Bolsonaro está queimando “herança bendita” do PT
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Ainda que a venda de reservas em moeda forte seja motivo de controvérsia econômica e política, dados apontam que os montantes em poder do Banco Central continuam em níveis elevados para padrões internacionais.
Segundo parâmetros adotados pelo FMI (Fundo Monetário Internacional), que levam em conta compromissos imediatos da dívida externa, importações e volume de dinheiro em aplicações financeiras domésticas, o BC dispõe de reservas em quantidade adequada —ou até acima disso.
O Brasil fechou o ano passado com reservas cambiais de US$ 356,9 bilhões. Pela métrica do FMI, o índice de adequação é de 1,55 (ou 155%), numa escala que considera ideais, em tese, cifras entre 1 e 1,5.
O montante caiu na segunda-feira (9), quando o BC vendeu quase US$ 3,5 bilhões para enfrentar a disparada do dólar, decorrente das tensões associadas ao coronavírus e à queda dos preços do petróleo.
Nada, porém, capaz de levar as reservas a um patamar tido como desconfortável. Poucos países do mundo, aliás, contam com tantas divisas no caixa em termos relativos.
Os latino-americanos Argentina e México, por exemplo, marcam 0,79 e 1,16, respectivamente, na conta de adequação do FMI, enquanto a gigante China tem apenas 0,83. Entre os principais emergentes, os maiores números em 2019 são de Rússia (3,14) e Índia (1,58).
A folga brasileira —ou excesso, conforme o ponto de vista— já foi maior. Em 2018, as reservas somavam US$ 374,7 bilhões, com adequação de 1,68 para o FMI.
No ano passado, o Banco Central voltou a vender dólares à vista —US$ 36,9 bilhões, precisamente— ao mercado financeiro, o que não acontecia desde a década anterior.
Rompeu-se, assim, um tabu segundo o qual as reservas apenas deveriam servir como uma espécie de bomba atômica —a ser ostentada, mas não utilizada de fato.
A medida suscita polêmica, uma vez que parâmetros como o adotado pelo FMI são apenas indicativos. Não há ciência exata a definir os montantes ideias de reservas.
O tema foi politizado, além disso, porque a acumulação de dólares pelo BC foi uma marca das administrações petistas.
Países emergentes precisam acumular divisas porque suas moedas não são aceitas em transações internacionais de crédito e comércio. Historicamente, o Brasil viveu crises econômicas profundas quando se viu desprovido de recursos para importações e pagamento de credores.
É um erro comum, entretanto, imaginar que a venda de reservas corresponde a uma perda de patrimônio público.
Cada dólar em poder do BC foi obtido por meio de endividamento público em moeda nacional, sobre os quais incidem juros mais elevados que os praticados no exterior.
Quando se desfaz dos dólares, o BC recebe reais que abatem a dívida do governo. A situação orçamentária melhora, com menos juros a pagar.
A dúvida é até que ponto o órgão vai deixar as reservas caírem —questão formulada pelo ex-ministro da Fazenda Nelson Barbosa, colunista da Folha, em publicação recente da Fundação Getulio Vargas.
Ele observa que, alternativamente, podem-se negociar swaps cambiais —operação realizada em moeda nacional, mas corrigida pela variação do câmbio, que se tornou usual nesta década.
Barbosa aponta que há espaço para a venda de cerca de US$ 70 bilhões, entre reservas e swaps, se a ideia for preservar o nível mínimo registrado em 2014-15 (na combinação das duas variáveis). Esse seria, porém, um cenário extremo e indesejável.
O economista e consultor Gustavo Loyola, ex-presidente do BC, não fala em valores, mas considera haver margem para mais intervenções no mercado. “A arte está em não desperdiçar munição”, afirma.
Em outras palavras, não se deve buscar uma determinada cotação para o dólar, mas apenas atuar contra oscilações bruscas nos momentos de incerteza e evitar episódios de desabastecimento.
Redação com Folha