Prisão de ex-presidente faz violência explodir na África do Sul

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Foto: MARCO LONGARI / AFP

Os piores distúrbios registrados na África do Sul desde o fim do regime de apartheid, nos anos 1990, se espalharam por mais cidades nesta terça-feira, e o número de mortos chegou a 45, segundo as autoridades.

Iniciadas com protestos de seguidores do ex-presidente Jacob Zuma (2009-2018) contra sua prisão, em 7 de julho, as manifestações se transformaram em uma onda de violência, com centenas de lojas saqueadas, o Exército enviado para as ruas para tentar controlar a situação e mais de 700 pessoas presas.

Os distúrbios se concentram principalmente nas províncias de KwaZulu-Natal, onde Zuma nasceu e mora, e Gauteng, onde fica Johanesburgo — as duas respondem por cerca de metade da produção econômica sul-africana. Muitos estabelecimentos comerciais foram saqueados e as principais rodovias, bloqueadas.

Embora a turbulência tenha sido desencadeada pela prisão de Zuma, os distúrbios tomaram proporções muito maiores. O governo afirma que criminosos estão se aproveitando da situação de instabilidade. No entanto, a crise econômica agravada pela pandemia também pode estar por trás da revolta da população, segundo Aleix Montana, analista da África na Verisk Maplecroft, empresa especializada em análise de risco global. A taxa de desemprego é de 32,6%, a maior desde 2008, quando o governo passou a publicar dados trimestrais sobre emprego.

— A prisão de Zuma foi a faísca que desencadeou os protestos, mas questões subjacentes como o desemprego crescente, a desigualdade generalizada e o descontentamento com as restrições relacionadas à Covid-19 são o barril de pólvora — disse Montana. — Avaliamos que a agitação vai continuar a se intensificar nos próximos dias.

A desigualdade que marcou a história sul-africana no período da segregação racial não foi superada depois do seu fim. De acordo com dados de 2019 do Banco Mundial, o país é o mais desigual do mundo, com os 10% mais ricos retendo 71% da riqueza nacional. No Brasil, também um dos países mais desiguais, os 10% mais ricos retêm 43% da renda, segundo dados de 2020 do IBGE.

Zuma começou a cumprir uma pena de 15 meses de prisão na capital de KwaZulu-Natal, Pietermaritzburg, por desacato à Justiça, após se recusar a depor em processos em que é acusado de corrupção. Apesar de ter sido afastado da direção do governista Congresso Nacional Africano (CNA) e da Presidência após sucessivos escândalos, o ex-presidente mantém uma base de seguidores fiéis.

Os distúrbios também alcançaram outra província, a de Cabo Oriental, com lojas saqueadas na cidade de East London, apesar de a situação ser menos tensa do que em outras áreas, segundo o porta-voz da província, Mxolisi Spondo.

— Sim, a situação parece estar fora de controle. As pessoas estão em pânico — disse o ministro da Defesa, Nosiviwe Mapisa-Nqakula, a jornalistas em Pretória. — Estamos todos preocupados com o que está acontecendo.

Cidades nas províncias de Gauteng, KwaZulu-Natal e Cabo Oriental tiveram distúrbios Foto: Editoria de Arte / O Globo

Apesar de o governo ter informado que 10 pessoas morreram durante os distúrbios, autoridades regionais apontam números maiores. Segundo o primeiro-ministro de KwaZulu-Natal, Sihle Zikalala, foram 26 mortos apenas em sua província. Seu homólogo de Gauteng, David Makhura, disse que 19 morreram na sua região.

Na noite de segunda-feira, o presidente Cyril Ramaphosa disse que os tumultos poderiam levar à escassez de comida e remédios nas próximas semanas. Ramaphosa afirmou que os atos poderiam acarretar uma interrupção maior do programa de imunização justamente quando o país estava intensificando a vacinação.

— Partes de nosso país sofreram vários dias e noites atos de violência, destruição de propriedades e saques que raramente foram vistos na história de nossa democracia — disse o presidente, que substituiu Zuma no cargo em fevereiro de 2018 e é do mesmo CNA que governa a África do Sul desde o fim do regime do apartheid.

A fundação de Zuma afirmou nesta terça-feira que não haverá paz na África do Sul até ele ser libertado. “Paz e estabilidade na África do Sul estão diretamente ligadas à liberação do presidente Zuma”, publicou a fundação no Twitter.

— A violência poderia ter sido evitada. Tudo começou com a decisão do Tribunal Constitucional de deter o presidente Zuma. Isso foi o que irritou o povo — disse à Reuters um porta-voz da fundação.

Enfrentando uma terceira onda da Covid-19, o programa de vacinação no país teve de ser interrompido parcialmente por causa dos distúrbios. A imunização foi suspensa em KwaZulu-Natal e em partes de Gauteng, segundo Nicholas Crisp, um consultor do Departamento Nacional de Saúde que está ajudando a supervisionar o programa.

— É claro que não vamos pôr nossa equipe em perigo — disse Crisp nesta terça-feira, acrescentando que quem está na fila para se vacinar também pode estar em perigo. — Só vai ter que esperar até as coisas se acalmarem.

O golpe no programa de vacinação ocorreu justamente quando o país conseguiu começar a acelerar a imunização. Até 12 de julho, apenas 6,5% da população sul-africana recebeu pelo menos uma dose da vacina, segundo dados do site Our World in Data, da Universidade de Oxford. Só 2,3% foram totalmente imunizados.

A África do Sul é o país africano mais atingido pela Covid. O país teve queda de 7% do PIB em 2020, e estava se recuperando quando veio a terceira onda.

A emissora eNCA transmitiu imagens ao vivo de uma multidão saqueando um complexo de armazéns perto da cidade portuária de Durban, no Leste de KwaZulu-Natal, nesta terça-feira. Bheki Cele, ministro da Polícia da África do Sul, informou que 304 pessoas foram presas em KwaZulu-Natal e outras 453 em Gauteng.

Centenas de saqueadores invadiram armazéns e supermercados em Durban, também em KwaZulu-Natal, um dos terminais de embarque mais movimentados do continente africano que é também um importante centro de importação e exportação.

Do lado de fora de um depósito em Durban, a Reuters filmou saqueadores enchendo carros com produtos eletrônicos e roupas. Na parte de dentro, enquanto a multidão esvaziava as prateleiras, o chão era formado por uma pilha de embalagens descartadas.

A sentença e a prisão de Zuma são vistas como um teste para o Judiciário do país e sua capacidade de agir mesmo contra políticos poderosos. Zuma, de 79 anos, foi preso por se negar a depor perante o Tribunal Constitucional, a instância máxima da Justiça do país, em uma investigação que apura denúncias de corrupção nos nove anos em que esteve no poder. Ele nega os malfeitos, mas se recusa a cooperar com a investigação.

Segundo estimativas oficiais, cerca de 500 bilhões de rands (R$ 178 bilhões) foram desviados dos cofres públicos durante seu governo — mais de 40 testemunhas ouvidas em inquéritos apontam que Zuma estava no centro dos esquemas de desvio.

O ex-presidente entrou com um recurso contra a detenção, alegando que sua saúde é frágil e que seu risco de contrair Covid-19 seria maior na prisão. Em uma audiência virtual nesta segunda-feira, o advogado de Zuma pediu à Justiça que revogasse sua pena de prisão, citando uma regra de que os julgamentos podem ser reconsiderados se feitos na ausência da pessoa afetada ou contendo um erro de patente. Especialistas jurídicos, no entanto, dizem que as chances de sucesso do ex-presidente são mínimas.

O Globo 

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