Governo Bolsonaro tem plano golpista em estudo

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Foto: Reprodução

Discute-se no governo federal ressuscitar a tese de que a Força Nacional pode ser usada para intervenções em estados e no Distrito Federal sem a anuência de governadores, bastando uma ordem ministerial – interpretação que já foi rechaçada pelo Supremo Tribunal Federal.

A avaliação é que o uso da Força Nacional geraria menos críticas que o das Forças Armadas caso Jair Bolsonaro decida mandar tropas sob a justificativa de conter disputas políticas em nome da “preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas”. Por exemplo, em um motim causado por policiais bolsonaristas após ele mesmo acusar as eleições de fraudulentas em outubro de 2022.

O presidente conta com simpatia de uma boa parte dos policiais militares, base da Força Nacional. Sem contar que o atual ministro da Justiça, Anderson Torres, é próximo da família Bolsonaro e o comandante da Força, o coronel da PM do Ceará Antônio Aginaldo de Oliveira, é marido de Carla Zambelli (PSL-SP), da tropa de choque bolsonarista na Câmara dos Deputados.

O STF já avaliou que não tem respaldo constitucional a interpretação de que o decreto que regula a Força Nacional permite que atue nos estados à revelia dos governadores. Mas até aí os ministros da corte também já afirmaram que o artigo 142 da Constituição, que trata do funcionamento das Forças Armadas, não permite uma “intervenção militar”, ou seja, um golpe, ao contrário do que atesta o bolsonarismo.

A família Bolsonaro e seus aliados já ameaçam descumprir decisões judiciais. O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) afirmou, na última quinta (19), que “vai chegar uma hora em que essas ordens, infelizmente, da maior corte, de mais elevado nível do judiciário nacional, não vão ser cumpridas”.

Já Ricardo Barros (Progressistas-PR), líder do governo na Câmara e investigado pela CPI da Covid no caso do superfaturamento na compra de vacinas, também disse, em 8 de junho, que “vai chegar uma hora em que vamos dizer [para o Judiciário] que simplesmente não vamos cumprir mais”.

Tudo começou quando o governo Dilma Rousseff (PT) editou o decreto 7.957, em março de 2013, alterando o decreto 5.289, de novembro de 2004, que orienta o funcionamento da Força Nacional de Segurança Pública, sob comando do Ministro da Justiça.

Sob a justificativa de regulamentar a atuação da força para a proteção ambiental, o decreto permitiu que ela “poderá ser empregada em qualquer parte do território nacional, mediante solicitação expressa do respectivo Governador de Estado, do Distrito Federal ou de Ministro de Estado” – grifo meu.

Isso gera uma contradição, uma vez que a Força Nacional nasceu como um programa de cooperação federativa, em que estados e o Distrito Federal precisariam concordar com a atuação.

Na época, movimentos sociais que protestavam contra os impactos ambientais, sociais e trabalhistas das grandes obras, como a construção das hidrelétricas de Belo Monte, no Pará, e Jirau e Santo Antônio, em Rondônia, apontaram que o objetivo da mudança era blindar esses empreendimentos contra manifestações populares.

Quem se aproveitou da brecha criada pelo governo petista foi, por exemplo, o então ministro da Justiça, Sergio Moro, que em 12 de agosto de 2019 publicou a portaria 692, autorizando o emprego da Força Nacional em “ações de preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas” e em defesa do patrimônio sem a anuência prévia do governador do Distrito Federal. O foco eram as manifestações populares que seriam realizadas nos dias 13 e 14 de agosto.

Brasília recebeu milhares de estudantes, professores e sindicalistas que protestaram contra os cortes no orçamento da Educação promovidos por Bolsonaro e a Reforma da Previdência. Uniram-se a outras milhares da Marcha das Mulheres Indígenas, organizada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), em defesa de seus territórios.

No próprio dia 13 de agosto, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), do Ministério Público Federal, então chefiada por Deborah Duprat, publicou uma nota pública criticando a convocação. O texto afirmava que a Força Nacional não pode servir à “intervenção federal em um ente federativo”.

Para a PFDC, o ministério poderia, no máximo, autorizar o uso da Força a contribuir com ações de militares de defesa dos prédios públicos e, ainda assim, justificando muito bem considerando os altos custos e a excepcionalidade.

Após reportagem de Rubens Valente, na Folha de S.Paulo, mostrar que membros da Força Nacional foram usados para espionar as organizadoras indígenas da marcha, entre elas Sônia Guajajara, o PSOL na Câmara dos Deputados foi à Procuradoria-Geral da República contra Moro. A representação acabou arquivada.

O Supremo Tribunal Federal, enfim, afirmou que a Força Nacional não pode ser usada sem demanda dos governadores após o então ministro da Justiça e hoje indicado a uma vaga no Supremo Tribunal Federal, André Mendonça, determinar o seu envio para reintegrações de posse em áreas de assentamentos, na Bahia, em setembro do ano passado. Na época, ele afirmou que o decreto permitia o envio de tropas devido a uma solicitação do Ministério da Agricultura.

O ministro Edson Fachin decidiu a favor do governador Rui Costa (PT), na Ação Civil Originária 3.427/BA, e ordenou a retirada da Força Nacional mobilizada nas cidades de Prado e Mucuri. Três semanas depois, a posição da liminar concedida pelo ministro foi ratificada pelo plenário do STF por 9 a 1.

No acórdão, a corte afirmou que a norma inscrita no decreto nº 5.289/2004, ao autorizar o emprego da Força Nacional sem a anuência do governador, “viola a natureza cooperativa do programa e seu suporte constitucional”, conflitando com a Constituição Federal.

Apesar dessa ação civil não ter efeito vinculante, a União foi a ré da ação. Ou seja, ela já foi alvo de uma decisão de que não pode interpretar o decreto dessa forma. Portanto, estaria batendo de frente com o STF se fizer isso.

Pesquisa divulgada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, no ano passado, apontou que 41% dos praças (soldados, cabos, sargentos e subtenentes) da Polícia Militar participavam de grupos bolsonaristas nas redes e aplicativos de mensagens, 25% abraçavam ideias radicais e 12% defendiam o fechamento do Supremo Tribunal Federal e do Congresso Nacional.

Nas unidades da federação que são chefiadas por aliados do presidente, o consentimento do uso da Força Nacional é mais simples. A questão é nos demais – e é aí que entra a discussão no governo sobre a interpretação do decreto que autoriza um ministro de Estado tomar uma decisão passando por cima de um governador. O que pode ser útil caso o golpismo do presidente resolva ir às ruas no ano que vem.

Uol  

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