Congresso e PGR não reagem aos ataques de Bolsonaro ao sistema eleitoral

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Foto: Pedro França/Agência Senado

O presidente Jair Bolsonaro tem encontrado terreno fértil para os ataques ao sistema de votação do país. A única resistência à campanha difamatória orquestrada pelo chefe do Executivo parte do Judiciário, em especial do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), alvo constante das investidas. Já o Congresso e a Procuradoria-Geral da República (PGR) permanecem inertes diante dos arroubos presidenciais.

Na acusação mais recente, Bolsonaro disse que o presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, e os ministros Edson Fachin e Alexandre de Moraes — que estarão no comando da Corte a partir da semana que vem — querem tirá-lo da eleição de outubro na base da “canetada”. Ele enfatizou, ainda, que o trio “não contribui para o Brasil em nada”.

O senador Renan Calheiros (MDB-AL) afirmou que as instituições deveriam se posicionar de maneira mais firme às hostilidades de Bolsonaro e fez críticas ao procurador-geral da República, Augusto Aras. “Acho que Câmara, Senado e PGR estão sendo lenientes com os ataques do presidente. Ele já começou a fazê-los ao Supremo (Tribunal Federal) e ao TSE”, frisou. “O procurador-geral da República também está conduzindo equivocadamente as provas enviadas pela CPI da Covid”, acrescentou. A comissão parlamentar de inquérito entregou o relatório final a Aras, com pedido de indiciamento de Bolsonaro, mas, até agora, o PGR não tomou providências. Senadores que integraram o colegiado afirmam que Aras tenta “ludibriar os brasileiros” ao ignorar “provas fartas” apresentadas no documento.

Além de não reagir aos ataques de Bolsonaro ao sistema eleitoral e deixar de tomar providências pedidas pela CPI da Covid, Aras tem tentado blindar o presidente de investigações. Na quinta-feira, ele pediu ao Supremo o arquivamento do inquérito contra o chefe do Executivo por vazamento de informações sigilosas da Polícia Federal sobre ataque hacker aos sistemas do TSE. Ontem, se manifestou pelo encerramento do inquérito que apurou suposto crime de prevaricação de Bolsonaro por omissão diante de indícios de corrupção na compra da vacina indiana Covaxin pelo Ministério da Saúde.

A postura de Aras seria motivada pela esperança de ser indicado por Bolsonaro para assumir uma cadeira no Supremo, o que só poderá acontecer se o presidente conseguir a reeleição, pois haverá vagas disponíveis na Corte apenas a partir do ano que vem.

O novo líder da oposição na Câmara, Wolney Queiroz (PDT-AP), afirmou que buscará medidas parlamentares e jurídicas junto a bancadas da Câmara e do Senado contra os arroubos do presidente às urnas eletrônicas. “Cada ataque de Bolsonaro ao sistema eleitoral deveria ser sucedido por uma contundente defesa desse sistema no Congresso, pelos presidentes das Casas legislativas, dos partidos políticos e do procurador-geral. Vemos Bolsonaro, cada vez que cai nas pesquisas, recorrendo a esse discurso”, frisou.

O deputado Camilo Capiberibe (PSB-AP) defendeu que o Senado discuta com o procurador-geral da República uma espécie de realinhamento de conduta, pois foi a Casa que aprovou o nome dele para o cargo e sua recondução. “Na primeira eleição, havia o benefício da dúvida. Na segunda, já não temos mais condições de defender a flagrante proteção ao presidente”, destacou.

Já o deputado bolsonarista Coronel Tadeu (PSL-SP) saiu em defesa do presidente. “Se um hacker invade o sistema eleitoral, e isso está comprovado, é claro que não se trata de um sistema seguro. Temos muito para discutir sobre isso. Por exemplo, por que é o TSE que tem de coordenar as eleições?”, argumentou.

Especialistas e políticos ouvidos pelo Correio também criticam o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) por não reagirem às investidas de Bolsonaro. Por sinal, Lira, um dos caciques do Centrão — bloco de sustentação do governo —, ignora mais de 100 pedidos de impeachment contra o chefe do Executivo. No Congresso, Pacheco é quem mais se manifesta contra atitudes do chefe do Planalto, mas sem a veemência necessária, na avaliação de analistas.

Na opinião da advogada constitucionalista Vera Chemin, Bolsonaro já cometeu ações que justificam enquadrá-lo em crime de responsabilidade, como as insinuações contra o processo eleitoral, e até mesmo crime comum, como nas manifestações antidemocráticas de 7 de setembro. Ela não acredita, porém, em ação do Parlamento, devido aos interesses políticos. “O que vai determinar a conduta do Congresso serão as variáveis eleitorais. Se entenderem (parlamentares) que ele não tem chances de vencer a eleição, essa postura pode ser diferente conforme o pleito se aproxime”, frisou.

O cientista político Valdir Pucci enfatizou não haver como prever as ações do eleitoral diante da insistência dos discursos agressivos de Bolsonaro. Ele citou a invasão de apoiadores de Donald Trump ao Capitólio, nos Estados Unidos, durante a contagem de votos, após o então líder norte-americano afirmar que não aceitaria o resultado das urnas. “As crises podem nascer de bravatas. Quando Bolsonaro fala dessa forma, manda recado para sua bolha. Alguns podem entender como bravata, mas, quando chega à ponta, isso pode mudar de figura”, alertou. “Considero esse pensamento muito perigoso, basta lembrar a invasão do Congresso americano incentivados por discursos do próprio Trump, que eram considerados como bravata.”

Correio Braziliense