Comunidades cariocas relatam império do terror das polícias nos morros

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Foto: Jose Lucena/Futura Press/Folhapress

“Cuidado com o ‘caveirão'”, disse um menino de 3 anos de idade ao ouvir a reportagem pedir informações sobre o local onde ao menos oito corpos foram encontrados na região da Palmeira, no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo.

Na região onde crianças já se acostumaram com o veículo blindado do Bope (Batalhão de Operações Policiais Especiais), moradores de todas as idades denunciam há meses a escalada de violência.

Na manhã de ontem, dois dos chamados “caveirões” circulavam pela favela —depois de um fim de semana intenso de ocupação e tiroteios. No momento em que o menino alertou a reportagem, entretanto, não havia mais veículos da Polícia Militar na comunidade. Ainda assim, o receio da criança já virou tema no meio político.

Há meses, a Faferj (Federação das Associações de Favelas do Rio de Janeiro) fala sobre a violência policial na comunidade. As denúncias levaram a entidade a conseguir um encontro com representantes do governo do estado no início de novembro.

“Nos últimos meses, organizações de direitos humanos têm acompanhado denúncias na comunidade. A Faferj apresentou demandas com o governo, que se comprometeu a resolvê-las. Naquela reunião, já denunciamos que a violência policial estava grande na comunidade e as lideranças pediam para o governo entrar na comunidade com projetos sociais e obras de urbanização”, diz David Gomes, diretor da federação.

A tensão relatada pelos moradores e observada pelas entidades de direitos humanos culminou nas mortes registradas na manhã de segunda (22), quando cidadãos comuns retiraram corpos do mangue que fica ao fim da comunidade.

Em uma área de mata fechada, permeada por muitos barracos e construções abandonadas, ao menos 11 pessoas foram encontradas mortas, informou a Comissão de Direitos Humanos da OAB/RJ, com base em relatos de moradores que acompanharam a retirada.

A Polícia Militar afirma que reagiu a um confronto. A Polícia Civil, que investiga o caso, diz que há, na verdade, oito mortos e que ao menos cinco deles tinham “anotações criminais”.

Moradores contradizem as versões. Eles afirmam que a truculência da PM dentro da favela se intensificou após a morte do sargento Leandro Rumbelsperger da Silva, de 38 anos, no sábado (20). Na ocasião, um grupo de policiais teria sido atingido por criminosos, que balearam Silva. Com isso, grupos de policiais teriam entrado na favela por vingança —é o que dizem os moradores, desde os motoristas de aplicativo até os vizinhos do mangue.

A versão oficial aponta para uma operação em busca do responsável pela morte do sargento.

O porta-voz da PM, o tenente-coronel Ivan Blaz, disse ao UOL que houve uma ocupação na quinta-feira (18) na região e foram registrados confrontos durante três dias. De acordo com ele, a operação foi informada ao Ministério Público e tinha como objetivo combater a criminalidade.

“Foi uma ocupação planejada, algo necessário para impedir que a sociedade continue sendo vítima. Esses criminosos atuam muito na rodovia [BR 101]”, afirmou o porta-voz.

Durante a ação, suspeitos de serem traficantes se refugiaram na área da mata e, após cessarem os supostos confrontos, não foi feita uma varredura na região. “É um confronto complexo, não dá para fazer varredura após o confronto por conta da complexidade do local. Não sabemos quem mais está ali dentro. Então, quando os confrontos cessam, as equipes deixam o local”, afirma Blaz.

Diante do ocorrido, alguns se mobilizaram para tirar os corpos. “A gente viu lá, não ia tirar?”, diz um deles. “É questão de humanidade”, explica outra. Todos falaram sob a condição de anonimato.

Apesar da mobilização da manhã de segunda, o que a reportagem observou na tarde do mesmo dia foi um clima de medo. Falar com repórteres, nem pensar. Aceitar a ajuda da Defensoria Pública, da própria Faferj e da Comissão de Direitos Humanos da OAB/RJ, somente depois de muita explicação. O receio, compreensível, era de uma retaliação por parte da Polícia Militar.

Por volta das 15h, mais pessoas já circulavam nas ruas. Mas diferentemente de um dia comum por ali, segundo moradores, imperava o silêncio. Não havia música, barulho de conversa e somente um grupo de crianças brincava na rua. Nas ruas enlameadas e esburacadas, os únicos veículos que transitavam eram os mototáxis, que dividiam espaço com porcos, galinhas e cachorros.

No imenso campo de futebol da comunidade, nenhuma movimentação. A poucos metros dali, o Piscina’s Bar continuava fechado, como há meses. A única exceção, por denúncia dos moradores, foi a festinha promovida pelos policiais no fim de semana —sem autorização dos donos. “Obrigada pela recepção”, deixaram grafado na parede.

Beberam uísque, cerveja e cozinharam. Deixaram para trás objetos quebrados, uma Bíblia e sinais de uso da piscina e de cigarro. “Feliz Natal”, disseram aos moradores vizinhos quando saíram do local e entraram nos blindados que barravam a entrada.

O MP-RJ (Ministério Público do Rio de Janeiro) abriu uma investigação para apurar as circunstâncias que provocaram as mortes. A 2ª Promotoria de Justiça de Investigação Penal Especializada do Núcleo Niterói e São Gonçalo, instaurou um PIC (Procedimento Investigatório Criminal) próprio para investigar a operação.”O PIC também vai analisar eventuais violações a direitos praticados quando da execução da operação”, diz o MP em nota.

Uol 

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