Empreiteira ligada ao governo superfaturou

Todos os posts, Últimas notícias

Foto: Rafaela Felicciano/Metrópoles

Criada no início de 2014, mesmo ano em que a Operação Lava Jato começou a cercar as maiores construtoras do país por envolvimento no escândalo de corrupção da Petrobras, a empreiteira mineira LCM Construção e Comércio é hoje a líder em faturamento com obras na administração de Jair Bolsonaro.

A empresa já recebeu mais de R$ 2,2 bilhões desde o início do atual do governo.

Um levantamento feito pela coluna mostra que o valor é o dobro do que foi pago, por exemplo, à notória Odebrecht, segunda colocada no ranking. Apanhada pela Lava Jato, a empreiteira baiana mantém um contrato bilionário com o governo, mais precisamente com o Comando da Marinha, para a construção de um estaleiro no Rio de Janeiro. O contrato foi assinado em 2009, durante a presidência de Lula — ao longo do governo Bolsonaro a Odebrecht faturou R$ 1,1 bilhão pelo serviço.

No caso da LCM Construção, os contratos são mais modestos, mas se reproduzem em grande volume. A construtora mineira é uma espécie de papa-obras do Departamento Nacional de Infraestruturas de Transportes (DNIT), vinculado ao Ministério da Infraestrutura. Apenas no atual governo, ela assinou 146 contratos com as superintendências do DNIT de 20 estados e do Distrito Federal. A soma chega a R$ 4,8 bilhões.

Do total de contratos, 14 foram assinados sem licitação – esses alcançam a cifra de R$ 174,1 milhões.

Os serviços, quase sempre, envolvem conservação e recuperação de rodovias federais. O contrato mais recente, assinado no mês passado ao preço de R$ 32,6 milhões, prevê a recuperação de 49 quilômetros da BR-471, no Rio Grande do Sul. Já o contrato de valor mais alto firmado no atual governo, no valor de R$ 224,1 milhões, tem como objeto a duplicação de um trecho da BR-423, em Pernambuco.

A LCM emergiu no setor público justamente quando as grandes estrelas da empreita nacional começaram a ser apanhadas em casos de corrupção, como a Delta Engenharia, do empresário Fernando Cavendish, que confessou ter dado propina ao ex-governador do Rio Sergio Cabral.

Embora ainda seja pouco conhecida, a construtora também já foi alvo da Polícia Federal. Em julho de 2019, a Operação Mão Dupla, realizada pela Polícia Federal a partir de uma investigação iniciada em Rondônia, fez buscas e prendeu funcionários do DNIT local e da empreiteira mineira.

Na ocasião, a PF apontou fraude nas medições das obras e nos pagamentos dos serviços de pavimentação em trechos da BR-364, em Porto Velho. Segundo os policiais, a ação evitou o desvio de R$ 12 milhões.

O dono da empreiteira é o empresário Luiz Otávio Fontes Junqueira. Antes de abrir a LCM, ele já atuava no setor público, mas com outra empresa, a Construtora Centro Minas (CCM), que continua ativa e também fatura no governo Bolsonaro – recebeu R$ 138,7 milhões de 2019 para cá.

Em 2011, o empresário e a CCM foram alvos de uma ação de improbidade movida pelo Ministério Público Federal do Tocantins por suposto prejuízo de R$ 4,8 milhões em uma obra do DNIT na BR-153. Junqueira também é réu em uma ação movida por procuradores do Pará, que o acusam de superfaturamento de R$ 1,8 milhão na construção, pela CCM, de um hospital na cidade de Santarém.

Luiz Otávio Junqueira e seus sócios seguem a receita tradicional dos empreiteiros brasileiros. Assim como os grandes empresários que caíram no escândalo do petrolão, eles têm histórico de contribuição para o mundo da política, ainda que os valores registrados sejam parcos: em 2018, doaram R$ 135 mil para a campanha do então tucano Antonio Anastasia ao Senado. Hoje, Anastasia é ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), que tem entre suas principais atribuições justamente a fiscalização de obras públicas.

O empresário tem perfil discreto e evita expor suas preferências políticas nas redes. O mesmo não pode ser dito de Cristiano Lorenci Junqueira, seu filho e sócio, que publica posts pondo em dúvida a credibilidade das urnas eletrônicas e já compartilhou mensagens de Jair Bolsonaro com elogios ao ministro da Economia, Paulo Guedes, e críticas aos “governos esquerdistas”.

À coluna, a LCM afirmou que, embora seja uma empresa relativamente nova, seu sócio principal já tem experiência no mercado há cerca de 30 anos. O expressivo volume de contratos obtidos no governo Bolsonaro, diz a companhia, se deve ao fato de as construtoras maiores terem deixado o mercado por causa da Lava Jato, o que pulverizou as obras entre empreiteiras de médio porte.

“Todas as contratações firmadas com o DNIT observaram os requisitos previstos na legislação aplicável, sendo, portanto, regulares. Além disso, a empresa sempre atuou de forma transparente e seguindo as boas práticas de integridade, não havendo que se falar em irregularidade”, diz nota enviada pela empresa.

Quanto às investigações de que é alvo, a LCM nega que tenha havido qualquer irregularidade e diz confiar que, ao final dos processos, todas as suspeitas serão devidamente esclarecidas.

Metrópoles