Estados com mais riscos de desastres naturais têm menos verbas
Foto: Cadu Rolim/Fotoarena
Palcos de recentes tragédias com chuvas, Minas Gerais e Espírito Santo estão entre os cinco estados com o maior número de pessoas que vivem em áreas de risco. Os estados, no entanto, não são os que mais receberam repasses do governo federal para obras de prevenção de desastres naturais nos últimos dez anos. Minas Gerais, que ocupa o topo da lista com a maior população em áreas de risco, é a sexta nos repasses da União segundo dados do Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR), responsável pelos investimentos. Espírito Santo, quarto estado com mais pessoas sob risco, é o 17º no ranking de verbas recebidas.
Dos 14 estados mais críticos, nove estão entre os que mais receberam recursos. No entanto, três que estão entre os maiores recebedores de verbas não são os com as maiores populações em áreas de risco.
De acordo com dados do Serviço Geológico do Brasil (CPRM), vinculado ao Ministério de Minas e Energia, são 623.424 pessoas vivendo em áreas de risco em Minas, enquanto o Espírito Santo soma 320.682. Dos R$ 8 bilhões que foram disponibilizados para as ações de prevenção de desastres naturais pelo governo, segundo o ministério, Minas recebeu R$ 284,8 milhões nos últimos dez anos e o Espírito Santo, apenas R$ 56,34 milhões.
O orçamento para prevenção de desastres naturais, segundo o ministério, é definido na Lei Orçamentária Anual. Ao longo do ano, podem ser feitas suplementações de acordo com a demanda. Para ter acesso aos recursos, estados e municípios precisam apresentar Plano de Trabalho, Relatório de Diagnóstico, pareceres técnicos e decreto de criação do órgão de Proteção e Defesa Civil. Com base no que é informado, a Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil (Sedec) avalia os projetos e define os investimentos.
Especialistas apontam que há um problema de gestão do dinheiro repassado e um baixo preparo dos órgãos responsáveis pela aplicação da verba. Mariana Almeida, professora do curso de Planejamento e Acompanhamento de Orçamento Público do Insper, destaca que as soluções para os problemas são de longo prazo, o que gera uma dificuldade de planejamento da execução orçamentária, e as gestões têm alta rotatividade dos seus responsáveis.
— Temos uma dificuldade de planejamento e de garantir a execução do planejamento que, por exemplo, extrapola o período de gestão. De um lado, os municípios não têm um corpo técnico preparado para a tomada de decisão e elaboração de projetos. Do outro, o governo federal não tem um corpo técnico preparado para ajudar a fazer essa gestão dos projetos — explica.
Em Minas, 56 pessoas morreram após os temporais de janeiro deste ano: 13 em Belo Horizonte. A prefeitura da capital mineira diz que os recursos disponibilizados pelo governo não são repasses e sim financiamentos. Eles ainda afirmam que não houve orçamento para prevenção de desastres naturais, e sim para obras de reconstrução no estado.
Gil Castello Branco, secretário-geral do Contas Abertas, aponta que há uma “irresponsabilidade compartilhada entre União, estados e municípios”. Para o especialista, há uma baixa capacitação dos profissionais envolvidos na elaboração dos referidos projetos.
— A União não pode ser considerada a única culpada, porque quem deixou aquela área perigosa ser ocupada foi a prefeitura. Será que tem um engenheiro que entenda desta área para fazer um estudo de contenção de encostas? A prefeitura, muitas vezes, não tem estrutura para fazer um trabalho dessa magnitude. Então, precisa de socorro do estados e, em muitos casos, da União.
A Sedec informou que 105 cidades mineiras pediram apoio para ações de resposta (socorro, assistência e restabelecimento de serviços básicos). Destas, 41 tiveram planos de trabalho aprovados e os repasses já totalizam R$ 26,4 milhões. O governo do estado também apresentou um plano com demandas, em análise pela equipe técnica da Sedec.
No Espírito Santo, 14 municípios solicitaram apoio federal. Cinco tiveram planos aprovados, e foram liberados R$ 811 mil. O governo do estado recebeu R$ 1,8 milhão para ações de resposta. Os demais estão em análise.
Estado com maior população vivendo em áreas de risco e com ocorrências de desastres naturais, Minas Gerais registrou, somente este ano, pelo menos 62 mortes provocadas por temporais. De acordo com a Defesa Civil, março começou com 196 cidades mineiras em situação de emergência. A medida vale por 180 dias e permite respostas mais rápidas para recuperação de estragos e socorro à população.
Já São Paulo, estado que recebeu mais verbas do governo federal para obras de prevenção de desastres naturais, possui uma das áreas mais sensíveis a acidentes naturais, a Baixada Santista. A região, no litoral paulista, reúne municípios como Guarujá, Santos e São Vicente. Na madrugada do último dia 3, um temporal deixou 44 mortos na região, após quedas de barreira e alagamentos. Ainda há uma pessoa desaparecida.
O Rio, outro estado sujeito a desastres naturais, registrou a maior tragédia provocada por um acidente deste tipo no país. Em janeiro de 2011, a Região Serrana fluminense foi castigada por fortes chuvas, seguidas de desabamentos e alagamentos que provocaram a morte de 918 pessoas, além do desaparecimento de outras 103, segundo relação do Ministério Público.
Os números oficiais são contestados até hoje. Associações de vítimas da tragédia afirmam que houve subnotificação das mortes. Muitas famílias desapareceram ou deixaram de registrar o sumiço de parentes. O Rio é o segundo estado que mais recebeu verbas de prevenção de desastres em dez anos.