Guedes nega redução do preço dos combustíveis
Foto: Ed Alves/CB/D.A Press
A solução para a alta carga tributária da gasolina e do diesel não será alcançada de forma tão simples e rápida quanto sugeriu o presidente Jair Bolsonaro — na semana passada, ele desafiou os governadores a zerarem os impostos que incidem sobre os combustíveis. Quem indicou isso foi o ministro da Economia, Paulo Guedes, que tratou dessa questão com os governadores nesta terça-feira (11/2).
Guedes vinha evitando fazer comentários sobre o desafio dos combustíveis desde que essa proposta foi anunciada, na imprensa e nas redes sociais, por Bolsonaro. Mas, nesta terça-feira (11/2), cancelou um almoço com o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, para participar do Fórum de Governadores, que reuniu, em Brasília, representantes das 27 unidades federativas em torno da questão dos combustíveis.
O ministro foi ao evento com o secretário especial da Fazenda, Waldery Rodrigues, e com o secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida. Ele saiu sem falar com a imprensa. Mas segundo os governadores, fez um discurso apaziguador em relação aos combustíveis. Guedes teria dito que, apesar do desafio lançado por Bolsonaro, essa é uma questão que não pode ser resolvida imediatamente e que, portanto, não vai tirar uma fonte de receita importante para os estados de uma hora para outra.
“Guedes interpreta essa questão como uma sugestão de médio e longo prazos. Ele sabe que esse assunto só pode ser resolvido na medida em que houver a aprovação da reforma tributária e do pacto federativo, já que nem os estados nem a União podem abrir mão dessa receita agora”, contou o governador do Espírito Santo, Renato Casagrande. “O ministro está ciente da absoluta restrição que os estados têm de zerar o ICMS imediatamente. E fez uma colocação de que a fala do presidente deve ser entendida como um apelo e um chamamento para que o tema da tributação seja enfrentado pelo país”, acrescentou o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite.
Os chefes de Executivos, que já vinham criticando o posicionamento adotado por Bolsonaro em relação à alta dos combustíveis, explicaram que não é possível zerar os tributos dos produtos de uma hora para outra, porque essa receita representa 20% de tudo que os estados arrecadam com o ICMS e quase R$ 30 bilhões da arrecadação anual da União. Seria uma renúncia, portanto, que atrapalharia as contas públicas e precisaria ser compensada com cortes de gastos ou criação de outra fonte de receita.
“Todos nós estávamos muito preocupados com a maneira, de certo modo irresponsável, que o presidente colocou esse debate tão importante. Todo mundo sabe das dificuldades dos estados de manter o custeio da máquina pública, a saúde, a educação, a segurança”, frisou o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha. “A própria União teve um prejuízo de R$ 90 bilhões nas suas contas no ano passado. Por isso, esperamos que esse debate seja feito de forma responsável”, emendou ele, que chegou a falar de maneira mais dura com Guedes durante o fórum.
Ibaneis explicou que Bolsonaro apresentou o desafio de zerar os tributos dos combustíveis sem consultar os estados. E, dessa forma, acabou jogando para os governadores a responsabilidade pelo alto custo dos produtos, sem entender o impacto que a medida teria tanto nos cofres estaduais quanto nas contas da União. Foi por isso, inclusive, que os chefes de Executivos preferiram chamar Guedes, e não Bolsonaro, para discutir o assunto nesta terça-feira (11/2). “Vamos tratar isso com o ministro, porque é ele que pode dizer se há condições de os estados e a União abrirem mão dessa receita. (…) Vamos dar nosso recado via Paulo Guedes, que é quem entende de economia”, alfinetou Ibaneis.
Também por conta desse mal-estar criado para os gestores estaduais, os governadores cobraram que o governo federal vá a público apresentar o mesmo esclarecimento que Guedes levou ao fórum, nesta terça-feira (11/2), de que essa questão não deve ser resolvida no curto prazo, como sugeriu Bolsonaro. “Uma fala curta do presidente da República sobre esse tema rapidamente deflagrou uma percepção equivocada de que é possível zerar os impostos sobre os combustíveis imediatamente”, disse Eduardo Leite. “(…) Então, pedimos um posicionamento mais claro, para que não haja qualquer expectativa sendo gerada na população, porque isso só geraria frustração, frustração que acaba prejudicando a nossa economia.”
Os governadores garantem, por sua vez, que estão dispostos a rever a política de tributação dos combustíveis. O que eles defendem, contudo, é que essa questão seja discutida com a reforma tributária e as propostas do pacto federativo, que já estão no Congresso. Afinal, de um lado, a reforma tributária pode reduzir a alíquota de produtos, como a gasolina, já que vai unir os diversos impostos de consumo em um único tributo de menor alíquota. E, de outro, o pacto federativo pode ampliar os repasses da União para estados e municípios, criando uma nova fonte de receita que compensaria a perda com a redução dos impostos dos combustíveis.
