‘Ninguém está na Cracolândia por um marmitex’, diz padre Júlio

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Foto: Reprodução

Conhecido por suas ações em prol dos direitos humanos, principalmente em relação à população de rua em São Paulo, o padre Júlio Lancellotti foi criticado pela deputada estadual Janaina Paschoal (PSL-SP) por doar refeições a pessoas que vivem na região conhecida como Cracolândia, em São Paulo.

Em uma publicação no Twitter, a parlamentar disse que ações como as feitas pelo padre e outras ONGs incentivam que essas pessoas continuem nas ruas.

A deputada disse que a “distribuição de alimentos na Cracolândia só ajuda o crime” e que “o tema precisa ser debatido com honestidade”. Ainda na mesma rede social, ela afirmou que “as pessoas que moram e trabalham naquela região já não aguentam mais”.

“O padre e os voluntários ajudariam se convencessem seus assistidos a se tratarem e irem para os abrigos”, afirmou Paschoal.

 

Em entrevista à BBC News Brasil nesta segunda-feira (09/08), o padre Júlio Lancellotti afirmou que não são as doações que mantêm as pessoas na Cracolândia, mas sim “a corrupção e a atuação dos poderes” que permitem a chegada e comércio de drogas na região.

“(Doar) não incentiva porque ninguém está lá por causa de um marmitex. As pessoas estão lá por questões sociais, econômicas e de ausência de ações de proteção. Não é por causa de um marmitex que a pessoa vai se submeter a ser torturado, a ser maltratado, a passar sede, a ser alvejado com balas de borracha e bombas de efeito moral”, disse o padre.

Lancellotti disse que o ponto de vista da deputada é defendido por boa parte da população do país. Ele disse que o fato de Janaina ter sido a deputada estadual mais votada da história em São Paulo, com mais de 2 milhões de votos, demonstra um apoio massivo às ideias dela.

“São expressões muito simplistas e que tem representatividade. Não acredito que só a senhora deputada pense assim. Ela representa uma parcela considerável. Ela é uma das deputadas mais votadas da história do Brasil. O que mantém as pessoas lá (na Cracolândia) é a corrupção. Aquilo funciona porque é um negócio mantido pela corrupção”, afirmou Lancellotti.

Após a publicação da deputada nas redes sociais, o padre, da Pastoral do Povo de Rua, disse que o número de doações para sua Paróquia de São Miguel Arcanjo aumentou.

Por outro lado, algumas pessoas usaram o Twitter para reforçar o argumento de Janaina e afirmar que a disponibilidade de três refeições, cobertores e locais para dormir torna mais confortável a vida nas ruas e incentiva pessoas a permanecer nessa situação.

Questionado sobre o que diria para essas pessoas, o padre afirmou que as convidaria para viver nas ruas.

“Eu diria que viessem ficar uma semana na rua recebendo café, almoço, janta, cobertor e roupas pra ver se elas gostariam de ficar depois de uma semana. Elas vão ter café da manhã, almoço, janta, roupa e todo o conforto. Vamos ver se elas vão se convencer de que o conforto é suficiente para que elas fiquem mais uma semana.”

O padre Júlio Lancellotti também rebateu a alegação da deputada de que os padres e voluntários não convencem usuários de drogas a procurarem tratamento ou um abrigo. Ele disse que ações semelhantes são feitas por diversos outros grupos, religiosos e não-religiosos, que já tiraram milhares de pessoas que viviam na região.

“São várias ações de várias igrejas. Se você procurar, centenas de pessoas foram acolhidas pela igreja Bola de Neve. Se você for procurar na Igreja Batista Cristolândia, centenas de pessoas foram acolhidas. Se você vai na igreja católica no Belém (zona leste), tem mais de dois mil acolhidos na missão Belém. Assim como dezenas são acolhidos na Fraternidade Assistencial Casa Caminho, na Aliança de Misericórdia. Se essas ações das igreja não tivessem acolhendo, hoje nós teríamos uma Cracolândia de três a cinco vezes maior”, afirmou o padre ao convidar a deputada para conhecer esses projetos sociais.

Questionada sobre as declarações de Júlio Lancellotti à BBC News Brasil e em resposta ao convite dele para conhecer os projetos sociais que atuam na cracolândia, Janaina Paschoal disse que o padre é incoerente pela maneira como age nas redes sociais.”Penso ser um convite incoerente com o ato de quem segue fazendo publicações depreciativas em suas redes. Eu só externei um ponto de vista. Ele como religioso deveria ser mais humilde”, afirmou a deputada à BBC.

O debate entre a deputada e o padre começou após Júlio Lancellotti dizer que a Polícia Militar passou a fazer um cerco na região da Cracolândia para impedir o acesso de ONGs e grupos sociais que doam refeições na região.

O padre disse à reportagem que a restrição de acesso à região conhecida por concentrar usuários de crack é parte de uma operação da Polícia Militar e da Guarda Civil Metropolitana para que as doações não cheguem à população de rua.

“Eles (polícia) dizem que é porque tem alguns traficantes ali. Grandes traficantes não estão ali, e chegaram a dizer que eram dois. Se eles sabem que eram dois, então por que eles punem a população toda? Eles fazem o quê? Eles fecham a região com as viaturas”, afirmou.

Para conseguir fazer as doações, o padre explicou que procura brechas nas barreiras policiais e ruas que não estejam bloqueadas para acessar a cracolândia. Quando isso não é possível, a distribuição de marmitex é feita nas ruas próximas à região.

Procurada, a Secretaria da Segurança Pública informou por meio de nota que “diferentemente do apontado, não há qualquer restrição às ações sociais, de saúde ou humanitárias na região da Nova Luz. Ao contrário, sempre que necessário, as forças de segurança apoiam os agentes de diferentes áreas que atuam no local.

Em situações de quebra da ordem ou quando acionada pela Guarda Civil Metropolitana (GCM), como no último sábado (7), por volta das 15h45, a Polícia Militar atuou no entorno da área, interrompendo temporariamente o trânsito de veículos e o fluxo de pedestres, visando a segurança de todos e a preservação do patrimônio.”

A secretaria afirmou ainda que “a ação do último sábado (7/8) durou pouco mais do que 10 minutos e foi encerrada sem o registro de ocorrências”. A pasta reforçou que, até o momento, “não há qualquer registro de ocorrência contra os agentes, mas as Corregedorias das instituições estão à disposição para receber, consignar e apurar toda e qualquer denúncia em desfavor a eles”.

Pessoas ligadas ao policiamento na região disseram à reportagem, sob a condição de anonimato, que a região da Cracolândia é fechada diariamente por policiais militares para evitar confrontos durante as limpezas feitas pela prefeitura.

“A polícia fecha para evitar arrastões e tumultos, como já ocorreram. É para a segurança da população e acontece há tempos”, disse.

Essas fontes explicam que esse “reforço na segurança” é feito porque muitos usuários de drogas se irritam com a presença das equipes de limpeza, pois elas usam caminhões-pipa para lavar as ruas e, muitas vezes, recolhem objetos, como cobertores, papelões e lonas.

BBC 

 

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