Queiroga reconhece que vídeos mostram Bolsonaro cometendo crimes

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Foto: Pablo Jacob/O Globo

O ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, afirmou à CPI da Covid, no Senado, que a cloroquina e os demais remédios do tratamento precoce ao coronavírus não têm eficácia comprovada. A fala contrasta com o discurso do presidente Jair Bolsonaro, que já fez por diversas vezes a defesa do uso desses medicamentos.

Eu já respondi a vossa excelência. Essas medicações não têm eficácia comprovada — disse Queiroga, em resposta ao relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL)

Essa não foi a única fez durante seu novo depoimento à comissão parlamentar de inquérito que o ministro negou a eficácia da cloroquina. Ao ser questionado por Renan sobre Mayra Pinheiro, conhecida como “Capitã Cloroquina”, secretária de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde do Ministério da Saúde, Queiroga voltou a afirmar que não reconhecia a eficácia da droga.

— Vossa excelência concorda com o posicionamento da Dra. Mayra sobre o tratamento precoce no que lhe diz respeito, como Ministro da Saúde e como médico? — perguntou Renan.

– Senador, eu já externei aqui a minha posição acerca dessas medicações. Para mim não há evidência comprovada da eficácia desses medicamentos — afirmou o ministro.

Queiroga foi convocado a um novo depoimento após ter as respostas consideradas evasivas por parte dos senadores na primeira vez em que foi ouvido. Em sua segunda oitivia, o ministro respondeu sobre a Copa América no Brasil, a existência de um “gabinete paralelo” de aconselhamento de Bolsonaro nas ações de combate à pandemia e sobre a não nomeação da médica infectologista Luana Araújo para o Ministério da Saúde.

Renan questionou porque o ministro, sendo contrário ao tratamento precoce, mantém Pinheiro no cargo. Sobre isso, Queiroga disse:

— Ela não trata na minha gestão de tema relacionado a tratamento precoce. Ela coordena o programa “Médicos pelo Brasil”.

Também sobre o tratamento precoce, Queiroga foi questionado por que não revogou nota informativa do Ministério da Saúde com orientações para o uso de remédios sem eficácia comprovada contra a Covid. O ministro disse que ela “perdeu o objeto” e “não tem efeito legal’.

— Não é um ato administrativo. Está no site porque está no histórico do enfrentamento da pandemia — disse Marcelo Queiroga.

— Ao manter lá, ajuda para que a dúvida persista — afirmou Renan.

— Não sei disso — respondeu o ministro.

— É uma pena que não saiba disso — rebateu o relator da CPI.

Questionado sobre a postura do presidente Jair Bolsonaro na pandemia, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, afirmou à CPI da Covid, no Senado, que não cabe a ele julgar o mandatário nem atua como seu “censor”. A resposta foi dada após o relator da comissão parlamentar de inquérito, Renan Calheiros (MDB-AL), mostrar um vídeo com cenas de Bolsonaro em aglomerações sem usar máscara. Queiroga afirmou ainda que as “imagens falam por si só”.

— Eu sou ministro da Saúde, não sou um censor do presidente da República. Não me compete julgar os atos do presidente da República — alegou Queiroga.

Indagado se faz orientações ao presidente, como faz com a população, o ministro disse que já falou com Bolsonaro sobre o assunto, mas que a forma como ele age é “individual”:

— Evidente que sim. Mas é um ato individual. As imagens falam por si só — reagiu.

Ainda assim, Queiroga insistiu que não iria fazer juízo de valor sobre a postura de Bolsonaro. Também justificou que o seu cargo possui limitações.

Após as respostas, o presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), disse que é constrangedor Queiroga orientar a população num sentido, e Bolsonaro agir de forma contrária.

— Como é possível fazer uma política publica? Como consegue convencer os outros se não consegue convencer quem o nomeou — comentou Aziz.

Questionado durante a sessão, o ministro disse ter autonomia, mas não carta branca dentro do Ministério:

— O presidente me deu autonomia para conduzir o Ministério da Saúde. Isso não significa carta branca. Até agora não houve nenhum ponto em que tenha me sentido desprestigiado.

E perguntado sobre a credibilidade da pasta, ele respondeu:

— A credibilidade do Ministério da Saúde está absolutamente intacta entre as sociedades científicas. Eu tenho apoio da comunidade científica, das instituições universitárias.

O relator da CPI também questionou Queiroga sobre o tratamento precoce contra a Covid-10. Renan perguntou por que ele enviou um secretário do Ministério da Saúde para representá-lo num encontro de defensores da cloroquina, cuja ineficácia contra o coronavírus já foi provada. O medebista afirmou que participar de um evento significa ratificar tudo que é tratado ali.

Renan afirmou também que a CPI tem provas suficientes para mostrar a existência do suposto gabinete paralelo aconselhando o presidente, à margem do Ministério da Saúde. O relator então perguntou se o ministro já tinha se encontrado com alguns de seus membros. Marcelo Queiroga afirmou que com alguns sim, mas disse desconhecer a existência de um grupo atuando em paralelo.

