Ministério irrelevante por quase três anos vira aposta de Bolsonaro

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Foto: Roque de Sá/Agência Senado

Oito telões lado a lado, formando uma imensa tela de projeção, incrementam o cenário de um dos gabinetes mais procurados de Brasília nos últimos tempos. No Ministério da Cidadania, deputados, prefeitos e vereadores aguardam na fila a marcação de uma concorrida audiência com o ministro João Roma. Quase sempre os políticos vão em busca da liberação de uma verba ou a inclusão de seus redutos eleitorais em um dos vários programas sociais da pasta — e nunca saem de mão abanando. O ministro anota cuidadosamente o pedido, se compromete a fazer todos os esforços para atender e, antes de se despedir, convida o visitante para acompanhá-lo no que, para muitos, acaba sendo o ponto alto da reunião. No canto da sala, os telões são programados para projetar a bandeira do município ou do estado do visitante — pano de fundo para uma sessão de fotos com o ministro, prova de que o governo está empenhado em resolver os problemas daquela localidade. Os encontros duram, em média, trinta minutos. A sala de espera está sempre cheia.

“Política é assim. Em muitos casos o prefeito quer apenas ser recebido para apresentar propostas e mostrar aos seus eleitores que está buscando em Brasília dinheiro para o município”, diz o ministro João Roma. O fato é que, nos últimos meses, o Ministério da Cidadania, além de se transformar num centro de peregrinação de políticos, é a aposta mais ousada do governo para impulsionar a reeleição de Jair Bolsonaro. A pasta tem um orçamento monumental majoritariamente destinado a custear benefícios sociais, como o Bolsa Família, distribuição de cestas básicas, fomento a pequenos agricultores, construção de cisternas e, mais recentemente, ao pagamento do auxílio emergencial para 35 milhões de pessoas. A pouco mais de um ano das eleições, esse conjunto de ações é tido como o principal ativo do presidente, que vai anunciar, em breve, uma reformulação do Bolsa Família. Entre outras alterações, o programa vai mudar de nome, ampliará o número de beneficiados e o valor dos repasses vai aumentar.

A nova rotina do Ministério da Cidadania nem de longe lembra o início do governo. Em 2019, uma das primeiras ações da pasta foi liderar uma cruzada contra drogas como a maconha. Na época, Osmar Terra, o então ministro, chegou a dizer que a fome no Brasil não era “sistêmica”. A pandemia mudou completamente essa visão. “Começamos a ter a percepção de aumento da popularidade do presidente quando começou o pagamento do auxílio emergencial. A partir daí, muita gente no governo que torcia o nariz para esses programas de distribuição de renda mudou de opinião”, disse, sob reserva, um ministro a VEJA. Não por acaso, essa metamorfose começou com a aproximação do governo com os partidos do Centrão. O comando da pasta foi uma das condições que as lideranças do grupo colocaram para formalizar a parceria, consolidada na última quarta-feira com a posse do senador Ciro Nogueira como chefe da Casa Civil. Em seu discurso, Nogueira tratou do tema. “Foram quase dez anos de Bolsa Família em auxílio emergencial em um único ano para que a fome e a miséria não exterminassem os brasileiros”, disse.

Há seis meses no comando do Cidadania, o deputado federal licenciado João Roma caiu rapidamente nas graças do presidente. Além da agenda intensa em Brasília, o ministro reserva um dia da semana para viagens pelo interior, onde acompanha a distribuição de cestas básicas e a entrega de ônibus comunitários a municípios. Com um colete pardo estampado com seu nome, o cargo que ocupa e uma bandeira do Brasil, não raro Roma faz videochamadas com o chefe diante da população e mais de uma vez já recebeu bênçãos públicas de Bolsonaro e dos filhos para concorrer, no próximo ano, ao governo da Bahia. De discreto chefe de gabinete do então prefeito de Salvador, ACM Neto (DEM), com quem rompeu ao assumir o governo, Roma tornou-se a voz do bolsonarismo entre os baianos.

O projeto de reformulação do Bolsa Família, que prevê a unificação de todos os programas sociais num único, começou a ganhar fôlego depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, em abril, que o Congresso teria de aprovar, no prazo de um ano, uma lei que regulamentasse o pagamento de uma renda mínima à população pobre, mas ganhou tração com a proximidade do processo eleitoral, a necessidade de o presidente resgatar a popularidade perdida durante a pandemia e também cabalar votos tradicionalmente direcionados a candidatos do PT. O problema, por enquanto, é que o governo ainda não sabe de onde vai tirar 56 bilhões de reais para custear o novo programa, o que têm provocado uma série de divergências, especialmente entre a equipe econômica. Várias hipóteses já foram estudas, mas não há consenso. O ministro da Economia, Paulo Guedes, já pensou na criação de um novo imposto, já propôs usar o caixa de futuras privatizações para bancar o programa e, nos últimos dias, levantou a hipótese de o dinheiro necessário ser obtido com o parcelamento das dívidas judiciais da União. A declaração provocou ruídos no mercado, que interpretou a ideia como a confissão de um calote federal, e no Ministério da Cidadania, pego de surpresa com um anúncio considerado inábil politicamente. Mais do que cálculos sobre a origem dos recursos para o novo programa social, o fato é que a política profissional passou a dar as cartas do governo. “Estou transformando um Fusca num bugue. Quanto vou colocar de gasolina no tanque desse bugue? Quando chegar no Posto Ipiranga, vou saber”, brinca João Roma, que, de ilustre desconhecido, já apareceu na terceira colocação em uma recente pesquisa de intenção de votos para o governo da Bahia.

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