Líder do governo no Senado se diz constrangido com sua atuação

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Foto: Senado

O empresário Cristiano Carvalho relatou à CPI da Covid nesta quinta-feira (15) como foi a negociação por 400 milhões de doses da AstraZeneca, sem aval da fabricante, com a cúpula do Ministério da Saúde e a intermediação de militares e uma ONG evangélica.

Os detalhes da frustrada operação bilionária que teve entre os líderes o próprio Cristiano, representante da ​Davati Medical Supply e beneficiário do auxílio emergencial na pandemia, fortaleceram as investigações da cúpula da CPI e chegaram a constranger senadores da base do presidente Jair Bolsonaro na sessão.

Cristiano confirmou à CPI que foi avisado sobre um suposto pedido de propina durante as negociações. O cabo da PM de Minas Gerais Luiz Paulo Dominghetti revelou à Folha que o ex-diretor de Logística da Saúde Roberto Ferreira Dias teria cobrado, em jantar no dia 25 de fevereiro, US$ 1 por dose para destravar o negócio com a Davati.

“Primeira vez que veio diretamente a mim, sobre o nome do Roberto Ferreira Dias envolvido nisso foi, acredito eu, que no dia 12 de março, na minha vinda até aqui [Brasília]. Estávamos na Senah [ONG evangélica que participou das conversas]”, disse Cristiano no depoimento.

A testemunha da CPI também afirmou que foi procurada e manteve conversas com Dias por WhatsApp, ou seja, fora dos processos formais da Saúde, como mostrou a Folha.

O líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), apontou “desconforto” com as conversas de membros e ex-funcionários da gestão federal com os vendedores que nem sequer apresentavam provas sólidas de terem as doses em mãos.

“Quero manifestar meu desconforto com diálogos que foram mantidos entre representantes da Davati com servidores públicos e ex-servidores públicos”, disse Bezerra.

“A gente constata a falta de credenciamento, de capacidade técnica, de habilidade técnica para que esta empresa Davati, ou seus eventuais representantes, pudessem tratar com o governo brasileiro para eventual aquisição ou compra de vacinas”, acrescentou.

Cristiano ainda confirmou que as suas ofertas foram levadas a reuniões distintas com três membros da cúpula do Ministério da Saúde, além de seus auxiliares.

O empresário Herman Cardenas, dono da Davati, reconheceu em entrevista à Folha que a empresa não tinha à mão nenhuma das doses oferecidas ao governo brasileiro. Ele afirmou que a empresa seria apenas uma facilitadora do negócio entre a fabricante e o ministério.

Para os senadores, o relato de Cristiano reforça a tese de que a Saúde abriu a porta para atravessadores com ofertas inviáveis de vacinas enquanto rejeitava a compra de imunizantes diretamente com fabricantes como a Pfizer.

O líder do governo no Senado pediu que a CPI não responsabilize o governo por “atos praticados por um ou outro servidor”.

Para o senador governista Jorginho Mello (PL-SC), a gestão Bolsonaro se livrou de golpistas. Ele também manifestou constrangimento pelos diálogos da Davati com o ministério, e pediu maior atenção da pasta.

“Não é possível que pessoas que não representam nada, vendedores informais, tentaram dar um golpe no governo. Ainda bem que não saiu ‘um pila’”, disse Jorginho.

Presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM) cobrou que o governo responsabilize ao menos Elcio Franco, coronel da reserva, ex-secretário-executivo da Saúde e atual assessor da Casa Civil, que recebeu o grupo da Davati.

“Eu sugiro, para o bem do país, um cidadão como Elcio Franco não pode estar na antessala do presidente mais. Não pode passar a mão em cima de uma pessoa que brincou com a vida de pessoas negociando vacinas fantasmas”, disse Aziz.

O grupo de representantes da Davati ainda ofereceu 200 milhões de doses da vacina da Janssen ao ministério, em email de 15 de março enviado a Franco, mas a negociação não foi para frente.

A primeira agenda no ministério com representantes da empresa ocorreu em 22 de fevereiro, com o então diretor da Imunização e Doenças Transmissíveis, Lauricio Monteiro. Depois, em 26 de fevereiro, Dominghetti esteve com Dias no ministério, na data seguinte ao jantar em que houve o suposto pedido de propina.

A última reunião foi feita em 12 de março, quando Franco recebeu de Cristiano e seus parceiros a oferta da Davati.