Em sua fala inicial, o ministro disse que a pandemia só será superada por meio de uma eficiente campanha de vacinação. Ele destacou que já foram distribuídas 105 milhões de doses aos estados e municípios, mas apenas cerca de 30% da população adulta recebeu até o momento a primeira dose, e somente 14% recebeu as duas. Marcelo Queiroga afirmou que seu compromisso é acelerar a vacinação no Brasil, e destacou que está sendo veiculada uma campanha publicitária para que a população não apenas se imunize, como também adote as chamadas medidas não farmacológicas, como o uso de máscara e o distanciamento social.

Depois, ao longo da sessão, o ministro afirmou que há negociações com dois laboratórios chineses que fazem vacinas contra a Covid-19. Até o momento, o Ministério da Saúde já adquiriu doses da CoronaVac, que foi desenvolvida pelo laboratório chinês Sinovac e, no Brasil, é produzido pelo Instituto Butantan, ligado ao governo de São Paulo.

— Buscamos adquirir mais doses. Sendo possível, teremos a Cansino. A Sinopharm é parecida com a CoronaVac, e existem negociações — disse o ministro.

Queiroga, no entanto, reconheceu que a campanha de vacinação não está no ritmo que desejaria por duas razões: houve atraso no envio de insumos produzidas na China ao Brasil; e a imunização de pessoas com outras doenças foi num ritmo mais devagar.

O ministro afirmou que ainda não está caraterizada uma terceira onda da pandemia. Segundo ele, há uma continuidade da segunda onda num patamar elevado.

O senador Otto Alencar (PSD-BA) perguntou a Queiroga se ele leu a bula de todas as vacinas contra a Covid-19. O ministro respondeu que não, o que foi rebatido pelo parlamentar:

— Lamento não ter lido a bula de todas as vacinas, pois eu li. O senhor é autoridade sanitária do Brasil. É o senhor que determina como devem ser aplicadas as vacinas e quem deve tomar a vacina ou não. O senhor tem que conhecer a vacina. Vacinas podem ter efeitos colaterais. O senhor deveria ao menos ler para ver a posologia, efeitos colaterais. Talvez seja o ato mais irresponsável que o ministro pode fazer, determinar a aplicação da vacina sem ter conhecimento dos efeitos colaterais.

O ministro chamou para si a decisão de não ter efetivado a médica Luana Araújo como secretária de Enfrentamento á Pandemia do Ministério da Saúde, em contraste ao que ele e a própria Luana haviam dito. Em audiência na Câmara, Queiroga sugeriu que houve um veto do Planalto. Luana também atribuiu a decisão a outras instâncias.

— Os nomes são enviados à Casa Civil, à Secretaria de Governo. Não houve restrição. Mas nesse ínterim, apesar da qualificação [de Luana Araújo], começou a sofrer resistências, em face dos temas que são tratados aqui, das divergências na classe médica. E eu entendi que, naquele momento, não seria importante a presença dela naquele contexto. Resolvi não efetivar. É um ato da administração pública. Assim como o presidente pode me demitir — disse Queiroga.

Depois, afirmou:

— Não houve óbices formais da Secretaria de Governo, da Casa Civil.

Queiroga disse que ideia de ter criado a Secretaria Extraordinária no Enfrentamento à Pandemia foi concentrar as ações relacionadas à Covid-19 num só lugar. Afirmou que deve escolher alguém para chefiá-la até sexta-feira. Segundo ele, será alguém de capacidade técnica e espírito público.

A fala do ministro contradiz o que ele havia dito no fim de maio. Na ocasião, Queiroga deu a entender que o veto à médica infectologista teria partido do presidente.

— É uma pessoa qualificada, que tem condições técnicas para exercer qualquer função pública. Ela não chegou a ser nomeada. Nós encaminhamos para a instância do governo. Vivemos num regime presidencialista. Eu fui indicado por quem? Por quem de direito, o presidente a República. É necessário que exista validação técnica e validação política para todos os cargos.

Nesta terça-feira, o presidente da CPI, Omar Aziz, rebateu o recuo do ministro:

— O senhor me desculpa. Disse aqui [no depoimento anterior que prestou no começo de maio] que tinha autonomia. Convida uma pessoa. Se não quisesse, não teria nem encaminhado para a Casa Civil. Está tentando arranjar uma desculpa para a não nomeação. O senhor mesmo disse que é um regime presidencialista. Não dá para achar aqui que todo mundo é doido ou não prestou atenção no que o senhor falou.

Agora, o ministro afirmou que foi sua a decisão de não nomear Luana e justificou que mudou de opinião. Ele também deu uma versão diferente da apresentada pela médica, o que foi questionada pelo relator da CPI.

— Eu desisti porque o nome dela não estava suscitando o consenso que eu desejava. Eu mudei minha decisão — disse o ministro, que afirmou depois: — Eu não falei que era o Palácio [que a vetou]. Se a doutora Luana entendeu dessa forma, é uma questão de entendimento dela.

— Por que não disse isso para ela? — questionou Renan.

