Governo Bolsonaro pode sofrer “efeito Macri” na reta final

Todos os posts, Últimas notícias

Foto: Marcos Corrêa / PR

Juro alto e inflação persistente, desemprego, pobreza e uma enorme incerteza sobre a capacidade do governo em solucionar os problemas. O cenário econômico dos meses anteriores à eleição na Argentina, em 2019, que coroou a derrota do liberal Mauricio Macri, passou a fazer parte das projeções para o Brasil de 2022 desde que ficou claro que o governo de Jair Bolsonaro e Paulo Guedes furaria o teto de gastos.

Para cinco economistas-chefe de bancos e gestoras de recursos ouvidos pela equipe da coluna nos últimos dias, ao decidir remover a principal regra fiscal do país para gastar mais, Bolsonaro deu início a uma guinada populista com fins eleitorais a la Macri.

Isso não significa que o Brasil vá quebrar como a Argentina em tão pouco tempo, mas indica que há uma tendência de deterioração fiscal que pode acabar em descontrole, como no caso argentino, e com a consequente ruína política do presidente.

Na última semana, o governo de Jair Bolsonaro anunciou que abriria uma brecha no limite estabelecido pela Constituição para os gastos públicos – que Paulo Guedes definiu como uma licença para gastar.

Rapidamente, a previsão oficial de estouro no teto de R$ 30 bilhões se transformou em cálculo extraoficial de R$ 83 bilhões. E para a Instituição Fiscal Independente (IFI), vinculada ao Senado, o rombo pode chegar a R$ 94 bilhões.

Essa quebra na regra constitucional que estabelece que o governo não pode aumentar seus gastos além da inflação foi a principal razão dos principais secretários de Guedes deixarem a equipe econômica. Para os investidores, o recado foi claro: com o teto arrombado, o céu é o limite para o aumento dos gastos – especialmente em ano eleitoral.

Os investidores começaram a fugir de ativos brasileiros, fazendo a cotação do dólar subir e a Bolsa despencar. A entrevista-pronunciamento de Paulo Guedes e Jair Bolsonaro na tarde de sexta-feira, demonstrando que o ministro não deixará o governo, até amenizou o pânico momentâneo, mas não diminuiu a apreensão com o que vai acontecer no médio e no longo prazo.

Para economistas que decidem o destino de bilhões de reais em investimento, o fato de que Guedes confirmou o estouro do teto e o tratou como algo menor aponta para uma trajetória de descontrole da dívida pública.

“A resposta de Guedes aponta na direção de um risco de perda de controle. A negação do problema da dinâmica da dívida, como o Macri negou durante muito tempo, leva ao risco de colapso”, afirma Carlos Woelz, sócio-fundador da Kapitalo. “Não acho que a piora atual seja o golpe de misericórdia, ainda temos muitas chances. Mas o Macri também teve muitas chances e o que o levou para o buraco foi desperdiçar todas elas”, explica Woelz.

O fato de a ala política estar ditando as prioridades também preocupa os economistas, porque está claro que o governo está preferindo aumentar gastos a cortar despesas eleitoreiras, como as emendas parlamentares do chamado orçamento secreto (distribuídas sem critério claro e sem transparência quanto ao seu destino).

Embora ninguém se arrisque a fazer projeções econômicas exatas para agosto e setembro de 2022, é consenso que os juros vão ter que subir muito mais – talvez o dobro do atual patamar – para conter a inflação alta e que ganhará velocidade na esteira de gastos do governo sem controle. “O que Bolsonaro está fazendo é contrair rapidamente as projeções de crescimento da economia para o ano que vem, reduzindo a probabilidade de se reeleger, ou melhor, garantindo a sua derrota”, afirma o economista-chefe de um dos maiores fundos de investimento do país.

Há um mês, bem antes da virada na política fiscal do governo, os economistas já previam que o Brasil entraria em desaceleração em 2022. As projeções falavam em um crescimento abaixo de 1%, bem distante da imagem do foguete decolando que Guedes gosta de usar em entrevistas e também em reuniões internas do governo e que irrita seus colegas em Brasília. Agora, a palavra mais corrente é estagnação.

