Processo da OAB contra Tacla Duran é suspeito

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Foto: Jaime Casal – 12.ago.2017/El Pais

O processo da OAB de São Paulo que pode levar à cassação do registro de advogado de Rodrigo Tacla Duran, que atuou para a Odebrecht e se tornou alvo da Lava Jato, virou motivo de questionamentos após um advogado contratado pela empreiteira se tornar relator do caso.

Tacla Duran trabalhou de 2011 a 2016 para a Odebrecht e tem sido apontado pelo Ministério Público Federal como operador financeiro de esquemas da empresa. Desde então, ele vem fazendo uma série de acusações.

Ele disse, por exemplo, que um advogado trabalhista amigo do ex-juiz Sergio Moro intermediou negociações paralelas com os procuradores em troca de propina, com o objetivo de abrandar pena e multa dele em um eventual acordo de delação, que nunca foi fechado.

Afirmou ainda que os sistemas da Odebrecht foram adulterados antes de serem entregues ao Ministério Público.

Nascido no Brasil, com dupla cidadania por ser filho de espanhol, Tacla Duran vive na Espanha desde 2016, país que rejeitou pedido de extradição brasileiro. A Lava Jato o tratava como foragido, mas seu nome foi retirado da lista da Interpol.

Após uma entrevista à Folha em agosto de 2017, a seção paulista da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) abriu um processo disciplinar para apurar se ele atuou de forma incompatível com a advocacia e revelou sigilo profissional do seu cliente.

Em todo o processo sigiloso, ao qual a Folha teve acesso, Tacla Duran argumenta que sofria acusações da empreiteira e que concedeu a entrevista para se defender.

Mas foram as movimentações mais recentes do processo disciplinar que viraram alvo de disputa.

Em dezembro de 2019, a então relatora do processo, conselheira Eryca Moreira Tesser, opinou contra a exclusão de Tacla Duran da OAB. Disse que ele “trouxe aos autos informações e provas relevantes” em sua defesa.

Contudo, em abril deste ano, o conselheiro Carlos Kauffmann apresentou um voto divergente da então relatora. Ele era favorável à exclusão de Tacla Duran dos quadros da OAB-SP.

“Longe de exercer a advocacia nos casos apontados, Rodrigo Tacla Duran era um dos grandes responsáveis pela movimentação de recursos ilícitos que transitaram no exterior e foram utilizados para pagamentos indevidos realizados pela Odebrecht a agentes públicos nacionais e estrangeiros”, disse, em seu voto.

Além de conselheiro, Kauffmann é o atual presidente do Tribunal de Ética da OAB-SP e também advoga para três delatores da Odebrecht. Para isso, ele é contratado e pago pela própria empreiteira.

Há menção, inclusive, a Tacla Duran na colaboração de um dos clientes de Kauffmann. Esses são os pontos vistos como conflituosos.

O caso foi levado a votação pelo conselho da OAB-SP ainda em abril. Segundo ata do julgamento, o voto de Kauffmann —a favor da cassação— acabou vencendo.

Como não havia quórum (quantidade de membros) suficiente para que o caso fosse para frente, o processo foi encaminhado para arquivamento –é necessário que ao menos dois terços do conselho esteja nesse tipo de votação.

Contudo esse arquivamento não ocorreu devido a uma intervenção do próprio presidente da OAB-SP, Caio Augusto Silva dos Santos. Ele apresentou um recurso no qual questionou eventuais contradições no voto da conselheira que havia decidido pela manutenção de Tacla Duran na OAB.

Esse recurso manteve o caso em andamento e obrigará o conselho a fazer uma nova votação. Mais do que isso: como foi apontado que o voto de Kauffmann venceu a votação, ele passou a ser o relator do caso.

Paralelamente, a defesa de Tacla Duran apresentou um pedido de suspeição de Kauffmann no caso, pelas conexões que o advogado tem com a Odebrecht.

“O desfecho do mencionado processo [disciplinar] implica diretamente na manutenção dos interesses dos seus representados e da Odebrecht, que o contratou”, diz Tacla Duran, no pedido de suspeição.

Ele argumenta que as informações que prestou no processo são similares a temas que o próprio Kauffmann tratou em entrevistas à imprensa, ao comentar a respeito dos sistemas de registro de pagamento de propina da Odebrecht.

Tacla Duran afirma que a sua cassação de registro interessaria a Kauffmann.

“Afinal, se assim o fizer, certamente gerará reflexos diretos na desvalorização da palavra do excipiente que, como dito, não concordou em se responsabilizar das mentiras que estavam sendo lançadas pela empresa Odebrecht”, diz, no pedido de suspeição.

Além desse pedido, Tacla Duran apresentou um recurso em que diz que os registros de quem ganhou a votação do Conselho estão errados e que a maioria dos votos não foi para Kauffmann, e sim para a relatora original, Eryca. Para ele, Eryca devia continuar relatando o processo.

Procurado pela reportagem, Kauffmann se disse surpreso “pela divulgação de um processo disciplinar que é sigiloso” e disse que quem o violou “o fez para tentar tumultuar ou inviabilizar um julgamento justo”.

Segundo ele, ser contratado pela empreiteira não retira sua imparcialidade para participar de julgamento colegiado na condição de conselheiro. “Trata-se de mais um factoide criado por quem costumeiramente ataca os julgadores em vez de se defender de fatos”, diz ele.

“Com relação à contratação pela Odebrecht para defender três de seus ex-executivos, importante observar que nem a Odebrecht e nem os executivos são parte no processo disciplinar, que não discute qualquer outra questão, senão a idoneidade do advogado Rodrigo Tacla Duran”, acrescentou Kauffmann.

Também procurado, Caio Augusto, o presidente da OAB-SP, justificou sua decisão sem mencionar nomes ou detalhes de envolvidos, já que o caso está sob sigilo.

Segundo ele, o recurso que foi apresentado não é incomum e tem previsão legal. “A motivação de eu ter utilizado embargos é que eu estava presidindo a sessão do conselho e me pareceu que existiam detalhes do caso que não estavam bem esclarecidos para o conselho seccional”, disse ele.

“Tanto é fato que o conselho ficou razoavelmente dividido na questão. A maioria decidiu pela exclusão e a minoria decidiu por não acolher a exclusão.”

Atualmente, Caio Augusto está em campanha em meio à tentativa de reeleição à presidência da entidade. Kauffmann é um dos seus apoiadores.

Procurado, Rodrigo Tacla Duran não se manifestou.

Folha de S. Paulo

 

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