Mandetta contraria Bolsonaro 03 e pede respeito à China
Foto: Reuters
Na contramão do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), que culpou a China pela pandemia do novo coronavírus e causou um incidente diplomático nesta quarta-feira, dia 18, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, tem dado declarações para defender respeito e solidariedade aos chineses.
Em 27 de fevereiro, o Ministério da Saúde divulgou um vídeo em que o ministro faz campanha por mais respeito aos chineses e demais cidadãos orientais por causa da expansão do novo coronavírus, relatado pela primeira vez em Wuhan, na China, no fim do ano passado. A origem tem gerado ao redor do mundo discriminação contra o país e seus cidadãos. E virou alvo de disputa geopolítica com os Estados Unidos.
“Tem uma medida que não cabe: o preconceito, a rotulagem. O povo chinês está lidando com a galhardia, com o conhecimento e com o que eles têm de melhor”, disse o ministro, que ainda fez uma comparação com a epidemia do vírus zika, decretada no Brasil em 2015. “Não esqueçamos que há poucos anos foi no Brasil que se fez um alerta de emergência internacional sobre o zika vírus e a microcefalia. Não seria correto que todos os brasileiros fossem recebidos em lugares do mundo pensando no zika vírus. Assim como não é correto que as pessoas de origem oriental sofram qualquer tipo de preconceito ou rotulagem.”
Preocupado com casos de xenofobia contra turistas e imigrantes chineses, Mandetta afirmou que “o povo chinês precisa mais do que nunca é da solidariedade, típica dos brasileiros”, e alertou que o País também está sujeito ao surgimento de novas cepas de vírus, por causa da produção agropecuária.
“Não podemos esquecer que um dos maiores rebanhos de bovinos, suínos, caprinos está no Brasil e que pode haver, sim, surgimento de vírus novos aqui no Brasil”, disse o ministro.
Nos bastidores do Palácio do Planalto, o protagonismo de Mandetta na condução da resposta brasileira à crise sanitária incomodou o presidente Jair Bolsonaro. Ele descumpriu orientação do Ministério da Saúde de isolamento e evitar aglomerações, ao ir a uma manifestação governista no último domingo, dia 15, além de promover o chefe da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Antonio Barra Torres, com quem apareceu em público na ocasião e a quem passou a palavra antes do ministro durante coletiva de imprensa nesta quarta-feira, dia 18, um sinal de desprestígio. Questionados, Mandetta e Bolsonaro tentaram apaziguar. O ministro disse que o presidente é o “grande timoneiro”. Bolsonaro negou ter problemas com o titular da Saúde.
Nesta quarta, Eduardo Bolsonaro publicou nas redes sociais mensagem em que acusa do governo chinês de ocultar a gravidade da pandemia. “A culpa é da China”, disse o deputado, filho do presidente Jair Bolsonaro e presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional na Câmara.
Pequim protestou por meio da embaixada em Brasília e exigiu retratação. O embaixador Yang Wanming afirmou que a relação entre os países foi afetada.
Os chineses acusaram o deputado de ecoar um discurso da diplomacia norte-americana, que vem travando nos últimos dias com os chineses um debate público sobre a origem do vírus em Wuhan. O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, passou a se referir ao novo coronavírus como “vírus chinês”, termo já adotado por bolsonaristas. Autoridades da chancelaria chinesa acusam os EUA de tentar estigmatizar a China e desacreditar o país e a resposta dada à pandemia.
A resposta pública a Eduardo Bolsonaro foi a primeira vez que a diplomacia chinesa reagiu com veemência a uma frase interpretada como “anti-China” proferida por algum integrante do clã político presidencial – o presidente e seus filhos parlamentares. O episódio virou uma crise diplomática com mais repercussão do que quando o presidente, ainda como candidato em 2018, acusou a China de trabalhar para “comprar o Brasil”. Seria apenas o primeiro estremecimento na relação, meses depois superado.
Após a eleição, com o viés de privilegiar os EUA declarado, a diplomacia chinesa trabalhou nos bastidores por meio da aproximação com parlamentares bolsonaristas – parte deles viajou à China – e em contato com militares influentes, como o vice-presidente, general Hamilton Mourão, escalado para a Cosban (Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível de Concertação e Cooperação). Bolsonaro fez uma viagem à China e, no fim do ano, declarou que a China cada vez mais faz parte do futuro do Brasil, por ocasião da visita do presidente Xi Jinping a Brasília, na cúpula dos BRICS – bloco formado pelas duas nações, além de Rússia, Índia e África do Sul.