Inquéritos contra bolsonaristas andam de lado no Supremo

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Foto: Jorge William/Agência O Globo

Enquanto Alexandre de Moraes avalia o pedido da PGR (Procuradoria-Geral da República) para arquivar o inquérito dos atos antidemocráticos, outra investigação sob o comando do ministro que mira aliados do presidente Jair Bolsonaro segue sem emitir sinais de desfecho no STF (Supremo Tribunal Federal).

Aberto há mais de dois anos, o inquérito das fake news continua, sob sigilo, produzindo filhotes —termo usado no meio jurídico para retratar os desdobramentos de uma apuração—, muitos deles enviados à primeira instância por não envolver pessoas com foro no Supremo.

Em email encaminhado ao gabinete de Moraes, a Folha pediu informações sobre o inquérito, mas não houve resposta.

No âmbito deste inquérito, já foram cumpridos mandados de busca e apreensão que miravam congressistas, empresários e blogueiros bolsonaristas.

Ministros de tribunais superiores e integrantes do Congresso creditam à apuração, assim como a dos atos antidemocráticos, a contenção de movimentos bolsonaristas em favor do fechamento do Congresso e do Supremo e pela volta da ditadura militar.

Criticada inicialmente pela forma como foi instaurada, uma iniciativa própria do STF e sem pedido da Procuradoria, a apuração venceu resistências dentro e fora do Supremo e, com o passar do tempo, é vista como um instrumento essencial para a proteção das instituições.

A avaliação na corte é que, com o possível encerramento das investigações sobre os atos antidemocráticos, o inquérito das fake news ganha em importância, o que deve postergar seu término.

Integrantes da PGR já trabalham com a possibilidade de a apuração se estender até o ano que vem. Isso porque em 2022 serão realizadas eleições presidenciais e o tom nas críticas de apoiadores de Bolsonaro a ministros da corte pode voltar a subir.

Moraes será o presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) no próximo pleito e a aposta é que ele não deverá arquivar o inquérito das fake news antes disso para manter em suas mãos uma ferramenta com poderes para barrar eventual ofensiva contra a democracia.

A manutenção da investigação como forma de impedir o recrudescimento de movimentos em favor do fechamento do Congresso e do STF e pela volta do regime militar, porém, não significa que o Supremo conseguirá punir os investigados por disseminar notícias falsas e ameaças a ministros da corte.

Para que os envolvidos nos ataques ao tribunal sejam condenados, é necessário que haja denúncia da PGR nesse sentido. A Procuradoria, no entanto, não vê com simpatia esse inquérito por entender que atribuições importantes do órgão foram usurpadas na instauração da apuração.

Isso porque a investigação foi aberta de ofício pelo então presidente do STF, Dias Toffoli, na contramão do que ocorre geralmente no sistema de Justiça do Brasil, que determina que o Judiciário só pode agir quando provocado por uma das partes do processo.

Diferentes apurações realizadas no bojo do inquérito das fake news foram enviadas à primeira instância. Por não enxergar conduta passível de enquadramento nas leis penais, o MPF (Ministério Público Federal) arquivou alguns casos.

Entre as pessoas investigadas neste inquérito estão as deputadas Bia Kicis (PSL-DF) e Carla Zambelli (PSL-SP), duas das principais defensoras do governo no Congresso.

Moraes já determinou que a PF ouvisse as duas congressistas, assim como Daniel Silveira (PSL-RJ), Filipe Barros (PSL-PR), Junio Amaral (PSL-MG) e Luiz Phillipe de Orleans e Bragança (PSL-SP).

Em fevereiro, o ministro mandou prender Silveira, após o deputado publicar na internet vídeo com ataques a ministros do Supremo.

Outros atores que dão sustentação política a Bolsonaro, como o ex-deputado e presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson, também já entraram na mira do inquérito das fake news.

No mês de março, a pedido da PGR, Moraes autorizou o compartilhamento do anexo referente a Jefferson com a apuração dos atos antidemocráticos.

De acordo com o ministro, Jefferson “profere discursos de ódio, além de manifestações contra as instituições democráticas, bem como inúmeras calúnias, difamações, injúrias e ameaças contra ministros do STF e ao próprio Poder de Estado, claramente, com o intuito de desmoralização e coação da investigação em andamento”.

Moraes tornou-se relator do caso por designação de Toffoli, o que também foi motivo de crítica inicialmente, uma vez que geralmente a responsabilidade por novas investigações instauradas na corte é escolhida por sorteio entre todos integrantes da corte.

Ao instaurar o inquérito, Toffoli afirmou que a medida era necessária “considerando a existência de notícias fraudulentas, denunciações caluniosas, ameaças e infrações que atingem a honorabilidade do STF, de seus membros e familiares”.

No começo, a decisão do ministro foi criticada por diferentes setores da sociedade e enfrentou forte resistência inclusive dentro do Supremo.

As críticas ao inquérito aumentaram ainda mais quando ele foi usado para censurar a imprensa.

Em 15 de abril de 2019, Moraes determinou, no âmbito do inquérito das fake news, a retirada do ar de reportagem e nota da revista Crusoé e do site O Antagonista que citavam Toffoli.

O ministro estipulou multa diária de R$ 100 mil e mandou a Polícia Federal ouvir os responsáveis pela revista e pelo site em até 72 horas. Crusoé e O Antagonista recorreram. Após sofrer duras críticas, Moraes revogou a própria decisão.

Depois disso, o magistrado focou as apurações nos ataques orquestrados de aliados de Bolsonaro ao Supremo e ao Congresso nas redes sociais e reverteu a onda de críticas ao inquérito.

Prova de que a visão sobre o caso mudou ao longo do tempo foi a decisão de Toffoli de não levar a julgamento do plenário ações que contestavam sua iniciativa de abrir a investigação.

Somente um ano e dois meses depois, e menos de um mês após Moraes autorizar o cumprimento de 27 mandados de busca e apreensão contra militantes bolsonaristas, Toffoli levou a discussão do tema ao plenário. E teve uma vitória significativa, de 10 a votos a 1, o que é visto como uma das marcas de sua gestão à frente do STF.

Folha