Explode o trabalho escravo no Brasil

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Foto: Gabriela Fardin/TV Gazeta

O desemprego e a fome que afligem o país têm feito crescer o trabalho escravo contemporâneo. De janeiro a junho deste ano, o Ministério Público do Trabalho (MPT) contabilizou 772 trabalhadores resgatados em situação análoga à escravidão no Brasil. Italvar Medina, procurador do Ministério Público do Trabalho e vice-presidente da Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo, estima que o número deve passar de 800 já em agosto. Em todo o ano passado, 942 trabalhadores foram resgatados, segundo o MPT. Isso significa que só no primeiro semestre foram registrados o equivalente a 80% dos casos de todo o ano passado.

A evasão escolar, o aumento do desemprego e a falta de renda, devido à pandemia, também preocupa as autoridades. No início deste mês, no município de Ibirim, em Pernambuco, 13 adolescentes com idades entre 13 e 17 anos foram resgatados de trabalho escravo na colheita de tomate, ao lado de seis adultos. Outros 68 trabalhadores trabalhavam sem registro em carteira, em total informalidade. Numa fiscalização em fazendas de café no Sul de Minas, em julho passado, uma adolescente de 16 anos estava entre 63 trabalhadores vítimas de tráfico de pessoas e trabalho escravo.

— Qualquer geração de aumento de pobreza e vulnerabilidade social impacta no trabalho forçado, no trabalho escravo. Abre espaço para a submissão e também para o trabalho infantil — diz Romulo Machado e Silva, subsecretário de Inspeção do Trabalho, da Secretaria do Trabalho, do Ministério do Trabalho e Previdência.

Os avanços no agronegócio e na exploração mineral ainda não foram suficientes para melhorar a situação no campo, que concentra casos de trabalho análogo à escravidão deste ano. Este ano foram resgatados, por exemplo, 25 trabalhadores em plantação de soja e 123 fazendas de cana-de açúcar nos estados do Mato Grosso do Sul, São Paulo e Minas Gerais.

Em Boca do Acre (AM), 14 homens foram localizados trabalhando em condições subumanas num desmatamento ilegal para formação de pasto. Em Sertânia (PE), um trabalhador vivia numa barraca de lona numa pedreira, onde fazia extração de pedras e corte manual de paralelepípedos.

Em 2020, o cultivo de café liderou os flagrantes de trabalho escravo, com 140 resgatados, cerca de 15% do total. Casos se repetem neste ano. Em junho, no município de Pedregulho (SP), 56 trabalhadores foram resgatados da colheita de café. As refeições eram feitam a céu aberto, na lavoura, onde muitas vezes a comida chegava estragada por falta de refrigeração. Embalagens de agrotóxicos eram reutilizadas para lavagem de utensílios domésticos e roupas.

Foi também numa fazenda de café no município de Vila Valério (ES) que os fiscais localizaram 71 vítimas de trabalho escravo. Vinte dos trabalhadores estavam com diagnóstico de Covid-19, mas receberam ordens para continuar trabalhando. Como dividiam o alojamento, os auditores do Ministério do Trabalho descobriram que praticamente todos estavam contaminados. A secretária de Saúde do município era mulher do dono da fazenda — e acabou exonerada.
Embora sejam mais comuns no interior do país, casos de trabalho escravo são registrados também em capitais. No fim de julho, em Fortaleza, 11 trabalhadores que vendiam redes e produtos de cama e mesa viviam no galpão de um estacionamento com instalações precárias e sem água potável. Eles haviam sido aliciados nas cidades de São Bento, Catolé do Rocha e Brejo do Cruz, na Paraíba.

O procurador Medina explica que as pessoas são atraídas com promessas de bons ganhos, mas acabam alojados em condições degradantes e os pagamentos não são feitos como prometido. Como precisam de dinheiro para voltar às suas cidades de origem, se submetem às condições. Na maioria dos casos, nem sabem os direitos trabalhistas que possuem. Quando são alvo de fiscalizações, os patrões têm de quitar as verbas trabalhistas em duas semanas e pagar um salário mínimo por mês trabalhado. Os trabalhadores recebem seguro-desemprego por três meses e são inscritos em programas sociais.

— Se tivessem de recorrer à Justiça do Trabalho demorariam anos para receber e a maioria sequer teria acesso. Muitos sequer sabem os direitos que têm — diz o procurador.

Ainda assim, diante das dificuldades, segundo Medina, há casos de trabalhadores que voltam a se submeter ao mesmo tipo de serviço. Numa operação realizada em Mogi Guaçu (SP), em 2020, um dos oito resgatados já havia sido submetido ao mesmo serviço, nas mesmas condições por oito vezes, para atuar na colheita de tomate, pepino e berinjela.

— Eles se veem culpados pela própria miséria, como se fossem partícipes do crime. Alguns fazem isso há anos, por falta de alternativa. Para conseguir as informações, precisamos convencê-los que são vítimas — diz a juíza Ana Paula Alvarenga, juíza plantonista do Comitê de Erradicação do Trabalho Escravo do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, que atua na região de Campinas (SP).

As fiscalizações geralmente são feitas pelos auditores-fiscais do Trabalho, em parceria com o Ministério Público do Trabalho, Defensoria Pública, Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal, além de representantes da Justiça do Trabalho.

Maranhão e Pará são os estados que, historicamente, encabeçam a lista de “exportadores” de trabalhadores nessas condições. A região do Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, uma das mais pobres do país, é a origem de muitos trabalhadores localizados em condições subumanas em São Paulo, segundo Ana Paula Alvarenga, juíza plantonista do Comitê de Erradicação do Trabalho Escravo do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, que atua na região de Campinas (SP).

Maurício Krepsky, coordenador do Grupo Especial de Fiscalização Móvel e chefe da Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo (Detrae), do Ministério do Trabalho, afirma que dez anos atrás era comum achar numa única fiscalização centenas de trabalhadores num mesmo local, vigiados por segurança armada. Hoje, os casos são mais pulverizados e misturados com outros tipos de irregularidades trabalhistas.

— Hoje não precisa mais ter arma apontada para restringir a mobilidade. Há retenção de documentos, dívidas que os trabalhadores são obrigados a contrair e, longe de casa, eles dependem do pagamento para poder voltar — explica.
Chama atenção ainda o setor de construção civil, com 16 trabalhadores resgatados no Rio Grande do Sul, e até de transporte de cerveja, em São Paulo. Em maio, uma transportadora de bebidas foi flagrada com 23 imigrantes bolivianos e haitianos em condições ilegais. A empresa havia prometido alojamento, mas eles viviam na boleia dos caminhões em que trabalhavam.

O Globo

 

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