Onda de solidariedade mitiga efeitos do isolamento
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Em tempos de quarentena, movimentos agregadores têm unidos amigos e desconhecidos afastados pelo distanciamento social. São voluntários das mais diversas áreas que colocam suas habilidades a serviço dos outros ou que doam seu tempo ao próximo, fazendo coisas simples, como contar histórias via internet, tanto para crianças como para adultos, ou ir ao supermercado para quem é do grupo de risco da Covid-19. Os “serviços” são compartilhados em grupos de WhatsApp, redes sociais como Instragram, formando uma corrente do bem.
— Essa situação nos mostra que somos todos iguais, que estamos no mesmo barco e que precisamos apoiar uns aos outros. Tenho esperança que essa situação, que um dia vai passar, possa promover mudanças mundiais, a longo prazo, como sermos mais solidários, mais humanos — afirma Helen Faria, empresária autônoma, que criou um grupo de ajuda mútua na Urca, bairro onde mora no Rio.
Pós-graduada em pedagogia da cooperação e mãe de duas meninas, Beatriz, de 14 anos, e Joana, de 10, ela já está acostumada a participar de atividades de apoio entre os vizinhos. Assim, aproveitou a extensa lista de telefones e propôs a criação de um grupo de amparo à comunidade.
Mesmo em home office (é consultora de qualidade de vida), ela reserva tempo para planilhar todos os pedidos. Para se inscrever é preciso dizer o que a pessoa necessita mas também o que ela pode oferecer. E tem de tudo: apoiador para atividade física, para passear com os cachorros, para dar suporte psicológico, entre outros. As ações ainda não começaram porque ela está juntando quem pode ajudar quem em grupos específicos.
— O que não consegui ainda é comprar álcool em gel para quem precisa. Está em falta porque as pessoas estão fazendo estoque sem pensar nos outros.
Esse é um dos comportamentos que mais incomodam Roberta Lima de Oliveira — que, entre suas iniciativas, está a de manter o salário de sua diarista, mesmo que ela não esteja trabalhando. Chegou a pedir para a síndica do seu prédio para rever o caso do porteiro, que é do grupo de risco, mas continua a cuidar do prédio, em Copacabana.
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— As iniciativas precisam ir além. Não adianta parar de pagar a academia que está fechada porque o dono não vai poder pagar seus funcionários. Vivemos uma crise de saúde, mas precisamos pensar que uma crise econômica será agravada se não pensarmos nos outros.
Roberta, engenheira que está trabalhando em home office, resolveu se colocar à disposição dos idosos do prédio. Pendurou um bilhetinho no elevador dizendo que pode ir ao supermercado para quem não deve sair de casa.
Ela divide apartamento com duas amigas e não consegue ajudar as avós porque moram longe, em Bangu, Zona Oeste do Rio, e na Abolição, na Zona Norte. Ao menos, ela conta, a família é grande e outros parentes estão as ajudando:
— Moro em um bairro com muitos idosos e boa parte não sabe fazer compras na internet. Posso muito bem usar parte do meu tempo, quando não estou trabalhando, para ajudar nesse sentido também. É uma maneira de não ficar apenas lendo notícias ruins e preocupantes sobre o coronavírus.
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Essa corrente de boas ações também pegou em cheio o professor de futevôlei Yuri Dan Oyarzun Mattos. Ele comenta que ficou impressionado com a iniciativa de uma pessoa, no interior do estado, que começou a fazer compras para os idosos. Pode ser de supermercado ou de farmácia.
Resolveu entrar na dança e ajudar os mais suscetíveis ao Covid-19. Morador da Barra da Tijuca, ele e a namorada Taina Bastos Mendes, abraçaram cinco condomínios na sua área. Os dois deixaram seus telefones em grupos de WhatsApp destes prédios e à disposição na internet. Ele, no entanto, lamentou que até agora só recebeu uma ligação:
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— Acho que as pessoas ainda não se deram conta do momento que estamos vivendo nem das necessidades que temos por agora. Ainda vejo muita gente nas ruas, Então, imagino que serei acionado mais para frente mesmo — fala Yuri, que chama a atenção para quem está fazendo estoque. — Não precisa, com isso a gente prejudica o outro. Está claro que esse é o momento de pensarmos nos outros , não apenas na gente.
Com o fechamento das academias de ginástica e o confinamento obrigatório, os alunos do personal trainer Sálvio Souza Junior cancelaram suas aulas mas pediram para ele enviar treinos para que não fiquem parados. Junior achou melhor compartilhar suas dicas no Instaram (@ssjunior) para que outras pessoas também possam se beneficiar. Explicou que esta é uma forma de ajudar com o que pode:
— Muita gente está em casa só vendo televisão. É bom colocar o corpo em atividade. Faz bem para a cabeça também, algo necessário nesse momento — afirma o professor que já disponibilizou um treino na internet e fará outros nos próximos dias. — Vou fazer aulas específicas para quem precisa improvisar em casa.
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Cristiano Gouveia também ajuda a afastar o tédio e criou uma alternativa aos filmes da TV. Ator e cantor, ele está lendo e contando histórias ao vivo pelo Instagram (@umcantoquecanta), todos os dias às 17h.
Pai de Joaquim, de 11 anos, e de Elis, ainda na barriga da mãe, ele diz que sabe muito bem o quanto está sendo difícil passar o tempo em casa. Essa é uma maneira, segundo ele, de entreter as pessoas mas também de fazer o seu tempo passar. Autônomo, ele teve shows cancelados e seu home office é cuidar da família.
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Por conta desta iniciativa, ele ganhou, em um dia, mais de 1 mil seguidores:
— De uma certa forma também divulgo meu trabalho. Mas o que mais me interessa é conectar as pessoas, juntar pais e filhos, ajudar nessa momento — explica Cristiano. — Éramos assim, meus pais e avós paravam, sentavam juntos, e contavam histórias. É uma volta ao passado. E não é o que precisamos agora? Parar e cuidar?