele me fez assim? A falha não está em Deus, mas nos homens que usam a palavra Dele para esconder seus preconceitos.

A igreja acabou me tirando o direito de ser quem eu sou durante muito tempo. Mas eu acho que quem mais machucou o Gilberto fui eu mesmo, aceitando que eu fosse doente, mal construído, um servo de Satanás, e não que eu era um filho de Deus amado, que não tenho problema nenhum. Amar não é errado.

Você hoje é religioso?  Sou, acredito em Deus. Quando estiver na Califórnia, vou tirar o domingo de folga e, ao menos duas vezes por mês quero estar na igreja participando das atividades. Amo estar na igreja e quem não gostar, que lute, não sou obrigado a nada.

O que aconteceu para sua família parar na rua? Quando isso ocorreu? Foi sempre assim, minha filha. Você na verdade pode perguntar em que momento a gente passou a ter casa. Como meu pai tinha muito problema de violência doméstica com minha mãe, ela precisou fugir. Ela arrumava trabalho como dava para alugar casa, mas meu pai ia atrás dela. Minha mãe tinha que ficar fugindo. Teve uma ou duas vezes em que minha mãe perdeu o emprego e, infelizmente, se não tem como pagar aluguel, você vai para a rua.

Teve uma vez que minha avó [paterna] falou que ela poderia voltar [para a casa], mas só se voltasse com meu pai. Minha mãe falou: ‘Prefiro dormir na rua do que voltar com seu filho e sofrer tudo o que sofri’. Minha avó respondeu: ‘Deixa seus filhos aqui’. Mas a gente falou que se minha mãe ia dormir na rua, a gente ia dormir também. Se não cabe minha mãe, não cabe a gente.

 

O BBB está propiciando um upgrade inesperado? Nunca imaginei. Quem já dormiu na rua, passou fome, quem já viu a mãe fazer coisas que não queria fazer para trazer comida para casa, e hoje está viajando o Brasil, indo no consulado, pedindo para comprar passagem de R$ 8.000 na classe executiva —pode comprar que eu pago. É muito louco, eu choro muito. É uma vida de um ser humano de verdade, que sou eu mesmo, ali, da pobreza, lascado, que nunca viu ninguém famoso de perto. De repente tem pessoas que sabem minha história, me amam de verdade. Eu nunca ganhei R$ 10 mil na vida. O maior dinheiro que ganhei foi R$ 3.000 de comissão porque vendia muito plano de saúde. Nunca pude fazer investimento. Hoje tenho, viu, amiga?

No que você investe? Comecei com ativo livre de risco, renda fixa, porque pobre é assim. Deixa eu ficar com um pouquinho mais de coragem, ter pelo menos uns R$ 2 milhões. Povo diz que eu estou bilionário, mas cadê o dinheiro? Para bater R$ 1 milhão, é só Jesus na misericórdia. Quando eu bater R$ 2 milhões investidos em renda fixa, vou dizer: ‘Jesus, dá o caminho para o teu servo’. Aí vou começar. Vai ser a vitória do servo! Por enquanto, não posso. Lutar para vencer na vida e perder todo o dinheiro não dá, né, amiga?! Muito suor esse dinheiro!​

Folha de S. Paulo

 

 

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