Planos de Lula incluem controle de armas de fogo

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Foto: NELSON ALMEIDA / AFP

A discussão no Partido dos Trabalhadores (PT) sobre o programa de segurança pública de Lula causou um racha na equipe que elabora as propostas.

Apesar de terem sido discutidos em dezenas de reuniões internas do PT, propostas sensíveis como o revogaço de decretos bolsonaristas ampliando o acesso às armas sequer constam nas diretrizes do programa de governo entregues ao Tribunal Superior Eleitoral.

De acordo com lideranças que participaram dos debates internos, foram vetados pela coordenação da campanha lulista.

Um documento da setorial do PT que elaborou propostas para o tema, obtido com exclusividade pela equipe do blog, elenca uma série de proposições discutidas dentro da sigla em dezenas de reuniões.

Uma delas era a retomada dos conselhos de segurança pública, desmantelados pelo governo Bolsonaro. Outra, o estímulo à colocação de câmeras nos uniformes de policiais.

São temas de consenso no PT e constam do documento, mas não das diretrizes sumarizadas pelo coordenador do programa, o ex-ministro Aloizio Mercadante, e entregues ao TSE.

Chama atenção nos dois documentos a ausência de medidas para frear e reverter a expansão do porte de armas de fogo no Brasil. A revogação maciça dos decretos bolsonaristas é consenso no partido, mas vem sendo considerada polêmica demais para ser explicitada neste momento da campanha.

De resto, vários temas permanecem em discussão no PT — como, por exemplo, o que fazer com aqueles que foram contemplados por novas licenças durante o governo Bolsonaro.

Se alguns aceitam que será necessária uma espécie de “anistia” para aqueles que ganharam o porte nos últimos quatro anos, enquanto se “estanca a sangria” com um revogaço de decretos, outra ala ainda defende uma revisão geral, com a retirada do porte de armas de alguns grupos ou indivíduos.

Nos bastidores, o PT tem avaliado que seria politicamente arriscado fazer compromissos muito detalhados diante das incertezas sobre a situação fiscal do Brasil em 2023 e sobre a composição do Congresso Nacional em um novo governo Lula.

No campo da segurança, a desculpa dos coordenadores do programa de governo é a de que a sociedade ainda não está “amadurecida” o suficiente para uma discussão aprofundada de pautas sólidas sobre o assunto no período eleitoral.

Segundo pessoas que acompanharam as discussões internas do partido, também há uma espécie de “trauma” com a campanha presidencial de Fernando Haddad (PT) em 2018.

Na ocasião, propostas como a convocação de uma Assembleia Constituinte, a descriminalização de drogas e a desmilitarização das polícias tornaram o petista um alvo fácil de Jair Bolsonaro e foram retiradas do programa de governo. O mesmo, avaliam, poderia se repetir no caso da segurança pública.

Entre as propostas elaboradas pela setorial de segurança pública (e que não estão no programa apresentado ao TSE) estão a reestruturação das carreiras das polícias, a extinção de Tribunais Militares estaduais, a instituição de um piso salarial único nas esferas federal, estaduais e municipais, a adoção de políticas antidiscriminatórias e até a desvinculação da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) do Gabinete de Segurança Institucional (GSI).

Em aceno similar ao da campanha de Haddad ao governo de São Paulo neste ano, o documento interno também defende a capacitação continuada de policiais centrada “em direitos humanos, antirracismo, (e) anti-homofobia”, além de uma ruptura “paradigmática” quanto à figura das mulheres nestas instituições.

Já as diretrizes entregues ao TSE tratam genericamente da necessidade de integrar as forças de segurança, investir em inteligência, implementar e aprimorar o chamado Sistema Único de Segurança Pública.

O material também enfatiza propostas voltadas às categorias policiais – como a melhora da qualificação técnica de policiais e uma “nova política de drogas” visando a desarticulação de facções criminosas.

Segundo a equipe do blog apurou, as pautas corporativas não estavam presentes na primeira versão das diretrizes e foram incluídas após pressão da setorial nacional e dos partidos da coligação de Lula.

A aproximação com as polícias, onde o bolsonarismo encontra apoio forte e disseminado, é vista como crucial para destravar as demais agendas e pacificar as corporações.

“Nossa aposta é que Lula abra o diálogo com os policiais, o que ele pode fazer já na campanha como fez com os evangélicos. Basta falar com o policial como um trabalhador e moldar as diretrizes para fazer esse programa. Como apaziguador que é, pode usar essa força para falar diretamente. Não precisa pedir aos governadores para que conversem com as bases das polícias”, diz Abdael Ambruster, coordenador de segurança pública do PT.

Entre os petistas que estiveram à frente da elaboração das propostas há a expectativa de que o partido oficialize propostas menos pasteurizadas para o setor, levando em conta os anseios do eleitorado.

Segundo o Datafolha, 64% dos brasileiros têm medo de sair de casa à noite por medo da violência, e nove em cada dez moradores do Rio e de São Paulo temem ser assaltados.

Procurada pela equipe do blog, a coordenação do programa da campanha de Lula afirmou que o PT irá apresentar um programa de governo com propostas concretas, incluindo a revisão da política armamentista, antes da eleição — sem, contudo, especificar uma data.

Mas é certo que, ao menos nos temas polêmicos, o PT deverá repetir a estratégia de outras áreas como a economia – ou seja, postergar a discussão para um eventual governo Lula e completar a travessia eleitoral esperando do eleitor um cheque em branco.

O Globo