Confira lista de crimes de responsabilidade de Bolsonaro
Foto: Flickr/ Carolina Antunes/PR
Da participação em protesto anti-Congresso a insultos a jornalistas, são ao menos 15 as situações em que o presidente Jair Bolsonaro pode ter cometido crime de responsabilidade.
A maioria dos casos envolve quebra de decoro ou afronta à Constituição. A quebra de decoro ocorre quando a autoridade procede “de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo”.
A norma, segundo o professor de direito da USP Rafael Mafei, é um guarda-chuva que “visa garantir, nas palavras e ações do presidente, limites de civilidade política”.
Crimes de responsabilidade podem levar à abertura de um processo de impeachment pelo Congresso. Especialistas afirmam, no entanto, que a medida em geral depende do clima político no país.
Abaixo, veja situações que poderiam ser enquadradas como crime de responsabilidade.
QUEBRA DE DECORO
É crime de responsabilidade contra a probidade na administração “proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo”.
Situações que poderiam ser enquadradas:
Durante o Carnaval de 2019, Bolsonaro publicou vídeo em que um homem aparece dançando sobre um ponto de táxi mexendo no próprio ânus. Na sequência, surge outro rapaz, que urina em sua cabeça. O vídeo foi gravado em um bloco chamado Blocu, no centro de São Paulo. O tuíte pode ser considerado incompatível com “a dignidade, a honra e o decoro do cargo”.
Em diversas ocasiões, Bolsonaro se referiu a jornalistas com ofensas e palavras pouco polidas.
Ele já mandou uma repórter da Folha calar a boca,
Disse que um jornalista do jornal O Globo tinha “cara de homossexual terrível”
Disseminou informações falsas em suas redes sociais sobre uma jornalista de O Estado de S. Paulo
Ofendeu com conotações sexuais a jornalista da Folha Patrícia Campos Mello. “Ela [repórter] queria um furo. Ela queria dar o furo a qualquer preço contra mim [risos]”.
Usou informações falsas para fazer ataques à colunista do Globo Miriam Leitão, que foi presa e torturada na ditadura. “Ela estava indo para a guerrilha do Araguaia quando foi presa em Vitória. E depois conta um drama todo, mentiroso, que teria sido torturada, sofreu abuso etc. Mentira. Mentira”, disse, em julho de 2019.
ABUSO DE PODER
É crime de responsabilidade contra o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais “servir-se das autoridades sob sua subordinação imediata para praticar abuso do poder, ou tolerar que essas autoridades o pratiquem sem repressão sua”.
Situações que poderiam ser enquadradas:
Em março de 2019, o fiscal do Ibama que multou Bolsonaro em 2012 por pesca ilegal em área protegida foi exonerado
Em agosto, o diretor do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), Ricardo Galvão, foi exonerado após criticar Bolsonaro em entrevista. Ele havia sido atacado pelo presidente quando a instituição divulgou dados que apontavam o aumento do desmatamento na Amazônia.
ATENTAR CONTRA A CONSTITUIÇÃO
São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição e, especialmente, contra […] o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais” das unidades da Federação. A lei também diz que é crime de responsabilidade contra a administração “expedir ordens ou fazer requisição de forma contrária às disposições expressas da Constituição”.
Situações que poderiam ser enquadradas:
Em março de 2019, o presidente determinou que quartéis fizessem as “devidas comemorações” ao aniversário de 55 anos do golpe militar de 1964.
Também já afirmou em mais de uma ocasião que não considera aquela tomada do poder um golpe de Estado.
Segundo parecer do Ministério Público Federal enviado à época, festejar “um golpe de Estado e um regime que adotou políticas de violações sistemáticas aos direitos humanos e cometeu crimes internacionais” é incompatível com a Constituição e com o Estado democrático de Direito.
A lei também define como crime de responsabilidade “provocar animosidade entre as classes armadas ou contra elas, ou delas contra as instituições civis”.
No último dia 15, o presidente incentivou e participou em Brasília de ato que tinha como pauta a defesa do governo e fortes críticas ao Legislativo e ao Judiciário. Houve manifestantes com placas pedindo o fechamento do Congresso e do Supremo. Bolsonaro cumprimentou participantes e fez fotos com muitos deles. Depois, subiu a rampa do
Planalto, em certo momento sob um coro que pedia a volta do AI-5, ato da ditadura militar que fechou o Congresso e suspendeu direitos.
Em julho, Bolsonaro ameaçou acabar com a Ancine caso não pudesse impor um “filtro” às produções de cinema apoiadas pelo órgão. “Vai ter um filtro sim. Já que é um órgão federal, se não puder ter filtro, nós extinguiremos a Ancine. Privatizaremos, passarei ou extinguiremos”, disse. O caso pode ser enquadrado como tentativa de censura, o que atenta contra o artigo 5º da Constituição (“é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”).
Em outubro, a Presidência da República excluiu a Folha da relação de veículos nacionais e internacionais exigidos em um processo de licitação para fornecimento de acesso digital ao noticiário da imprensa. Bolsonaro havia feito a ameaça dias antes, e já deu inúmeras declarações atacando o jornal. A exclusão da Folha do edital, depois revogado pelo Planalto, pode configurar violação ao princípio constitucional da impessoalidade na administração pública.
O mesmo pode ser dito do episódio em que Bolsonaro pediu a empresários que não anunciem em veículos que fazem cobertura crítica de seu governo, em fevereiro deste ano. Nesse caso, também é possível citar um possível ataque ao princípio constitucional do direito à informação.
Outro episódio que pode ser incluído é a mudança na lógica de distribuição de verbas publicitárias para TVs abertas.
O governo passou a destinar os maiores percentuais de recursos para Record e SBT —emissoras consideradas aliadas ao Planalto, mas que não são líderes de audiência.