Filha de Fujimori tentará judicializar eleição no Peru

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Foto: Sebastian Castaneda/Reuters

Pedro Castillo se declarou na noite desta terça (8) vencedor da eleição presidencial peruana. Da varanda do comitê de seu partido, o Perú Libre, no centro de Lima, o candidato de esquerda afirmou que o “povo falou” e que, “de acordo com o relatório de nossos fiscais, já temos o resultado”. “Vimos que o povo impôs essa vitória por meio das urnas. Por isso, peço a vocês para não caírem em provocações.”

Mas sua rival na disputa, Keiko Fujimori, não reconheceu a derrota. Na tarde desta quarta (9), a campanha da candidata anunciou que vai entrar com uma série de recursos na Justiça para anular a votação em algumas regiões. Um primeiro passo já foi dado com o pedido para invalidar 200 mil votos.

Com 99,998% das urnas contabilizadas, a vitória de Castillo parece irreversível, já que ele ostenta 50,2% dos votos, enquanto Keiko tem 49,8%. Ainda assim, o Júri Nacional de Eleições não fez nenhum pronunciamento oficial confirmando o resultado e esperava a chegada de votos depositados no exterior, de países como Chile e Brasil.

A perspectiva de que o panorama já está definido é tão forte que um dos analistas políticos mais respeitados do Peru, David Sulmont, especializado em estatística eleitoral, publicou em redes sociais acreditar que o ciclo eleitoral acabou e que “Castillo será o novo presidente”.

O ex-presidente da Bolívia Evo Morales, inclusive, já parabenizou o esquerdista. “Muitas felicidades por essa vitória, que é a vitória do povo peruano, mas também do povo latino-americano que quer viver com justiça social!”, escreveu, no Twitter. Castillo retuitou a mensagem e agradeceu Evo, que chamou de irmão.

Na mesma rede social, o esquerdista agradeceu quem continua “a resistir nas ruas”. “Não vamos cair nas provocações de quem quer ver esse país no caos. Por isso, fazemos um chamado de paz e tranquilidade. Sigamos firmes e alegres nessa luta final que é de todos os peruanos”, escreveu.

Keiko, que, na noite de segunda-feira (7), depois de ter sido ultrapassada pelo adversário na apuração, acusou a existência de “fraude sistêmica” e foi contrariada por observadores internacionais, ainda não se pronunciou oficialmente desde então.

Fontes de sua campanha, porém, disseram à imprensa local que já estão sendo preparadas ações para tentar reverter o resultado. A acusação é que partidários de Castillo teriam alterado as atas de votações em algumas regiões no interior do país. Assim, Keiko agora quer que esses votos sejam anulados.

“O Força Popular está apresentando hoje ações de nulidade de 802 atas de votação em todo o país, o que será apresentado ao júri eleitoral nacional”, afirmou Keiko, em entrevista coletiva. Segundo ela, essas atas representam cerca de 200 mil votos.

A candidata já exibiu vídeos e fotos como supostas evidências de que atas eleitorais haviam sido alteradas. Os registros também mostrariam treinamento dado a mesários e fiscais de Castillo para cometer atos ilegais que garantissem a vitória dele.

O Júri Nacional de Eleições, porém, informou que a Missão de Observadores da União Interamericana de Órgãos Eleitorais apresentou relatório no qual afirma que o pleito ocorreu de modo regular e com êxito.

A declaração foi corroborada pela Missão de Observação Eleitoral da OEA, composta por 40 membros e liderada pelo ex-chanceler do Paraguai Rubén Ramírez Lezcano. Para o órgão, eventuais inconformidades “não comprometeram a eleição como um todo” e podem ser “resolvidas pela via legal”.

Já a bancada eleita do Perú Libre, o partido de Castillo, afirmou que as acusações de Keiko são mentirosas e que ela já tinha recorrido a essa tática ao ser derrotada no segundo turno da eleição de 2016. De acordo com os parlamentares, as acusações foram feitas “para promover a instabilidade política e social no país, da qual ela [Keiko] e seus aliados serão responsáveis”.

Os júris eleitorais também já iniciaram nesta quarta o processo de revisão dos votos contestados, a última esperança de Keiko para reverter a estreita vantagem de seu adversário.

Esse procedimento, que pode durar até dez dias, é comum nas eleições no Peru, mas agora adquire especial importância devido ao acirrado resultado eleitoral de domingo.

Os 60 Júris Eleitorais Especiais (JEE) devem decidir, em primeira instância, a validade de milhares de votos contestados pelos delegados dos partidos de cada candidato —cada voto é decidido individualmente.

A última palavra será do Júri Nacional Eleitoral (JNE), que analisa as decisões dos JEE e proclama o vencedor.

Funcionários da América TV e do Canal N apresentaram nesta terça cartas em que anunciam demissão coletiva devido ao que classificaram de mudanças editoriais em apoio a Keiko.

Antes, já tinham ocorrido demissões por parte dos veículos, que, segundo os demitidos, deram-se por conta de opiniões divergentes. Nos jornais El Comércio e Peru21, funcionários afastados afirmam que o motivo foi a discordância com a linha editorial em favor da candidata.

A jornalista Pao Ugaz, correspondente do jornal ABC, da Espanha, expôs no Twitter várias das denúncias. “Há uma hecatombe midiática no Peru.” E citou os nomes de profissionais demitidos por conta “do ambiente hostil da última campanha presidencial”.

Uma das jornalistas demitidas da América TV, Clara Elvira Ospina, afirmou nas redes sociais que as decisões relacionadas aos profissionais de Cuarto Poder, América Noticias e Canal N “apenas confirma que quem toma as decisões não é o jornalismo”. “Não é a vontade de fazer jornalismo o que os anima.”

No jornal americano The Washington Post, o peruano Diego Salazar, autor do livro “Não Entendemos Nada”, publicou artigo no qual afirma que repórteres de grandes meios de comunicação do país receberam ordens para escrever artigos pró-fujimorismo nos últimos anos.

Folha de S. Paulo