Carlos Bolsonaro e suas homenagens a criminosos
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Registros da Câmara Municipal do Rio aos quais O GLOBO teve acesso mostram que, sete dias após o então deputado estadual Flávio Bolsonaro homenagear o ex-capitão do Bope Adriano Magalhães da Nóbrega, o vereador Carlos Bolsonaro (PSC) também apresentou, em 2003, na Câmara Municipal do Rio, moções em nome dele e de outros oito policiais acusados de uma série de crimes que vão de homicídio doloso à corrupção. Morto em ação policial na Bahia no início deste mês, Adriano foi apontado no ano passado como chefe da milícia de Rio das Pedras e de um grupo de matadores de aluguel conhecido como “Escritório do Crime”.
Entre os policiais condecorados por Carlos, na mesma época, está ainda uma moção em homenagem ao então sargento Sérgio Rogério Ferreira Nunes, lotado no mesmo batalhão, o 16º BPM. Ele era um dos superiores do Grupamento de Ações Táticas (GAT) comandado por Adriano e conhecido como “guarnição do mal”, à época, e acusado de homicídio, tortura e extorsão. Junto com eles, ainda em 2003, recebeu uma moção o então sargento da PM Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio investigado desde 2018 pelo MP no caso da rachadinha na Alerj.
No último sábado, em evento no Rio, o presidente Jair Bolsonaro disse que foi ele quem pediu que Flávio fizesse a homenagem a Adriano dizendo que, na época, ele era um “herói”. Procurada pelo GLOBO, a assessoria de Carlos Bolsonaro não respondeu aos questionamento sobre as homenagens.
Nos registros da Câmara Municipal do Rio, as moções pedidas por Carlos englobam uma série de policiais do 16º BPM (Olaria). Foram homenageados, além de Adriano, o capitão Flávio Luiz de Souza, os sargentos Abenor Machado Furtado, Marcelo da Silva Conceição e Ítalo Pereira Campos; assim como os soldados Alexander Duarte da Silva, Luiz Carlos Felipe Martins e Flávio Rodrigues Neves.
Acusado por moradores da região de fazer sequestros e extorsões, o grupo foi apontado pela Corregedoria-Geral da PM à época como responsável por torturar três jovens da favela de Parada de Lucas, na zona norte do Rio, e pela execução de Leandro dos Santos Silva, de 24 anos. A morte ocorreu no dia 27 de novembro de 2003, um dia depois que ele prestou queixa contra abusos atribuídos à “guarnição do mal”. Os oito policiais foram presos em flagrante. Segundo a investigação conduzida pela Polícia Militar, a onda de sequestros e extorsões promovidos pelo grupo havia começado cerca de um mês antes, no fim de outubro.
As homenagens aos oito policiais foram concedidas por Carlos Bolsonaro no dia 11 de novembro de 2003, cerca de duas semanas antes da prisão dos policiais. No texto de justificativa das homenagens de Carlos, consta apenas a descrição “policial militar”.
Ao GLOBO, um dos policiais presos na época, o atual vereador Ítalo Pereira Campos (Avante) — conhecido como Ítalo Ciba —, disse que as prisões ocorreram por “perseguição política” e que uma perícia apontou que a morte de Leandro teria ocorrido em uma troca de tiros. Ítalo, que se diz amigo de longa data da família Bolsonaro, diz não lembrar a razão exata da homenagem.
— Foi por bons serviços prestados ao Rio de Janeiro. (Homenagearam) A guarnição inteira porque me conheciam. Nunca me escondi na polícia. O capitão Adriano também trabalhou muito — disse Ciba.
Adriano chegou a ser condenado a 19 anos de prisão, mas o júri foi anulado. Em um novo júri, o então capitão foi absolvido, assim como os outros sete policiais.
Outro policial homenageado por Carlos e Flávio Bolsonaro é o major Sérgio Pereira de Magalhães Júnior. Em 2003, quando Adriano Nóbrega e Ítalo Ciba estavam no 16º BPM ele era um dos oficiais que estavam na linha de comando da unidade e era responsável por fiscalizar as ações do GAT de Adriano.
Desde 2012, porém, ele enfrenta uma série de investigações por sua atuação na ONG Casa Espírita Tesloo e contratos que firmou com a prefeitura do Rio de Janeiro e de Guapimirim, na região metropolitana do Rio.
No caso da prefeitura do Rio, a ONG foi afastada depois de denúncias envolvendo a mulher do ex-secretário municipal de Ordem Pública Rodrigo Bethlem. Havia suspeita de que parte da verba que o município passava para a ONG promover o tratamento de adolescentes com dependência de crack fosse desviada para o secretário. Depois disso, uma sindicância determinou que a Tesloo devolvesse mais de R$ 4,8milhões aos cofres públicos.
Em 2017, ele chegou a ser preso depois da Operação Flexus, coordenada pelo Grupo de Atuação Especializada no Combate à Corrupção (GAECC), mas conseguiu um habeas corpus e responde ao processo em liberdade. Ele atualmente responde a dois processos por fraude de licitações e organização criminosa. O GLOBO tentou contato com ele por meio de seus advogados, mas não teve retorno.
A Alerj informou não ter registros da visita do Adriano Nóbrega ao prédio anexo onde ficam os gabinetes dos deputados. A Alerj admitiu que havia falta de controle nas portarias e que mudou o sistema no ano passado. “O acesso era falho, agora o controle é mais rígido, a nova gestão vem adotando medidas para maior controle, inclusive exigindo a apresentação do crachá aos funcionários que acessam todos os prédios da Alerj”, informa a nota.
O GLOBO apurou, porém, que muitos policiais usavam a portaria lateral do prédio anexo, exclusiva para os deputados, para entrar no prédio sem registrar oficialmente a entrada.