Setores que empregam muita gente e que cresceram na crise, apesar da pandemia, como a construção civil, correm o risco de minguar com o maior endividamento das famílias e a restrição de crédito pelo setor bancário. É a receita certa para menos consumo e menos investimentos.

Por isso, os economistas estão descrentes de uma recuperação da popularidade de Bolsonaro. Acham que, para financiar uma arriscada incursão por aprovação num eleitorado que escolheu Lula e o PT em 2018 – o Nordeste brasileiro – o presidente arrisca perder o que resta de apoio no eleitorado que votou nele, do Sul e Sudeste.

Entre os aliados de Paulo Guedes, a ala política que pressionou pela quebra no teto de gastos ganhou o apelido de “coligação Nordeste-Sul”, por contar com o apoio entusiasmado do gaúcho Onyx Lorenzoni. “O que ele está fazendo talvez seja muito bom para o Ciro Nogueira ou para outros políticos do Nordeste. Mas para a economia do Sul e do Sudeste é um desastre”, avalia um desses analistas.

Hoje, o Brasil está em situação bem melhor do que a Argentina estava um ano antes das eleições em que Macri perdeu para Alberto Fernández. Não só o nosso déficit primário é menor do que o argentino, como a dívida do país vizinho é majoritariamente em dólar e a brasileira, em reais. Isso nos deixa em situação mais confortável e, segundo os economistas ouvidos pela equipe da coluna, pode fazer com que a crise seja mais contornável.

A solução mais ortodoxa seria aumentar impostos, promover cortes em subsídios, emendas parlamentares e em outros benefícios que não os sociais e, com isso, ajustar as contas. Mas isso, ficou claro, os ministros políticos não vão permitir.

O Globo

 

Assinatura
CARTA AO LEITOR

O Blog da Cidadania é um dos mais antigos blogs políticos do país. Fundado em março de 2005, este espaço acolheu grandes lutas contra os grupos de mídia e chegou a ser alvo dos golpistas de 2016, ou do braço armado deles, o juiz Sergio Moro e a Operação Lava jato.

No alvorecer de 2017, o blogueiro Eduardo Guimarães foi alvo de operação da Polícia Federal não por ter cometido qualquer tipo de crime, mas por ter feito jornalismo publicando neste Blog matéria sobre a 24a fase da Operação Lava Jato, que focava no ex-presidente Lula.

O Blog da Cidadania representou contra grandes grupos de mídia na Justiça e no Ministério Público por práticas abusivas contra o consumidor, representou contra autoridades do judiciário e do Legislativo, como o ministro Gilmar Mendes, o juiz Sergio Moro e o ex-deputado Eduardo Cunha.

O trabalho do Blog da Cidadania sempre foi feito às expensas do editor da página, Eduardo Guimarães. Porém, com a perseguição que o blogueiro sofreu não tem mais como custear o Blog, o qual, agora, dependerá de você para continuar existindo. Apoie financeiramente o Blog

FORMAS DE DOAÇÃO

1 – Para fazer um depósito via PIX, a chave é edu.guim@uol.com.br

2 – Abaixo, duas opções de contribuição via cartão de crédito. Na primeira, você contribui mensalmente com o valor que quiser; na segunda opção, você pode contribuir uma só vez também com o valor que quiser. Clique na frase escrita em vermelho (abaixo) Doação Mensal ou na frase em vermelho (abaixo) Doação Única

DOAÇÃO MENSAL – CLIQUE NO LINK ABAIXO
https://www.mercadopago.com.br/subscriptions/checkout?preapproval_plan_id=282c035437934f48bb0e0e40940950bf

DOAÇÃO ÚNICA – CLIQUE NO LINK ABAIXO
https://www.mercadopago.com.br/subscriptions/checkout?preapproval_plan_id=282c035437934f48bb0e0e40940950bf