— É uma decisão discricionária do ministro — respondeu o ministro.

Omar Aziz então perguntou se, caso a Casa Civil tivesse aprovado o nome de, Luana teria sido nomeada.

— A Casa Civil aprovou o nome dela — disse Marcelo Queiroga.

Em outro momento da audiência, Renan indagou a Queiroga se foi a “capacidade técnica da doutora Luana que atrapalhou sua nomeação”. Queiroga, então, respondeu de forma lacônica:

— Não.

Queiroga reconheceu não ter médicos infectologistas na sua equipe, mas ressaltou que isso vem de gestõe anteriores. Senadores governistas disseram que há infectologias sim na pasta.

— Então o ministro está mentindo? — questionou Omar Aziz.

Depois, Queiroga reiterou:

— Na minha equipe direta, não tenho nenhum infectologista.

Questionado sobre exoneração ou manutenção dos militares que chegaram à pasta na gestão do ex-ministro Eduardo Pazuello, ele disse que as pessoas com competência técnica permanecerão nos cargos.

Questionado sobre a realização da Copa América no Brasil, Queiroga disse que a prática de esportes e jogos é liberada no Brasil, não havendo razões epidemiológicas para impedir o torneio.

— O Campeonato Brasileiro ocorreu com mais de 100 partidas em ambiente controlado, sem público nos estádios. Estão acontecendo a Copa Libertadores, as Eliminatórias, um campeonato de ginástica no Rio de Janeiro, de tal sorte que o esporte está liberado no Brasil, e não há provas de que aumenta a contaminação de atletas — disse Queiroga.

Queiroga voltou a dizer que, para participar da competição, os atletas não terão de vacinar:

— A vacina não é obrigatória. Essas competições acontecem sem exigência de vacina. Os outros campeonatos acontecem sem a exigência da vacinação.

Queiroga disse que no Campeonato Brasileiro houve um caso de transmissão em campo. O vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), citou então mais de 300 casos entre atletas, o que inclui também transmissão fora do campo.

Calheiros questionou se o ministro foi ouvido na decisão do governo federal de apresentar ao Supremo Tribunal Federal (STF) uma ação questionando medidas restritivas adotadas por alguns estados.

— É uma discussão jurídica que não compete ao ministro da Saúde. Não fui ouvido. Vamos esperar o posicionamento do Supremo Tribunal Federal — disse o ministro.

Indagado o que achava da ação, Queiroga foi evasivo e disse que é uma questão jurídica, não afeta ao ministro da Saúde. Os senadores governistas interromperam o depoimento com críticas às perguntas feitas pelo relator. Após isso, o ministro retomou a palavra e disse ter sido informado pela Advocacia-Geral da União (AGU) que a ação questiona a forma como as medidas foram impostas, por meio de decreto.

— O presidente me falou uma vez sobre o tema. Ele disse que é contra o toque de recolher e o cerceamento de ir e vir — disse Queiroga.

Durante o depoimento, o ministro citou reportagem do GLOBO sobre as reuniões que vem tendo com parlamentares. Apostando na articulação política, Queiroga teve 44 reuniões com deputados e senadores em apenas dois meses na pasta. Seu antecessor, o general Eduardo Pazuello, teve 35 encontros do tipo em seis meses.

— Saiu uma matéria no Globo dizendo que recebi mais parlamentares que Pazuello em dez meses. Recebi e recebo. As portas estão abertas.

Ao abrir a sessão, Aziz, confirmou que a votação de requerimentos prevista para esta terça-feira foi cancelada e que os senadores ainda vão decidir se as deliberações vão ocorrer na quarta ou na quinta-feira. Na segunda, houve um impasse no grupo do G7, formado por oposicionistas e independentes, sobre a quebra de sigilo de oito pessoas ligadas ao Palácio do Planalto, entre elas o filho do presidente da República, Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ).

Alguns parlamentares avaliam que não é momento de fazer este tipo de solicitação. A tendência é de que o pedido envolvendo Carlos fique fora da pauta, mas os congressistas ainda buscam acordo sobre outros nomes, como os ex-ministros Eduardo Pazuello e Ernesto Araújo, e o ex-secretário de Comunicação da Presidência, Fabio Wajngarten.

Aziz também anunciou as datas de depoimentos do governadores convocados à comissão. O governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), será o primeiro a prestar depoimento, na próxima quinta-feira. Veja o cronograma:

29 de junho: Helder Barbalho (MDB), do Pará;
30 de junho: Wellington Dias (PT), do Piauí;
1º de julho: Ibaneis Rocha (MDB), do Distrito Federal;
2 de julho: Mauro Carlesse (PSL), do Tocantins;
6 de julho: Carlos Moisés (PSL), de Santa Catarina;
7 de julho: Antonio Denarium (PSL), de Roraima;
8 de julho: Waldez Góes (PDT), do Amapá.
A CPI também aprovou a convocação do governador de Rondônia, Marcos Rocha, da vice-governadora de Santa Catarina, Daniela Reinehr, mas as datas desses depoimentos não foram anunciadas.

O Globo