“A população pode cobrar a redução dos impostos, mas precisa entender que essa mudança virá ao longo do ano. (….) Este não é um momento para sobressaltos. A população deve saber que nós estamos caminhando para as reformas econômicas e que isso não pode ser feito de uma hora para outra”, afirmou o governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel.
Ibaneis fez coro: “Quem sabe, no futuro, com a reforma tributária e o pacto federativo, nós tenhamos condições de reduzir os impostos dos combustíveis e de outros produtos. Por que não zerar os impostos dos alimentos, sobretudo para a população mais carente? E por que não zerar os impostos dos medicamentos de uso contínuo? Mas tudo deve ser feito com responsabilidade”.
Em áudio captado por cinegrafistas na hora que foram autorizados a fazer imagens da reunião, é possível ouvir uma discordância entre Ibanei e Guedes. O governador do DF reclamou “da forma irresponsável como esse debate foi trazido pelo presidente da República”. O ministro o interrompeu, reclamando do termo “irresponsável”. Ibaneis o cortou, afirmando que “nós governadores estamos apanhando há 15 dias, de todo mundo, inclusive dos filhos do presidente. Estamos recebendo sua vinda aqui com muito carinho, porque agora estamos vendo uma interlocução”.
O deputado Baleia Rossi (MDB-SP) disse, nesta terça-feira (11/2), ao Correio, concordar com a proposta do ministro da Economia, Paulo Guedes, de incluir na reforma tributária e no pacto federativo a discussão sobre a redução dos impostos que incidem sobre os combustíveis. Autor da proposta de reforma que tramita na Câmara, o parlamentar afirmou que o Congresso é o lugar certo para esse debate.
“Essa discussão tem de ser feita com profundidade, porque o preço do combustível, hoje, no Brasil, é abusivo; o preço do óleo diesel atrapalha o ir e vir das nossas mercadorias, e acho que no parlamento essa discussão tem de ocorrer”, disse Baleia Rossi. “Portanto, na reforma tributária, ou no pacto federativo, tanto o Senado quanto a Câmara vão ter um olhar especial para esse assunto, que acaba atingindo a vida de todos. É o local correto. O ministro Paulo Guedes sinalizou dessa maneira, e eu acho que de maneira correta.”
Guedes fez a proposta nesta terça-feira (11/2), ao participar do VIII Fórum de Governadores, em Brasília. Durante o encontro, o ministro foi chamado a esclarecer o desafio do presidente Jair Bolsonaro de zerar os impostos federais sobre combustíveis desde que os estados façam o mesmo com o ICMS.
Segundo Baleia Rossi, essa discussão é urgente pelo fato de o tema ser do interesse de toda a Federação. “Eu entendo que, hoje, não só todos os estados estão com dificuldades financeiras, de conseguir recursos para fechar as contas, como também a União. Pela Lei de Responsabilidade Fiscal, os administradores públicos precisam ter muita responsabilidade, não podem abrir mão de receita. Se abrirem mão, podem incorrer em crime de responsabilidade”, frisou.
O Congresso corre contra o tempo para aprovar a reforma tributária ainda neste primeiro semestre, antes de o período de campanha para as eleições municipais de outubro esvaziar o parlamento.
Apesar de o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), assegurar que a aprovação da reforma se dará no prazo previsto, os movimentos políticos dos últimos dias colocam dúvidas sobre o cumprimento do cronograma. Além da possível inclusão da questão dos combustíveis nas discussões, ainda não foi concretizada a ideia da criação de uma comissão mista de deputados e senadores para unificar as propostas que tramitam nas duas Casas.
A ideia da criação desse colegiado também enfrenta forte resistência de membros da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, que exigem, antes, a apresentação da proposta do governo para a reforma.
O dinheiro proveniente de royalties de petróleo acumulado por estados produtores, de 2013 até agora, está na casa dos R$ 100 bilhões. E uma parte razoável dessa quantia deve ser repassada a outras unidades da Federação, caso o Supremo Tribunal Federal (STF) derrube a liminar da ministra Cármen Lúcia, que suspendeu a chamada Lei dos Royalties. Se, porém, a Corte julgar a lei inconstitucional, os demais estados, que não têm extração do recurso natural, continuarão a receber um percentual bem menor, de 7%. A previsão é de que o julgamento ocorra ainda neste semestre. Nesta terça-feira (11/2), governadores se reuniram com o presidente do STF, Dias Toffoli, no Consellho Nacional de Justiça, do qual ele também tem o comando. Os estados produtores querem que se respeitem os contratos de extração assinados até 2019, para não pagarem valores retroativos. Os não produtores sinalizaram aceitar o primeiro termo.