Alckmin se aclimata à esquerda facilmente

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Foto: Jeniffer Gularte

Filado ao PSB há quatro meses, Geraldo Alckmin se esforça para deixar de ser um estranho no ninho. O empenho do ex-governador, que saiu do PSDB depois de 33 anos para ser candidato a vice de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ficou claro durante um jantar oferecido na última quinta-feira pela cúpula do seu novo partido, em Brasília. O evento ocorreu na véspera da convenção da legenda que oficializou o apoio à campanha do líder petista. Durante a recepção, Alckmin circulou com desenvoltura e analisou cenários: previu queda da inflação até a eleição, o que pode impulsionar o presidente Jair Bolsonaro (PL), e reconheceu que sua chapa enfrentará dificuldades no Sul do país.

A confraternização organizada para estreitar os laços de Alckmin com dirigentes estaduais do PSB ocorreu na casa que abriga a Fundação João Mangabeira, entidade ligada ao PSB. A reportagem do GLOBO esteve no local e acompanhou o jantar. De camisa branca dobrada até o cotovelo e calça de sarja azul marinho, o neo-socialista chegou ao evento às 20h21, acompanhado de Lu Alckmin, sua companheira há 43 anos. O casal foi recebido por cerca de 80 convidados na área externa da residência, em nove mesas redondas dispostas sobre um deck de madeira plástica construído sobre uma piscina. Ao lado, em uma cozinha gourmet, eram preparadas pizzas e canapés. Os garçons serviam vinhos cabernet e malbec e uísque.

Revezando-se entre água e refrigerante, o ex-governador pontuou possíveis percalços na corrida ao Palácio do Planalto. Ele disse acreditar que o Brasil chegará ao segundo turno com inflação e desempregos mais baixos — o que, caso se confirme, poderá reduzir a vantagem de Lula sobre Jair Bolsonaro, atualmente em 18 pontos percentuais, segundo o Datafolha. O PT e o próprio Lula trabalham para tentar evitar que isso ocorra, articulando para atrair legendas como PSD, MDB e União Brasil ao seu palanque.

Em outra roda de novos correligionários, o ex-governador admitiu que um dos principais desafios de sua chapa será a conquista do eleitorado no Sul do país, região onde Bolsonaro deve ter um dos seus melhores desempenhos. Alckmin traçou um paralelo com a situação nos estados de Norte e Nordeste, historicamente afinados com Lula.

Após a sua análise, o candidato a vice de Lula perguntou ao presidente do PSB gaúcho, Mario Bruck, se o ex-governador Eduardo Leite (PSDB) era mesmo o favorito na luta pela reeleição contra o ex-ministro Onyx Lorenzoni, do PL. O partido destacou Beto Albuquerque como pré-candidato ao governo do Rio Grande do Sul, mas deve recuar porque enfrenta resistência do PT, que deverá apoiar Edegar Pretto. Diante desse impasse, um dirigente da sigla comentou que há uma satisfação geral com a aliança nacional firmada com os petistas, mas reclamou que nos palanques estaduais a legenda de Lula só queria ser apoiada, e não dar apoio.

A partir de agosto, o ex-governador sairá em roteiro solo para tentar diminuir a rejeição de Lula em estados bolsonaristas. Em conversa com o presidente do PSB em Tocantins, Carlos Amastha, Alckmin disse que está focado na agenda com empresários e religioso e que quer aproximação com estes setores quando visitar o estado.

Durante pouco mais de duas horas e meia, Alckmin foi o centro das atenções. Nos pedidos de selfies, concorreu apenas com a atriz Lucélia Santos (PSB-RJ), eternizada como protagonista da novela Escrava Isaura, que será candidata a deputada federal pelo Rio.

— Foi um jantar alto astral. Conheci o Alckmin durante uma viagem à China (em 2004). Conversamos muito sobre filosofia e religião — recorda Lucélia.

A confraternização atraiu nomes importantes da legenda, como o prefeito de Recife, João Campos, a deputada federal Tabata Amaral (SP) e o pré-candidato ao governo do Rio, Marcelo Freixo. Na mesa reservada ao casal Alckmin, sentaram-se o ex-governador Márcio França, um dos principais articuladores da mudança de legenda do ex-tucano, e o governador do Espírito Santo, Renato Casagrande.

Enquanto um pedaço de pizza de mozarela esfriava no seu prato, o candidato a vice de Lula tentava demonstrar interesse a cada interlocutor que o abordava, contando histórias, parte delas passadas no seu sítio em Pindamonhangaba, município do interior paulista do qual foi prefeito. Alckmin mostrava os calos nas mãos, resultado, contava, da capina na terra aos finais de semana. Ponderou, no entanto, que tem ido pouco à propriedade de 12 hectares, a 14 quilômetros do centro da cidade.

Entre os dirigentes do PSB, a ausência mais notada no jantar foi a do deputado federal Alessandro Molon, presidente da legenda no Rio e pivô de uma fissura com o PT. O parlamentar resiste a retirar a sua candidatura ao Senado como desejam os petistas que preferem ao posto o deputado estadual André Ceciliano.

O Globo