Começa onda de derrotas do governo no Congresso
Foto: Roque de Sa /Agencia Senado
Deputados e senadores sinalizaram, nesta quarta-feira (11/3), que não vão se deixar levar pela pressão do presidente Jair Bolsonaro. E, como resposta ao chefe do Executivo — que quebrou o acordo feito com o Congresso sobre divisão do Orçamento e está apoiando atos contra as duas Casas, marcados para domingo —, aprovaram um gasto extra de R$ 20 bilhões este ano, com a flexibilização de regras para pagamento do Benefício de Prestação Continuada. Além disso, avançaram nos projetos que devolvem ao relator-geral do Orçamento pelo menos R$ 15 bilhões que foram mantidos com o Executivo na semana passada.
Ontem, a Comissão Mista de Orçamento (CMO) aprovou dois projetos de lei do Congresso Nacional (PLNs), encaminhados pelo governo, sobre o assunto. Um terceiro já havia sido aprovado no dia anterior. Os textos ainda precisam passar pelo plenário, onde podem ser alterados por deputados e senadores. Parte deles defende que a votação ocorra depois das manifestações de domingo, para não inflar os atos. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), no entanto, não concorda com a ideia.
O deputado acredita que seria um “desrespeito à população” se o Congresso decidisse sobre os PLNs por esse motivo. “A sociedade tem todo o direito de se manifestar, criticar, elogiar. O que a gente não pode é tentar passar ou atrasar apenas para reduzir ou aumentar a manifestação. Isso é desrespeitar a sociedade”, disse ao Correio. “Se essa é uma matéria que está em pauta, está pronta para votar, a gente deveria votá-la”, emendou, pontuando que a decisão cabe ao presidente do Congresso, senador Davi Alcolumbre (DEM-AP).
Além de criticarem Bolsonaro por convocar manifestações, parlamentares apontam a incoerência do chefe do Executivo nas declarações sobre as transferências orçamentárias, estopim da mais recente crise entre Legislativo e Executivo. Os dois lados chegaram a um consenso pela manutenção do veto presidencial, na semana passada: Bolsonaro enviaria as proposições que devolvem parte dos R$ 30,1 bilhões ao parlamento, em troca da manutenção do veto à Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) que deixou o valor, a princípio, com o governo.
Mas, assim que o Congresso cumpriu o acordo e aprovou o veto, em 3 de março, Bolsonaro disse que “não houve qualquer negociação”. Ele negou o acordo, no Twitter, no mesmo dia em que enviou os três PLNs prometidos, que colocam entre R$ 15 bilhões e R$ 20,5 bilhões de volta com o relator. Até mesmo os parlamentares que defendem que todo o dinheiro fique com o Executivo criticam a atitude.
“Para agitar sua base social, ele faz um discurso para fora. No Palácio da Alvorada, no Palácio do Planalto, em sala fechada, ele conversa com os chefes dos Poderes para mandar PLNs para cá. Comporta-se de uma forma com sua base social, e, no fundo, faz as negociações mais espúrias”, reprovou o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), um dos defensores da derrubada dos PLNs.
O senador Major Olímpio (PSL-SP), que é contra a manutenção de recursos para distribuição no Congresso, disse não entender por que o presidente usa como motivo para convocar as manifestações um projeto que foi enviado pelo próprio Executivo. “Não tem PLN ‘fake’. Tem autor. A população tem de saber de quem é a iniciativa. Não tem lógica eu gritar contra o Congresso se o projeto é meu”, frisou, se referindo a Bolsonaro. De acordo com Olímpio, com ou sem manifestação, ele e outros parlamentares são contra o texto enviado pelo Executivo e vão trabalhar para derrubá-lo. “É pernicioso ao país”, justificou.
Mesmo com as movimentações de Bolsonaro contra os próprios PLNs, todos foram aprovados na CMO e encaminhados ao plenário. Entre outros pontos, os projetos garantem que o governo ficará com R$ 9,6 bilhões, o que significa que o Congresso teria poder sobre R$ 20,5 bilhões, e criam regras para o pagamento de valores que eventualmente sejam acrescentados às emendas parlamentares do relator — este ano, o deputado Domingos Neto (PSD-CE) — e das comissões permanentes. A execução do dinheiro extra deve seguir a ordem de prioridade definida pelos autores.
