Fundador da Natura pede que Bolsonaro renuncie

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Foto: Eduardo Knapp/Folhapress

O cofundador da Natura Pedro Passos, um dos signatários do manifesto em defesa das eleições divulgado na quarta-feira (4), vê na escalada do comportamento do presidente Jair Bolsonaro uma ameaça de fragilização das instituições e perda de direitos no Brasil.

Na avaliação do empresário, há “evidências óbvias de crime de responsabilidade” que o Brasil não pode tolerar, e a presidência da Câmara deveria avaliar se um processo de impeachment teria de caminhar ou não.

Passos sugere que Bolsonaro renuncie, se tiver dificuldade para se adequar ao regime democrático no país.

“Se o presidente da República não gosta das regras do jogo democrático, se sente tão incomodado, se ele não se sente capaz de implementar o seu plano de governo, que é quase difícil de adivinhar qual é, porque não existe explicitação, tem um caminho que seria muito mais natural para o país, para os brasileiros e para a gente sair dessa situação. É a renúncia”, diz Passos.

Para ele, as ameaças que o presidente faz à democracia são inaceitáveis e a sociedade já não tolera.

Pelas previsões do empresário, uma redução nos índices da pandemia pode levar o povo às ruas, se não houver mudança por parte do presidente.

O país está perdendo um tempo precioso na discussão de agendas irrelevantes, segundo o empresário. “E você vê uma liderança do país totalmente alienada do que é importante”, diz.

Qual é o risco dessa postura do presidente neste momento? Em primeiro lugar, é inaceitável para um país que vive a trajetória do Brasil, uma democracia relativamente recente, ver um presidente ameaçando as instituições, os valores democráticos. É inaceitável.

E isso vem se agravando na medida que o governo foi mostrando efetivamente qual era a sua agenda. E vem se agravando de forma importante, o que causa uma ansiedade de toda a sociedade, e uma reação de vários grupos.

Existe sim o risco, talvez não do golpe nos termos tradicionais, que a gente imagina e lembra do passado. Mas existe sim o risco de uma fragilização das instituições, do processo democrático, da perda de direitos. O que eu vejo e sinto é cada vez mais grupos da sociedade se insurgindo contra e se manifestando.

E o risco para a economia mais especificamente? É um país onde o risco é alto. Onde se vive um ambiente político que tem essa conturbação, em primeiro lugar, é o risco país, a volatilidade. A economia e as tendências ficam mais difíceis de prever. Isso causa um custo maior para toda a sociedade, para todos os brasileiros, porque investir aqui no Brasil ficou mais difícil diante desse ambiente.

Nós também estamos perdendo tempo precioso na discussão de agendas que não têm a menor relevância, como até ontem estávamos discutindo o voto em papel, o voto impresso etc, quando nós temos uma agenda difícil e importante para ser construída, na base do consenso e da negociação.

E você vê uma liderança do país totalmente alienada do que é importante. Tem um risco sim para a economia, que já está sendo capturado com variação cambial ou câmbio já mais alto do que deveria estar. Você já viu um movimento de taxa de juros. Enfim, é um país instável, portanto, não é bom para os negócios.

Houve um outro manifesto, lançado no primeiro semestre, que também tinha nomes de grandes empresários e representantes da sociedade pedindo moderação e responsabilidade ao presidente naquele momento para lidar com a pandemia. Agora vem esse sobre eleições. Será que o setor privado e a sociedade vão agora começar a se posicionar mais fortemente? E tem potencial para ser um anteparo eficaz aos excessos? O que eu noto de diferença entre aquele primeiro manifesto, quando se tratava da pandemia e se procurava uma adequação maior do presidente em relação ao enfrentamento do problema, e este aqui é um sentimento de indignação. É uma coisa mais forte. É uma mobilização que acontece de uma forma mais rápida. Ninguém mais está tolerando esse tipo de ameaça a uma conquista que é da sociedade.

Nós já vivemos uma transição de um regime autoritário. Já vivemos a social-democracia. Já vivemos o governo Lula com o PT, a Dilma. Tivemos problemas, como toda democracia tem. Mas é o diálogo, é o contraditório, é o debate democrático nas regras do jogo. Quando você vê ameaçadas essas regras de uma forma inconsequente, de uma forma, eu diria até mentirosa, eu acho que o que está se manifestando agora é um sentimento de indignação que vai continuar. Vai continuar, a menos que haja uma mudança. Pouco provável, mas, a menos que haja uma mudança de postura.

Nós não podemos desafiar o Judiciário da forma que está sendo desafiado. Não podemos desrespeitar várias instituições do país. O que foi feito na área de educação, de ciência, de meio ambiente, é um histórico de destruição que não tem apoio na sociedade. Não tem apoio.

