Ecovias confessa que pagou propina ao PSDB
Foto: Adriana Zehbrauskas/Folhapress
Em um acordo cível firmado nesta segunda-feira (6) com o Ministério Público de São Paulo, a concessionária que administra o sistema Anchieta-Imigrantes, a Ecovias, afirma que houve formação de cartel, pagamentos de propinas e repasses de caixa dois em 12 contratos de concessão rodoviária firmados com o Governo de São Paulo.
As irregularidades duraram de 1998 a 2015, período que inclui as gestões Mario Covas, José Serra e Geraldo Alckmin, todos do PSDB.
Um dos compromissos da empresa para não ser processada é a redução de 10% na tarifa de pedágios das rodovias e Anchieta e Imigrantes, entre 21h e 5h. Segundo envolvidos nas negociações, essa medida seria uma compensação aos caminhoneiros durante a pandemia do novo coronavírus.
O acordo tem valor total de R$ 650 milhões, sendo R$ 450 milhões em obras, R$ 150 na redução de pedágio e R$ 50 milhões em multa. O conteúdo dos relatos feitos aos promotores foram publicados pelo jornal O Estado de S. Paulo e confirmados pela Folha.
A companhia citou à Promotoria as pessoas que teriam recebido os valores, entre eles políticos que ainda hoje têm mandato —no entanto, para ter validade, o acordo ainda tem que ser homologado pelo conselho do Ministério Público e pela Justiça.
As investigações sobre a concessão da Ecovias começaram em 2018, quando o Ministério Público instaurou um inquérito cível para apurar eventuais irregularidades. A empresa, então, procurou os promotores para celebrar um acordo.
A Ecovias relatou que firmou o cartel em 1998, durante a gestão de Mário Covas (1930-2001), em concessões que duram até hoje. O pagamento de propina e de caixa dois, relataram, durou até 2015.
Com o acerto, a concessionária se compromete a colaborar com a produção de provas sobre o que foi dito, mas se livra de ações civis.
Outras 11 empresas teriam participado da formação de cartel nos contratos, segundo a Ecovias, mas até o momento nenhuma delas firmou acordo com a Promotoria.
O acerto foi possibilitado devido à nova Lei Anticrime, que possibilitou esse tipo de medida em casos de improbidade administrativa.
A reportagem procurou os promotores responsáveis pelo acordo, Silvio Marques, José Carlos Blat e Paulo Destro, mas eles não quiseram se manifestar, já que o acordo não foi homologado e está sob sigilo.
Segundo a Secretaria de Logística e Transporte e a própria Ecovias, os R$ 450 milhões serão aplicados, caso o acordo seja validado, “em obras de interesse público não previstas originalmente no contrato de concessão da Ecovias”, como “a construção de um Boulevard de cerca de 2 km nas proximidades do Complexo Viário Escola de Engenharia Mackenzie, em São Paulo, bem como em melhorias na Rodovia Anchieta”.
A empresa se comprometeu, no acordo, a não lucrar com essas obras. O boulevard inclui novas pistas, inclusive subterrâneas. As reunições que decidiram sobre essa construção tiveram participação direta de João Octaviano Machado Neto, secretário de Logística e Transportes da gestão João Doria (PSDB).
Nesta segunda (6), após a assinatura, o grupo Ecorodovias, do qual a Ecovias faz parte, publicou um fato relevante dirigido ao mercado informando que havia firmado o acordo e detalhando os pagamentos que faria.
Procurada, a concessionária Ecovias confirmou o acordo e informou que “as novas tarifas serão implementadas a partir de 90 dias após a homologação do acordo e as obrigações de investimentos, redução e pagamento da Ecovias ocorrerão após certo prazo da homologação judicial”.
“Contando atualmente com amplo programa de compliance e rigorosos mecanismos de controle de gestão, a EcoRodovias reafirma seu compromisso com o crescimento sustentável e com transparência em todas as suas relações profissionais”, disse, em nota.
O Governo de São Paulo afirmou, também por meio de nota, que “não teve acesso ao conteúdo do acordo que é mantido em sigilo de Justiça”. No entanto, afirma que, no acordo, “a participação do Estado se deu exclusivamente em definir a destinação dos recursos de R$ 450 milhões” para a construção do Boulevard.
O PSDB de São Paulo, afirma que “não tem qualquer relação com a empresa citada ou com os fatos mencionados e tem absoluta convicção de que os atos administrativos das gestões de Mário Covas, Geraldo Alckmin e José Serra seguiram estritamente o definido por lei”.
“Todas as doações feitas ao partido são devidamente registradas junto à Justiça Eleitoral, conforme determina a legislação vigente, sem que jamais houvesse qualquer contrapartida relacionada a contratos governamentais ou vantagens de qualquer natureza”, diz o partido.
“Ressaltamos ainda que, por definição, cartel deve envolver mais de uma empresa para lesar o estado, sendo este o prejudicado neste processo irregular. O PSDB defende a apuração célere dos fatos e a punição exemplar dos envolvidos, além da devolução dos recursos ao Governo do Estado de São Paulo.”