Segundo o vendedor, Franco não sabia das tratativas anteriores feitas com Dias. O militar e mais dois auxiliares presentes na reunião ficaram com “cara de paisagem”, descreveu Cristiano. “Tipo assim: ‘Não estamos sabendo o que está acontecendo aqui, dentro do ministério.”

Cristiano afirmou à CPI que parecia haver duas portas de entrada para negociar as vacinas na Saúde: Dias e Franco.

“Havia dois caminhos no ministério, aparentemente. Um era via Elcio Franco, e outro pelo Roberto Dias. O caminho que ele [Dominghetti] tentou via Roberto Dias aparentemente não prosseguiu por conta de algum pedido que foi feito lá”, disse Cristiano.

Ele afirmou que a conversa com Dias foi intermediada pelo coronel da reserva Marcelo Blanco, ex-assessor de Dias. Para Cristiano, Blanco tinha posição “dúbia”, pois parecia seguir assessorando o ex-chefe.

A testemunha da CPI chegou a negar que sabia do suposto pedido de propina. Primeiro, ele disse que soube, após o jantar de 25 de fevereiro, somente que havia cobrança para “comissionamento” do grupo de Blanco e Odilon, um empresário que ele não soube informar o sobrenome.

Depois ele confirmou à CPI que ouviu, em 12 de março, sobre a suposta cobrança de propina no jantar com Dias.

Já a conversa com Franco, segundo Cristiano, foi facilitada por Helcio Bruno, também coronel da reserva e presidente do Instituto Força Brasil.

A intermediação entre a Davati e o governo Bolsonaro ainda era feita pela Senah (Secretaria Nacional de Assuntos Humanitários), uma ONG evangélica presidida pelo reverendo Amilton Gomes de Paula.

O grupo da Senah prometia amplo acesso ao governo federal, inclusive ao presidente e à primeira-dama, Michelle Bolsonaro, conforme mensagens registradas no celular de Dominghetti.

Em áudios registrados no telefone e recolhidos pela CPI, Cristiano mostra desconfiança sobre o grupo do reverendo. “Esses caras não são sérios, esse pessoal do reverendo é pilantra. Não tem acesso a ninguém, o reverendo não tem influência alguma com ninguém”, disse ele em gravação de 5 de abril.

Cristiano ainda negou à CPI que orientou Dominghetti a expor o áudio que cita o deputado Luis Miranda (DEM-DF), pivô de denúncias de irregularidades na compra da vacina Covaxin.

“Excelência, eu estava assistindo à oitiva dele aqui e vou ser bem sincero para o senhor. Quando ele estava aqui no meu lugar, quando ele puxou o celular, colocou o áudio e apontou o deputado, eu juro que eu quase tive um infarto porque eu falei: não tem nada a ver”, afirmou Cristiano à CPI nesta quinta.

O depoente também disse que alertou o PM sobre o suposto equívoco, pois a gravação tratava de uma negociação de Miranda para a venda de luvas. “Dominguete, esse áudio do Luiz Miranda não se refere a vacinas”, diz a mensagem enviada ao policial durante a reunião de 1º de julho da CPI.

Cristiano disse que foi chamado de forma “equivocada e folclórica” de CEO da Davati no Brasil por Dominghetti. Ele afirmou que tinha um acordo precário para representar a empresa no país, e que os negócios saíram do controle.

“[A negociação] Tomou uma dimensão bem grande, porque através do reverendo Amilton, que fez um grande trabalho com a representação de vacinas no Brasil, muitas prefeituras do Brasil inteiro, até estados, começaram a procurar a Davati para resolver a questão da falta de vacina”, disse.

Segundo Cristiano, houve negociações com quatro consórcios de prefeituras, com o Governo de Minas Gerais e com o governo federal.

O vendedor também minimizou menções a Michelle Bolsonaro em diálogos registrados no celular de Dominghetti. “Se criou um folclore sobre as pessoas envolvidas. E ainda tem um folclore sobre as pessoas envolvidas. Um é o CEO, o outro é a Michelle [Bolsonaro], o presidente”, disse.

Cristiano também mudou a versão à CPI sobre o pedido para receber o auxílio emergencial do governo federal.

Primeiro, ele disse que “uma colega” havia feito a inscrição dele no programa, “porque ela viu que eu estava passando dificuldades para pagar as contas naquele momento”. Depois de intervalo e conversa com seu advogado, ele reconheceu que era o autor do pedido para receber a ajuda.

O empresário recebeu R$ 4.200 de ajuda em 2020 pelo programa direcionado a famílias que ficaram mais vulneráveis na pandemia.

Folha  

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