Novas regras eleitorais privilegiaram partidos de esquerda

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Foto: Foto: Lucas Martins

Se já estivessem valendo as regras aprovadas no Congresso que criam incentivos ao voto em mulheres e negros, seriam mais beneficiados partidos à esquerda e os dois que já lideram a distribuição de verbas dos fundos partidário e eleitoral.

A reforma eleitoral, aprovada na semana passada no Congresso, prevê que, para efeitos de cálculo do rateio desses fundos, os votos em mulheres e em negros para a Câmara dos Deputados valerão por dois. A nova norma também estabelece que a contagem em dobro será aplicada uma única vez —por exemplo, no caso de voto recebido por uma mulher negra.

Levantamento feito pela Folha com base na votação para deputado federal em 2018 aponta que PT e PSL, as duas maiores siglas da Casa, poderiam receber, respectivamente, mais R$ 4,6 milhões e R$ 3,1 milhões do fundo partidário ao ano se os critérios atuais já incluíssem os incentivos aprovados.

Esse cálculo é apenas uma simulação, já que a lei aprovada agora estabelece que o novo padrão só vai vigorar a partir da votação de 2022, quando outra legislatura será eleita e outras siglas poderão ser beneficiadas, a depender do perfil de seus mais votados.

O PSL, por exemplo, se esfacelou em disputa interna envolvendo apoiadores do presidente Jair Bolsonaro e dificilmente repetirá a trajetória de 2018. Há três anos, Joice Hasselmann foi a deputada federal mais votada da história, com mais de 1 milhão de votos pelo partido em São Paulo. Posteriormente, ela rompeu com Bolsonaro e hoje defende seu afastamento da Presidência da República.

O DEM hoje negocia fusão com o PSL.

Pelos novos critérios que “duplicam votos” para o rateio dos fundos, duas siglas de esquerda também veriam sua fatia de verba pública aumentar significativamente, caso isso fosse aplicado com base na votação divulgada em 2018.

Os números daquele ano podem ser retotalizados de acordo com o julgamento de recursos contra candidaturas na Justiça Eleitoral dos estados.

O PSOL pularia de R$ 29,2 milhões para R$ 33,9 milhões anuais. O PC do B passaria de R$ 19,7 milhões para R$ 24 milhões. Os cálculos, feitos de maneira aproximada, se baseiam no valor projetado para o fundo partidário neste ano, de quase R$ 980 milhões.

Já na lista de quem sofreria prejuízos estariam legendas tradicionais da política, de centro e centro-direita.

O PSDB, terceiro no ranking de votação para deputado federal em números absolutos, seria um dos com perdas financeiras na nova regra. O PP teria o maior recuo projetado, com quase R$ 5 milhões a menos.

Também receberiam menos o DEM e o MDB.

Os dois fundos compostos por verbas públicas são as principais ferramentas de financiamento da política desde que as doações de empresas foram extintas, em 2015.

O fundo partidário é pago mensalmente, enquanto o eleitoral, apelidado de “fundão”, tem sido distribuído somente nos anos de campanha.

O total de votos obtidos para a Câmara dos Deputados, porém, não é o principal critério para distribuir o fundão. A votação total na Casa é usada para definir 35% desses recursos.

Uma fatia de 48% é definida com base no tamanho das bancadas na Câmara. Há ainda uma faixa de 2% dividida igualmente entre todos os partidos registrados e outra, de 15%, calculada com base nas bancadas no Senado.

No caso do fundo partidário, o peso dos votos absolutos para deputado federal é maior: 95% do rateio é calculado com base nesse critério, e 5% são repartidos em porções iguais entre 23 legendas.

Ficam de fora desse rateio siglas que não atingiram a cláusula de desempenho na eleição de três anos atrás.

Esse recurso deve ser destinado à manutenção dos partidos, como na abertura de sedes e escritórios e pagamento de pessoal, além de promover atividades de formação política, por meio de fundações partidárias.

A verba partidária pública é paga desde os anos 1960, mas foi bastante ampliada na década passada na esteira da extinção das doações empresariais aos partidos.

O valor do fundo eleitoral para o próximo ano ainda não está decidido. O governo Jair Bolsonaro enviou ao Congresso projeto de lei orçamentária para 2022 estimando R$ 2,128 bilhões para essa finalidade.

A legislação já obriga que os partidos lancem ao menos 30% de candidaturas femininas nas eleições para deputados e vereadores. Em 2018, esse percentual foi cumprido na eleição para a Câmara, mas apenas 15% dos eleitos eram mulheres.

Em relação a pretos e pardos, eles somaram 40% dos inscritos para a disputa de uma vaga na Casa, mas representaram 24% dos que se elegeram há três anos.

A nova regra do “voto dobrado” foi elogiada pelo presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), ministro Luís Roberto Barroso, em sessão na corte na semana passada. Ele disse que louva a medida e que é uma importante ação afirmativa para o país.

Barroso foi um dos defensores, no ano passado, de outra medida de incentivo a esses segmentos da população, quando a Justiça determinou na eleição municipal que os partidos deveriam dividir o dinheiro público de campanha de forma proporcional ao número de candidatos negros e brancos que lançassem.

Cabe ao político declarar a cor da pele ao fazer seu registro de candidato.

O promotor de Justiça Rodrigo Zilio, que hoje é membro auxiliar da Procuradoria-Geral Eleitoral, considera as iniciativas válidas e entende que elas irão “abrir um grande debate sobre eventual autodeclaração que não corresponda à realidade”.

Dirigentes partidários podem questionar siglas adversárias sobre candidatos que se inscreveram como negros.

“A princípio o [candidato] negro é o que se autodeclara. E vai haver discussão sobre se pode a Justiça Eleitoral dizer que quem se autodeclarou não é”, diz o promotor.

O professor do Departamento de Educação da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) Cleber Vieira diz que o combate às fraudes no processo de identificação precisa ser prioritário nas eleições.

Presidente da Associação Brasileira de Pesquisadores Negros, ele é integrante de um grupo de trabalho junto ao TSE que discute propostas de modernização da legislação eleitoral a serem levadas ao Congresso Nacional.

“Os tribunais eleitorais precisam investir bastante no campo formativo, nas pessoas que trabalham na ponta, nos cartórios, em cada município. É preciso um letramento racial na Justiça Eleitoral brasileira, nos partidos políticos. E que se crie mecanismos de responsabilização no cumprimento.”

Para ele, as medidas aprovadas no Congresso são um “avanço, ainda que insuficiente”, porque sozinhas não dão conta de superar todas as questões ligadas a um histórico de exclusão.

Folha de S. Paulo

 

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