Na pandemia, ricos aumentaram poupança e pobres diminuíram

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Os fluxos de recursos para a poupança contam, de maneira assustadoramente certeira, a história de como a desigualdade tem pautado a crise econômica trazida pela pandemia. Nos últimos meses, os resgates líquidos – quando se comparam os aportes e saques – se tornaram uma constante para a tradicional caderneta, conforme dados do Banco Central (BC).

Se em 2020 a poupança exibiu um resultado de gala, com mais de R$ 120 bilhões em captação líquida, neste ano a situação virou completamente. Em 2021, até 8 de outubro, os números do BC indicam um saldo de resgates líquidos de R$ 20,6 bilhões. Mas esse quadro só conta metade da história.

Quando olhamos os dados do Fundo Garantidor de Créditos (FGC), que segmenta os recursos por volume depositado nas contas do gênero, fica a percepção de que os saques têm sido muito mais constantes e profundos para aqueles com menos dinheiro.

Segundo o economista especializado em administração de investimentos Marcelo d’Agosto, que analisou os número do fundo, “parece que quem tem dinheiro está mais rico e quem tem pouco está mais pobre”.

O aumento de resgates em 2021 se relaciona a um conjunto de condições que afetou principalmente as classes de menor renda. A inflação elevada e a alta dos juros, por exemplo, impactam diretamente o orçamento das famílias, porque tornam itens de consumo básico mais caros e pesam sobre o endividamento. “Nos períodos em que as pessoas se apertam, se identificam os movimentos de resgate, porque precisam equilibrar as finanças pessoais”, explica o professor de finanças Ricardo Rocha, do Insper. “Para alguns setores a pandemia é muito dramática, porque só está recuperando emprego quem está mais qualificado”, acrescenta.

Os números do FGC sugerem que, em grande medida, o aumento da arrecadação da caderneta no ano passado se relaciona com a distribuição do auxílio emergencial. A faixa de contas com valores entre R$ 0,01 e R$ 5 mil teve o maior volume de depósitos líquidos na poupança entre todas as faixas em abril e maio de 2020, o que coincide com o início do pagamento do benefício às famílias mais vulneráveis.

Naqueles meses, os aportes líquidos da base da pirâmide da caderneta alcançaram, respectivamente, R$ 11,2 bilhões e R$ 13,2 bilhões. Para efeito de comparação, o grupo mais rico, de contas com mais de R$ 100 mil, teve captações de R$ 9,6 bilhões e R$ 9,2 bilhões nos mesmos meses.

Entre setembro e dezembro, o governo reduziu o auxílio pela metade, de R$ 600 iniciais para R$ 300. Nesse intervalo, houve uma oscilação no volume captado nas faixas de clientes com menos recursos. Em setembro, houve aporte líquido de R$ 1,2 bilhão nas contas com R$ 0,01 a R$ 5 mil. Em outubro e novembro, porém, o resultado entre aplicações e saques foram resgates líquidos de R$ 3,3 bilhões e R$ 6 bilhões. No último mês de 2020, no entanto, o volume voltou a ficar positivo, em R$ 2,8 bilhões.

Entre janeiro de 2021 e março deste ano, o auxílio foi encerrado. O benefício voltaria a ser pago parcialmente a partir de abril. Como resultado, houve uma reversão de fluxo no primeiro trimestre, com saques líquidos de R$ 12,8 bilhões, R$ 1,37 bilhão e R$ 5,17 bilhões, entre janeiro e março, na faixa de contas com valores mais baixos. No segundo trimestre, os aportes líquidos voltaram em volumes menores que os vistos em 2020. De abril a junho, todos os meses tiveram captação positiva, somando entradas líquidas de cerca de R$ 4 bilhões nas contas até R$ 5 mil.

De outro lado, a faixa com mais recursos, de cadernetas com saldo acima de R$ 100 mil, registrou aplicações líquidas positivas em todos os meses entre janeiro de 2020 e agosto de 2021, que é o intervalo coberto pelos dados do FGC. Esse grupo foi responsável por uma alocação de R$ 102 bilhões para a caderneta no período, enquanto a base da pirâmide respondeu por um acréscimo líquido no saldo de R$ 9 bilhões no mesmo intervalo.

“Houve um impulso no ano passado por conta do auxílio emergencial e da abertura de contas digitais [na classe de renda mais baixa] e parte desses recursos foi para a poupança”, afirma a coordenadora do Centro de Estudos em Finanças da FGV (GVcef) e vice-presidente da Sociedade Brasileira de Finanças (SBFin), Claudia Yoshinaga. “O aumento de juros [promovido pelo BC] aumentaria o interesse pela aplicação [a poupança rende 70% da taxa básica Selic], mas houve uma alta da inflação muito maior”, avalia a especialista.

De acordo com Yoshinaga, uma pesquisa do GVcef realizada na pandemia, com pessoas em todo o país, mostrou que a população com renda familiar menor teve um aumento muito forte das despesas e queda nas receitas. Por outro lado, para a parcela da população com mais recursos, a pandemia teve um efeito contrário: houve redução de despesas.

“Muitas pessoas com salários mais baixos e menor qualificação perderam emprego e tiveram de raspar seus investimentos, mas a parcela da população com renda mais elevada não perdeu o emprego e viu seus custos mensais caírem”, afirma. “Quem tem renda baixa teve mais gastos com luz, internet, alimentação e fez mais dívidas. Mas, na classe média alta, ainda que tenham tido aumento marginal de custo com energia e contas da casa, as pessoas economizaram porque não puderam viajar, não gastaram com alimentação fora de casa, com entretenimento e, com isso, puderam até investir mais”, diz.

“Parece-me que a dinâmica de saques da poupança reflete um cenário em que quem tem renda mais alta está migrando para opções mais rentáveis, mas quem tem renda menor está mais vulnerável e tem sacado para cobrir as despesas”, avalia Rocha, do Insper. Segundo a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), os fundos de renda fixa, de perfil mais conservador, têm registrado melhora significativa na captação líquida em 2021, na esteira da alta dos juros promovida pelo BC. Em agosto, o tipo renda fixa captou no agregado R$ 45 bilhões, indica a entidade.

Valor Econômico

 

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