O PLN 2, aprovado na terça-feira, muda a LDO para regulamentar a execução de emendas parlamentares impositivas, que devem ser pagas obrigatoriamente pelo Executivo. A proposta estabelece regras para contingenciamento dos valores e permite a alteração de emendas do relator e de comissões permanentes, desde que o autor autorize. Se o governo precisar bloquear verbas de ministérios para conseguir respeitar a meta fiscal, pode contingenciar a mesma porcentagem das emendas.
Na terça-feira, após a votação do PLN 2 na CMO, parlamentares divulgaram uma carta aberta ao presidente Bolsonaro, pedindo a retirada do PLN 4. Ontem, alguns sugeriram que a reunião fosse suspensa, devido ao início da sessão conjunta do Congresso. O presidente da CMO, senador Marcelo Castro (MDB-PI), manteve os trabalhos.
O presidente Jair Bolsonaro afirmou, ontem, que não recebeu a carta assinada por parlamentares pedindo a retirada do Projeto de Lei do Congresso Nacional-4 (PLN 4), que permite ao Congresso dispor de R$ 15 bilhões dos R$ 30 bilhões do Orçamento Impositivo. O documento é assinado por 75 integrantes de partidos como Podemos, Cidadania, PSL, PDT, PSD e PSC. O deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) foi um dos que assinaram. “Não recebi a carta ainda não, tá? Precisa dar uma analisada lá. Vou despachar com gente aqui. Nem estou sabendo dessa carta”, disse o chefe do Executivo.
A previsão inicial era de que os parlamentares fossem recebidos pelo ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos. No entanto, ele participou de uma reunião com Bolsonaro e com o ministro da Economia, Paulo Guedes. Uma das pautas dos encontro foi justamente a discussão dos projetos sobre o Orçamento. Posteriormente, levantou-se a possibilidade de que o documento fosse entregue para o ministro da Casa Civil, Braga Netto, mas ele está no Rio de Janeiro. O pedido foi recebido, então, pelo secretário executivo da pasta, general Sérgio José Pereira. O texto-base do projeto foi aprovado, ontem, na Comissão Mista de Orçamento (CMO).
Bolsonaro ainda negou ter conversado com os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), sobre o assunto. “Teve ministro meu que já conversou com o Alcolumbre. Estamos negociando, conversando, para que se chegue a um bom termo sobre essa questão do Orçamento”, comentou.
O perfil oficial da Secretaria de Comunicação da Presidência nas redes sociais divulgou, ontem, as manifestações de domingo. “A visita do presidente Jair Bolsonaro aos EUA incluiu um encontro com a comunidade brasileira que vive na Flórida. Em seu discurso, ele destacou a legitimidades das manifestações populares previstas para o dia 15 de março em todo o Brasil”, diz o texto.
Na imagem da publicação, apoiadores aparecem vestidos de verde e amarelo e segurando cartazes contra o PT. O comunicado traz ainda uma fala de Bolsonaro numa conferência em Miami. “As manifestações do dia 15 de março não são contra o Congresso nem contra o Judiciário. São a favor do Brasil.” No entanto, nas redes sociais, parte dos simpatizantes convocam a defender o Executivo, deixando claro que há inimigos a serem combatidos: o Congresso e o Supremo Tribunal Federal.
No último dia 7, em Boa Vista, Bolsonaro também falou das manifestações, convocando a população a comparecer. “Dia 15 tem um movimento de rua espontâneo, e o político que tem medo de movimentos de rua não serve para ser político. Então, participem”, conclamou. “Não é um movimento contra o Congresso, contra o Judiciário. É um movimento pró-Brasil, é um movimento que quer mostrar para todos nós, presidente, Executivo, Legislativo, Judiciário, que quem dá o norte para o Brasil é a população.”
Em outro trecho, Bolsonaro afirmou que o movimento de rua é muito bem-vindo. “Nós estamos submissos à lei. Como diz o artigo quinto (da Constituição), que todos podem se reunir pacificamente, bastando apenas comunicar à autoridade competente. Participem e cobrem de todos nós o melhor para o Brasil”, pregou. “Nós temos obrigação de atendê-los. Não é favor da nossa parte. Ninguém tem que se preocupar. Quem diz que é um movimento popular contra a democracia está mentindo e tem medo de encarar o povo brasileiro.”