O brasileiro quer uma solução que seja de conciliação, de pacificação, de construção de uma agenda de esperança. É isso que nós queremos. Eu tenho a impressão de que vai continuar. Se não houver uma mudança de curso, vai continuar a reação da sociedade. Eu não tenho conhecimento político para te fazer essa afirmação, mas se eventualmente reduzir o risco de contaminação, se houver uma redução dos aspectos da Covid, eu tenho a impressão de que o povo vai para a rua sim.

Muitos grandes empresários e representantes de associações setoriais se calam, não aparecem nestes manifestos, e evitam criticar. O que isso significa? Quem não fala pode estar apoiando o que está acontecendo? Qual seria um motivo para isso? Infelizmente as representações empresariais, por todo o sistema que vem de uma legislação desde o Estado Novo, não se renovaram. Essa representação não se renovou e, ao contrário, acabou criando extensões de mandatos e de pessoas que não representam mais o empresariado nacional.

Hoje, o que se fala no mundo das federações, das confederações, não tem a legitimidade empresarial. Acabam fazendo um discurso chapa branca. E esse grupo, na verdade, não pode ser lido como representação do setor empresarial. O setor empresarial está lutando por empreendimentos, por inovação, por tirar o país da crise, por fazer as reformas consistentes que precisam ser feitas, e pensando no Brasil.

Não está mais pensando no curto prazo no seu setor. Então, é por isso que eu acho que nós deveríamos entender empresários de uma forma diferente do que é dito nas federações e confederações.

A Natura é reconhecida por ter sempre se posicionado na questão ambiental. E não se viu desde o início do governo uma mobilização como essa de outros empresários no lado ambiental. Por quê? Tem tido movimentações do lado ambiental. Vem crescendo. O tema não é tão transversal. Não afeta tantos quanto estes temas dos quais nós estamos falando agora, mas tem crescido de uma maneira enorme, inclusive com apoio internacional.

E agora o próprio mundo empresarial já sente que o Brasil está perdendo posições no exterior. Não está mais sentado à mesa das negociações que deveria estar, porque o Brasil tem uma condição ambiental que poderia colocá-lo em vantagem em relação a outros países. O Brasil perdeu espaço.

Mas tem havido movimentação empresarial sim. É mais reduzida, mas tem havido uma adesão importantíssima. Até dois anos atrás, talvez, não havia o mercado financeiro defendendo a questão ambiental. Ele estava um pouco afastado da questão ambiental. Vinha mais de alguns setores empresariais. Hoje, essa agenda domina amplamente todos os setores e a agenda ESG, principalmente, agora faz parte de toda a atuação empresarial.

Infelizmente, o Brasil ficou para trás. Mas eu vejo que é irreversível esse movimento contaminar também mais amplamente o setor empresarial.

Qual é a sua opinião sobre o papel da presidência da Câmara em relação à reflexão sobre um impeachment? Falta reação? Essa é uma pergunta bastante importante porque nós temos aí evidências óbvias de crime de responsabilidade. E o Brasil não pode tolerar crime de responsabilidade. O Brasil tem que perseguir o correto, a legislação. E a presidência da Câmara deveria percorrer essas denúncias de crime de responsabilidade e de impeachment e avaliar efetivamente se esse processo deve caminhar ou não.

A gente sente que hoje existe um represamento por conveniência política da análise desses processos de impeachment.

Mas eu vou fazer até uma outra ponderação. Se o presidente da República não gosta das regras do jogo democrático, se o presidente da República se sente tão incomodado, se ele não se sente capaz de implementar o seu plano de governo, que é quase difícil de adivinhar qual é, porque não existe explicitação, tem um caminho que seria muito mais natural para o país, para os brasileiros e para a gente sair dessa situação. É a renúncia. Seria o menos traumático e nós poderíamos, talvez, ter uma transição para 2022, para uma eleição correta, eletrônica, como nós sempre fizemos nesse período democrático.

Já que uma parte importante do problema do comportamento do presidente se refere à antecipação do calendário eleitoral, e ele parece precisar da polarização, qual é a sua opinião sobre a eventual volta do ex-presidente Lula para a disputa? O que se pode esperar da terceira via? Eu acho que nós temos um tempo ainda bastante razoável pela frente para que a gente possa buscar uma alternativa que não seja a volta do presidente Lula porque eu acho que é também um retrocesso, de outra ordem. De outra ordem.

E também não podemos imaginar uma repetição do governo atual, pelo menos nos termos do que a gente está vendo. Há que se trabalhar por uma alternativa que traga uma visão de país mais moderno, mais inserido, que trabalhe a inclusão social, que cuide das questões ambientais, da educação, da ciência. E que coloque o Brasil onde ele merece, como estão fazendo as nossas meninas nas Olimpíadas, que colocaram o Brasil no lugar certo, mostraram que esse povo aqui tem raça, tem vontade de vencer. Nós temos muitos atletas olímpicos querendo fazer o mesmo trabalho pelo Brasil. Então vamos dar voz a essa gente. ​

Folha  

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