Fundão eleitoral dá R$ 2 milhões por cabeça da elite política

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Foto: Zanone Fraissat

A aprovação pelo Congresso de um valor de R$ 5,7 bilhões para o fundo eleitoral não só elevará o país ao topo do ranking de uso de dinheiro público nas campanhas como possibilitará um gasto médio de mais de R$ 250 mil, por candidato, nas eleições do ano que vem.

O valor representa a divisão da verba pública total prevista —R$ 5,7 bilhões do fundo eleitoral, mais R$ 972 milhões do fundo partidário—, dividido pelos cerca de 26 mil candidatos que foram lançados pelos partidos nas últimas eleições gerais, em 2018.

O mero exercício matemático, porém, não revela de forma fidedigna o cenário provável, já que é zero a possibilidade de as legendas dividirem a bolada de forma equânime entre os candidatos.

A lei que criou o fundo eleitoral, aprovada Congresso Nacional em 2017, dá liberdade extrema aos partidos para decidir quem receberá o dinheiro e em qual montante. Eles têm que obedecer apenas a algumas regras definidas pelo Poder Judiciário, como a cota de repasse proporcional a mulheres e negros.

Além de desrespeitar constantemente essas regras, porém, os partidos articulam uma ampla reforma política no Congresso cujo intuito, entre outros, é afrouxar ou acabar com essa política de cotas.

Levando-se em conta o pleito de 2018, cerca de 20 mil dos 26 mil candidatos aptos receberam alguma verba pública de seus partidos. Mas o grosso desse financiamento, 90%, ficou nas mãos de um grupo bem mais restrito —aproximadamente 3.500 candidatos.

Ou seja, se essa proporção se repetir com o superfundo aprovado para 2022, essa elite política será formada por candidatos que terão nas mãos, cada um, uma média de R$ 1,8 milhão para gastar em suas campanhas.

Essa elite é formada, geralmente, pelos candidatos a presidente, governador, senador e à reeleição na Câmara dos Deputados e nas Assembleias Legislativas dos estados —em suma, os políticos já estabelecidos.

O valor de R$ 1,8 milhão é exatamente o valor da campanha com verba pública declarada pelo deputado Arthur Lira (PP-AL), hoje presidente da Câmara, na campanha de 2018.

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), declarou despesa de R$ 1,4 milhão de dinheiro público dos fundos partidário e eleitoral (além de outros R$ 2,3 milhões de recursos próprios e de doações recebidas, principalmente de empresários).

Naquela eleição, o limite de gasto para o cargo de deputado federal foi de R$ 2,5 milhões. O de senador de Minas, R$ 4,2 milhões.

Até 2015, as campanhas eleitorais no Brasil eram financiadas majoritariamente pelo dinheiro empresarial vindo de grandes bancos e empreiteiras ou de gigantes de um determinado setor, como a JBS.

Os variados escândalos envolvendo relações promíscuas entre doadores e políticos beneficiados serviu como reforço para que o STF (Supremo Tribunal Federal) decidisse, em 2015, proibir as empresas de financiar os candidatos.

O argumento principal foi o de que o poderio econômico comprometia o equilíbrio de força nas disputas.

A decisão, porém, não resolveu por inteiro o desequilíbrio de forças, já que candidatos muito ricos e políticos já estabelecidos continuaram a ter muita vantagem em relação aos demais ao financiar as campanhas com dinheiro do próprio bolso, além de algumas empresas continuarem financiando candidatos de forma velada, por meio de doações feitas por seus executivos.

O fechamento formal da torneira empresarial, porém, fez o Congresso se movimentar para vitaminar a fonte pública de financiamento das campanhas políticas. Em 2017, foi aprovado o fundo eleitoral, que veio a se somar a um fundo partidário, já inflado para cerca de R$ 1 bilhão ao ano.

Com isso, em 2018 foi realizada a primeira campanha com as regras atualmente em vigor. Na ocasião, o fundo eleitoral foi estipulado em R$ 1,7 bilhão. Dois anos depois, no pleito municipal de 2020, cresceu para R$ 2 bilhões.

A possível superconcentração de dinheiro público na mão dos candidatos em 2022 pode ser ainda maior já que o Congresso, no bojo da discussão da reforma política, estuda mudar o atual modelo de eleição de deputados para o chamado distritão.

Nesse novo formato, são eleitos os mais votados. Ou seja, os partidos não precisarão lançar mais o máximo de candidatos possível para obter cadeiras na Câmara —o atual modelo, chamado proporcional, leva em conta toda a votação obtida pela sigla e pelos candidatos lançados para fazer a distribuição de cadeiras.

O distritão está em discussão em uma comissão especial da Câmara. Para valer em 2022, precisa ser aprovado com o voto de pelo menos 60% dos deputados federais e senadores, em dois turnos no plenário, e ser promulgado até o início de outubro —um ano antes da eleição.

O novo valor do fundão também depende ainda de um caminho a ser percorrido neste ano no Congresso e no Executivo.

Como revelou a coluna Painel nesta terça-feira (20), há uma negociação entre centrão e governo federal para que haja um meio-termo entre os R$ 2 bilhões de 2018 e os R$ 5,7 bilhões aprovados pelo Congresso

Uma solução levada ao Palácio do Planalto e que contou com a simpatia de integrantes do governo envolve um patamar próximo de R$ 4 bilhões —o que dobraria o valor em relação a 2018.

Em entrevista à Folha, o vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (PL-AM), afirmou desconfiar que tudo não passou de um acordão entre o governo Bolsonaro e o centrão para emplacar o valor que eles realmente desejariam, os R$ 4 bilhões.

A manobra citada por Ramos, se de fato aconteceu, é rotineiramente usada em Brasília e pode ser explicada pela metáfora da ameaça de se colocar um bode na sala —ocasião em que coisas antes impensáveis passam a ser plausíveis de discussão diante da perspectiva de um absurdo ainda maior.

A previsão de R$ 5,7 bilhões está atualmente nas mãos do presidente Jair Bolsonaro, que tem o poder de vetar a medida incluída na Lei de Diretrizes Orçamentárias.

Embora o Congresso possa derrubar esse veto, o valor que irá valer, porém, será definido apenas na discussão da proposta de Orçamento-2022, que tem que ser enviada pelo Executivo ao Congresso até 31 de agosto.

Caso entre mesmo em vigor, a bolada representará o maior gasto eleitoral da história, já que os cerca de R$ 6,7 bilhões (fundos público e privado) vão se somar aos gastos privados, que são o autofinanciamento e a doação de pessoas físicas, em especial empresários, que podem repassar aos candidatos até 10% de sua renda anual.

Folha de S. Paulo

 

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