Dólar tem maior valor nominal da história
Foto: REUTERS/Rahel Patrasso
O dólar fechou esta quinta-feira (2) cotado a R$ 5,266. A alta foi bem pequena, de apenas 0,1%, mas foi suficiente para renovar o recorde da moeda norte-americana desde que o Plano Real começou a funcionar no Brasil, em 1994.
Esse recorde, entretanto, é apenas nominal, quer dizer, ele não considera as variações de preços que aconteceram ao longo dessas décadas nem aqui dentro, no Brasil, e nem lá fora, nos Estados Unidos e no resto do mundo.
Por essa ótica, o verdadeiro recorde do dólar em relação ao real aconteceu em 2002, quando, a preços de hoje, chegou a valer o equivalente a R$ 7,64, no pico registrado em setembro daquele ano. Os cálculos foram feitos pela consultoria GO Associados a pedido do CNN Business, e levaram em consideração o valor médio do câmbio a cada mês desde 2000 – até o início de 1999, o Brasil tinha câmbio fixo, e a cotação, segurada próxima de R$ 1, praticamente não variava.
Em 2002, às vésperas das eleições que, em outubro, levariam o petista Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência, o dólar disparou junto com o temor de investidores e o risco-país, e a moeda chegou próxima dos R$ 4, nos valores da época, pela primeira vez na história do real.
O dólar operaria acima dos R$ 3 entre agosto de 2002 e abril de 2003, o equivalente a uma banda de R$ 5 a R$ 7 se atualizada pela inflação. De 2004 para frente, já em valores corrigidos, não voltaria mais a passar da marca dos R$ 5 – até agora. De acordo com as contas da GO Associados, o dólar atualmente a R$ 5,26 representa o pior episódio para a moeda desde maio de 2004 (R$ 5,264).
A cotação atual ultrapassa, inclusive, os picos mais recentes do câmbio, registrados em setembro de 2015, no auge da crise política que culminaria com o impeachment da presidente Dilma Rousseff no ano seguinte, e em setembro de 2018, às vésperas da última eleição presidencial. Nesses dois períodos, o dólar chegou a próximo de R$ 4,20, o que, em valores atuais, seria R$ 4,70 e R$ 4,28, respectivamente.
“O câmbio está sob pressão de três grandes fatores hoje: o temor global com o coronavirus, que faz as pessoas procuram ativos mais seguros; a queda nos preços das commodities e o diferencial de juros”, diz o economista Gesner Oliveira, sócio da GO Associados. São três grandes pressões ao mesmo tempo que, de acordo com ele, ajudam a explicar a disparada quase inédita da moeda agora.
Os preços mais baixos de produtos de que o Brasil depende, como alimentos e petróleo, estão reduzindo a receita com exportações, explica Oliveira. O diferencial de juros, por sua vez, é a diferença entre quanto os títulos brasileiro pagam aos investidores e o que é pago pelos títulos americanos – essa distância está hoje nos menores patamares já registrados, o que torna a aplicação no Brasil menos vantajosa em relação a países mais seguros e intensifica ainda mais a fuga de capitais.
A taxa de câmbio real é uma maneira de olhar para as cotações do passado e ter uma ideia melhor do quanto elas valeriam hoje, considerado o poder de compra atual nos dois países que se quer comparar. Com isso, ela também dá uma ideia melhor de qual era o real custo e atratividade do país do ponto de vista dos estrangeiros na época, já que a taxa de câmbio nada mais é do que um termômetro da entrada e saída de capitais de um país.
Para chegar ao valor atualizado, a conta da taxa de câmbio real leva em consideração a inflação acumulada no período tanto no Brasil, para quem compra em reais, quanto nos Estados Unidos, para quem compra em dólares. “As coisas ficaram um pouco mais caras no Estados Unidos nesse período, mas ficaram muito mais caras no Brasil, e é daí que vem a diferença da taxa de câmbio real”, explica Oliveira. Desde 2000, mostra o levantamento, a inflação acumulada nos EUA foi de 53%, enquanto, no Brasil, subiu 234%.
Em setembro de 2002, por exemplo, data real do recorde do dólar, US$ 1 era cotado, em média, a R$ 3,34, nos valores da época. Só que os preços subiram nos dois lugares, e, se US$ 1 compra menos coisas nos EUA agora, R$ 3,34 compram ainda menos coisas no Brasil. É por isso que, hoje, seriam necessários mais reais – R$ 7,64, na cotação já reajustada – para comprar as mesmas coisas que, em 2002, custavam US$ 1 lá fora.